O inferno astral de Ângela Merkel

A reputação de Angela Merkel está em queda na Europa

El País

Severin Weiland

  

  • A chanceler alemã, Angela Merkel, durante conferência de imprensa na sede do governo alemão, em Berlim

    A chanceler alemã, Angela Merkel, durante conferência de imprensa na sede do governo alemão, em Berlim

Atualmente todo mundo está falando sobre a chanceler alemã Angela Merkel – e a maior parte das coisas que as pessoas têm a dizer sobre ela não são agradáveis. O seu plano de criação de um mecanismo de falências para os países da zona do euro, dizem essas pessoas, fez com que piorasse a crise da dívida na Irlanda e em outras nações. O nome da Angela Merkel, outrora respeitado, encontra-se atualmente maculado.

Não faz muito tempo que a chanceler da Alemanha era a estrela da Europa – uma construtora de consenso que colocou-se na vanguarda das tentativas de salvar o mundo do aquecimento global. De fato, durante algum tempo pareceu que Angela Merkel estava seguindo a rota para transformar-se em uma política alemã tão respeitada quanto foi Helmut Kohl à sua época.

Agora, porém, o legado de Angela Merkel parece mais incerto do que nunca. Desde que a crise da dívida soberana começou a abalar a zona do euro, a Alemanha tem sido alvo de críticas frequentes, como há muito não acontecia. E a imagem da chanceler vem sendo bastante prejudicada. Hoje em dia os jornais europeus mostram bastante a imagem de Angela Merkel, de lábios cerrados e aparência severa.

Em meio à crise europeia, a antiga imagem do “alemão feio” – todo poderoso e arrogante – retornou ao cenário. Arcando com o peso da crise europeia, a Irlanda se vê como uma vítima da prepotência alemã. A imprensa irlandesa fala de “neocolonialismo”. Um dos maiores jornais do país, o “Irish Independent”, cita as palavras do político Michael Noonan, do partido Fine Gael, que disse: “Será que posso perguntar pelo que os homens morreram em 1916? Por um pacote de auxílio econômico da chanceler alemã, tendo ao lado uns poucos xelins de simpatia do chanceler britânico?”.

“Isso não me preocupa”

A Alemanha e Angela Merkel estão passando por um teste de estresse. O presidente do Grupo do Euro, o primeiro-ministro de Luxemburgo, Jean-Claude Juncker, falou sobre as suas próprias preocupações em relação as políticas europeias adotadas pela Alemanha, sem se referir diretamente à chanceler alemã. “O que me preocupa é o fato de que na Alemanha as autoridades federais e locais estão lentamente perdendo de vista o bem estar público”, declarou ele ao jornal “Rheinischer Merkur”.

A vice-presidente do Parlamento Europeu, Silvana Koch-Mehrin, que é do Partido Liberal Democrata, defensor dos interesses do empresariado alemão, disse a Spiegel Online: “No momento, Angela Merkel está sendo observada na Europa. As pessoas esperam muito dela, mas estão sendo brandas nas suas críticas. Quase todo político que discursou no Parlamento Europeu mencionou a Alemanha nas últimas semanas – e isso é algo que nós não víamos havia muito tempo”.

A chanceler alemã vê-se em uma situação difícil. O país trocou o seu amado e estável marco alemão pelo euro. Agora Berlim está exigindo medidas de austeridade extremas da Irlanda, conforme fez em relação à Grécia na primavera passada. Tais exigências estão longe de serem populares nesses países.

Elas são especialmente impopulares porque muitas pessoas nesses países que atualmente são as que mais sofrem acusam Angela Merkel de ser parcialmente responsável por ter agravado a situação. Em meados de outubro último, ela e o presidente francês Nicola Sarkozy anunciaram planos para a criação de um mecanismo de falência para os países da zona do euro – uma proposta de reestruturação da dívida que prevê que os investidores privados também sejam atingidos caso um país não seja mais capaz de pagar as suas dívidas. A ideia é que tal mecanismo seja implementado tão logo o atual pacote de proteção de 750 bilhões de euros (R$ 1,3 trilhão) expire em 2013.

Muito mais caro

Mas desde o anúncio desse plano, as taxas de juros sobre os títulos soberanos de países altamente endividados como Grécia, Irlanda, Espanha e Portugal dispararam, fazendo com que ficasse muito mais caro para eles tomar dinheiro emprestado nos mercados financeiros – e amortizar as suas dívidas.

Como resultado disso, a frustração é extrema. “Angela Merkel fez com que as taxas extras de risco disparassem”, dizia recentemente a manchete do maior jornal diário de Portugal, o “Jornal de Notícias”. O influente diário espanhol “El País” mencionou “a estupidez dos líderes europeus”. O artigo alega que os alemães involuntariamente tornaram a situação pior para a Irlanda ao exigirem que investidores privados passassem a ser parcialmente responsáveis pelos prejuízos. “Talvez isso não seja uma má ideia, mas por que anunciá-la primeiro?”, questionou um irritado comentarista.

O objetivo de Angela Merkel para fazer com que os proprietários de títulos soberanos do setor privado dividam os custos caso o Estado torne-se insolvente tem como objetivo demonstrar a sua determinação em reequilibrar um sistema instável. Muitos contribuintes alemães têm se perguntado por que eles deveriam arcar com toda a conta de uma bagunça na qual os bancos estão também altamente envolvidos. “Os políticos tem poder, mas não os empresários”, declarou Angela Merkel ao Bundestag.

A declaração parece corajosa. O único problema é que os planos de Angela Merkel para um futuro mecanismo de crise permanente já deixaram os mercados financeiros extremamente nervosos. Um plano elaborado para ser implementado daqui a três anos está fazendo atualmente com que investidores nervosos tenham uma reação exagerada.

“Falta de uma mensagem unificada”

Especialistas da indústria financeira não estão no momento impressionados com os alemães. O jornal de economia alemão “Handelsblatt” fala de uma “taxa extra Merkel: “O debate sobre um mecanismo de reconstrução da dívida está vindo no momento errado”, escreveu Angel Ubide, economista da Tudor Investment Corporation, em uma coluna para o jornal. Em uma outra coluna, o economista Julian Callow, do Barclays Capital, previu que se os países menores da União Europeia
seguissem o exemplo alemão, eles não seriam capazes de encontrar compradores para os seus títulos, e terminariam sendo incapazes de saldar as suas dívidas.

O foco das críticas públicas é a estratégia de comunicação de Angela Merkel durante a crise. Nesta semana, por exemplo, ela primeiro teceu alguns comentários para o grupo parlamentar do seu conservador partido democrata-cristão em uma sessão a portas fechadas, e a seguir proferiu umas poucas sentenças a respeito do euro em um discurso à federação dos empregadores. Finalmente, ela falou sobre a questão durante um debate no Bundestag sobre o orçamento.

Observadores reclamam de que a chanceler não está apresentando um quadro completo. “Neste momento, quem quiser conhecer a posição de Angela Merkel sobre a crise do euro, terá que praticamente montar um quebra-cabeças” , afirma Koch-Mehrin. “Existe sem dúvida alguma a falta de uma mensagem unificada”.

Koch-Mehrin deu a sua própria sugestão sobre como Angela Merkel poderia melhorar a sua abordagem na área de relações públicas. “Eu gostaria que a chanceler fizesse um grande discurso à nação sobre a crise do euro e o futuro da Europa – de preferência em horário nobre de televisão”.

Tradução: UOL

http://noticias.uol.com.br/midiaglobal/derspiegel/2010/11/27/a-reputacao…

Luis Nassif

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