Maira Vasconcelos
Maíra Mateus de Vasconcelos - jornalista, de Belo Horizonte, mora há anos em Buenos Aires. Publica matérias e artigos sobre política argentina no Jornal GGN, cobriu algumas eleições presidenciais na América Latina. Também escreve crônicas para o GGN. Tem uma plaqueta e dois livros de poesia publicados, sendo o último “Algumas ideias para filmes de terror” (editora 7Letras, 2022).
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Governo Milei lança plano antiprotestos de “manutenção da ordem pública”

Anunciado na tarde de quinta, o “Protocolo para manutenção da ordem pública” prevê penas, detenções e multas.

Horizonte de repressão. Governo Milei lança plano antiprotestos de “manutenção da ordem pública”

por Maíra Vasconcelos, especial para Jornal GGN

“Se ocupam as ruas, vai ter consequência”. Com esse tom, o governo de Javier Milei, por meio de sua ministra de Segurança Patricia Bullrich, anunciou um plano antiprotesto social, que prevê a intervenção das “quatro forças federais” (Exército, Força Aérea, Marinha e Serviço Penitenciário). A decisão visa impedir e criminalizar as manifestações bastante cotidianas, em Buenos Aires, realizadas por grupos chamados de “piqueteiros”, organizações e movimentos sociais que fecham ruas e avenidas como forma de protesto. No próximo dia 20 de dezembro, está programada uma manifestação liderada pelo “Polo Obrero”, que, apesar do anúncio da ministra, mantém a agenda. A data coincide com os protestos da crise de 2001, que completam 22 anos, e deixaram 39 mortos.

“Os delitos serão enquadrados até uma nova lei que será apresentada em curto prazo, de acordo com o artigo 194 do Código Penal”, disse Bullrich durante a apresentação das medidas, com a presença da imprensa, na sede do ministério de Segurança, no bairro portenho de Recoleta. Esse artigo penal estabelece prisão de três meses a dois anos. “Vamos organizar o país para que as pessoas possam viver em paz”, argumentou a ministra.

O anúncio antimanifestação e de criminalização dos protestos não tem precedentes nos últimos 40 anos de democracia. Alguns números mostram a cotidianidade dos protestos no país, que independem do governo de turno. Quer dizer, os governos peronistas enfrentaram inúmeros protestos, mesmo tendo maioria no Congresso. A Argentina chegou a registrar, em março de 2022, um recorde de “piquetes”, com 800 protestos em todo o país. Em janeiro e fevereiro, desse mesmo ano, foram, respectivamente, 400 e 460 manifestações com fechamento de ruas no país. Os dados são da consultoria “Diagnóstico Político”, e foram publicados no jornal “La izquierda diario”, em abril do ano passado.

Muitos desses protestos, em 2022, foram contra o pagamento da dívida com o FMI (Fundo Monetário Internacional), a maior da história do país, contraída durante o governo de Mauricio Macri (2015-2019). Em 2021, foram mais de 6.600 mil piquetes em todo o território nacional, a cifra mais alta, desde 2014. Naquele ano, no final do segundo governo de Cristina Fernández de Kirchner, os “piquetes” chegaram a 6.805 mil. Os “piquetes”, como também as greves, são métodos históricos de luta por direitos, na Argentina.

Segundo a nova política de criminalização dos protestos do Ministério de Segurança, os protestos podem acontecer nas calçadas, mas não podem fechar ruas e estradas. “Qualquer pessoa que esteja na calçada não terá problemas. O que não queremos são bloqueios de ruas e estradas”, disse a ministra de Segurança. Além de estabelecer que “o Estado não vai pagar” pelas forças de segurança utilizadas durante os “piquetes”, e que as agrupações deverão arcar com os gastos. Movimentos e organizações sociais e alguns quadros políticos consideram a medida “inconstitucional” e uma “ameaça”, frente a um possível cenário de conflito, após o anúncio das medidas.

Pois, segundo a política “antipiquete” do governo, será criado um registro das organizações que participem dos fechamentos de ruas e estradas, e o Estado “enviará a conta” aos responsáveis por todos “os custos relacionados às operações de segurança”. O “Protocolo para manutenção da ordem pública” ainda depende de tratativas entre o Estado e os governadores para que possa entrar em vigor, tal como está proposto, também nas províncias.

A medida foi anunciada enquanto o governo prossegue em detalhar sobre o ajuste de shock econômico lançado por Luis Caputo, ministro da Economia, na última terça-feira, 12. Em vídeo gravado, sem possibilidade de intervenção e participação da imprensa, Caputo anunciou dez medidas econômicas, entre elas, 100% de aumento do dólar oficial, que passou de $400 a $800 pesos, quer dizer, uma desvalorização da moeda nacional na mesma medida; corte dos subsídios de água, luz, gás e transporte público, que devem entrar em vigor a partir de 1 de janeiro – o trem passaria a 1.100 pesos, hoje custa 52,00, e o ônibus passaria a $700,00, hoje custa 72,00; fim das obras públicas e restrição severa do repasse de verba às províncias. Segundo a receita do governo, espera-se meses de forte recessão, retração da atividade produtiva e pico de inflação – o ministro afirmou que a inflação escala em 1% ao dia. Caputo voltou a afirmar o plano de dolarização e fechamento do Banco Central.

Maíra Vasconcelos – jornalista, mora em Buenos Aires, publica artigos sobre política argentina no Jornal GGN e cobriu algumas eleições presidenciais na América Latina. 

Maira Vasconcelos

Maíra Mateus de Vasconcelos - jornalista, de Belo Horizonte, mora há anos em Buenos Aires. Publica matérias e artigos sobre política argentina no Jornal GGN, cobriu algumas eleições presidenciais na América Latina. Também escreve crônicas para o GGN. Tem uma plaqueta e dois livros de poesia publicados, sendo o último “Algumas ideias para filmes de terror” (editora 7Letras, 2022).

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