A luta contra a esquizofrenia

Por Ramalho

Uma das muitas críticas recorrentes à prática psiquiátrica, talvez a mais importante, é a de que a psiquiatria não tem modelo dinâmico funcional do cérebro, em especial no que tange aos aspectos físico-químicos. Mesmo assim, dizem os críticos, psiquiatras prescrevem remédios que equilibrariam a química cerebral. Dizendo de outra maneira, a psiquiatria, mesmo desconhecendo o que seria “química cerebral equilibrada”, pois não tem modelo eficaz do funcionamento cerebral, prescreve admissão de drogas para a obtenção de equilíbrio que não sabe qual é.

No caso da esquizofrenia, os efeitos adversos dos antipsicóticos, drogas usadas para tratá-la, são arrasadores: causam de obesidade a diabetes, de irritabilidade a problemas cardíacos e, até, danos cerebrais. Ademais disto, não curam a doença (a esquizofrenia é tida hoje como incurável) e tal ineficácia é compreensível, levando-se em conta o mencionado anteriormente. Os antipsicóticos, isto dito por esquizofrênicos, servem para “adequar” o paciente ao convívio, impondo-lhe atitudes convenientes – a custo exorbitante – mas não os livra dos delírios e outros sintomas.

A escolha do antipsicótico pelo médico para um particular doente é feita por tentativa e erro: o médico experimenta várias drogas e, por avaliação meramente clínica – desassistida de verificações quantitativas e qualitativas objetivas – escolhe a que melhor se adaptaria ao paciente (a avaliação clínica pura, não obstante sua importância, tem muito de subjetividade, e é grandemente afetada pela experiência do avaliador o que implica índice de erros relativamente alto e enormes dificuldades de padronização de diagnóstico).

Estudo recente, porém, parece apontar para melhores tempos na psiquiatria, tornando-a, por assim dizer, científica, ainda que incipientemente. Pela primeira vez, foram usadas células cerebrais vivas – neurônios – na investigação da esquizofrenia. Células da pele foram coletadas de quatro pacientes esquizofrênicos, tornadas inicialmente células-tronco-pluripotentes-induzidas e, subsequentemente, transformadas em neurônios. Os grupos de neurônios produzidos em laboratório correspondem a cada um dos pacientes (e, espero eu, iguais, ou muito semelhantes, aos neurônios cerebrais do correspondente doador das células epiteliais).

Os pesquisadores descobriram que neurônios dos pacientes esquizofrênicos interligam-se menos do que neurônios de pessoas sem a doença (as conexões neurais são essenciais para a execução das funções mentais). Descobriram, também, o mau funcionamento de cerca de 600 genes, sendo que cerca de 25% desses genes já tinham sido associados à esquizofrenia em estudos anteriores. Além disto, foi testada a capacidade de cinco antipsicóticos (clozapina, loxapina, olanzapina, risperidona e tioridazina) melhorarem a conectividade neuronal dos pacientes: somente a loxapina aumentou significativamente as conexões cerebrais de todos os pacientes do estudo.

Afora abrir novas perspectivas para o desenvolvimento de drogas eficazes no tratamento da esquizofrenia, o método usado no estudo permite que sejam testadas drogas que funcionem melhor em determinado paciente sem que tenha de experimentá-la antes, ou seja, sem que tenha de ser cobaia. Permite a personalização do tratamento, talvez com o uso de drogas combinadas, cuja eficácia pode ser medida previamente. Finalmente, embora do estudo não se tenha como resultado um modelo dinâmico do cérebro, vislumbra-se, agora, na psiquiatria, um mínimo de racionalidade na escolha de medicamentos e tratamentos.

Fontes: 1 – Células-tronco, uma nova esperança: http://tratamentocomcelulastronco.blogspot.com/2011/09/os-pacientes-de-esquizofrenia-podem-ter.html;

2 – Hype Science, Cientistas estudam células de pacientes esquizofrênicos em laboratório: http://hypescience.com/cientistas-estudam-celulas-de-pacientes-esquizofrenicos-em-laboratorio/

3 – Live Science, Schizophrenic Brain Cells Created in Lab: http://www.livescience.com/13693-schizophrenia-brain-cells-created.html?utm_source=feedburner&utm_medium=feed&utm_campaign=Feed%3A+Livesciencecom+%28LiveScience.com+Science+Headline+Feed%29&utm_content=Google+Reader

4 – Nature Journal, Modelling schizophrenia using human induced pluripotent stem cells: http://www.nature.com/nature/journal/v473/n7346/full/nature09915.html

Luis Nassif

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