E a 1ª instância avança sobre os Poderes, por Janio de Freitas

Lourdes Nassif
Redatora-chefe no GGN
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Jornal GGN – O corporativismo no Judiciário grassa. Carmén Lúcia esbravejou, e associações de juízes e procuradores também esbravejaram. Mas, na realidade, esse esbravejar só teve como finalidade encobrir uma ordem judicial abusiva, que foi a invasão do Senado para prender policiais que prestam serviço para a Casa. O tema é abordado por Janio de Freitas, e este ponto é a introdução de seu artigo.

No mais, Janio passeia pelos desvios da Lava Jato. Nenhum cidadão fica imobilizado diante do arbítrio. Se um cidadão verificar se seus telefonemas, correspondência, casa e trabalho estão sendo invadidos, violados, está em seu direito, e nenhuma ordem poderá cassar, já que a ordem para invadir é desconhecida do vigiado.

Janio relembra o inesquecível caso criado por Gilmar Mendes, quando acusou Lula de instaurar o estado policial por gravação em seu gabinete. Jobim foi lá dar uma força para provar o delito. E tudo caiu por terra por Jobim mostrou propaganda na internet, a gravação foi feito pelo interlocutor do ministro quando este pedia emprego para sua enteada.

No artigo um relembrar das várias escutas clandestinas já encontradas por varreduras. FHC foi gravado ao manipular privatização da Vale, Cunha foi gravado ao sair da presidência da Telerj, usar apelidos e metáforas era exercício diário e vai até onde a Lava Jato quer chegar: a palavra amigo se tornou uma associação com o crime. Um festival de escutas que desemboca nas ações da Lava Jato em cenas diárias.

E ele chega ao ponto central da questão: Carmén Lúcia se sentiu agredida por palavras de Renan, que teve o Senado invadido por um braço do Executivo que apreendeu bens e prendeu servidores da Polícia Legislativa.

Leia o artigo a seguir.

Na Folha

É ilógico que o Congresso fique sujeito a um juiz de 1ª instância, e não ao STF

Por Janio de Freitas

O esbravejar de associações de juízes e de procuradores contra um protesto do presidente do Senado não é, apenas, mais uma das tantas manifestações de corporativismo com que tais categorias se privilegiam. A reação desproporcional teve também a finalidade de depressa encobrir, com o barulho exaltado, uma ordem judicial vista como abusiva. É dar as costas à democracia.

Nem por ser quem é, Renan Calheiros está impedido de ter, vez ou outra, atitudes corretas. Se a forma como o faça for descabida, e no caso foi, não é o sentido da atitude que deve pagar. Mesmo porque, se falarmos em democracia, defender a soberania relativa do Congresso é tão democrático quanto invadi-lo policialmente não é.

Ainda não consta, embora não falte muito, que os cidadãos –quaisquer cidadãos –tenham perdido o direito de verificar se seus telefonemas, sua correspondência, sua casa e trabalho, enfim, sua intimidade, estão sendo violados. Mesmo a ordem judicial para a violação não cassa tal direito, pois se é desconhecida do vigiado. E não só por ordem judicial há violações à intimidade. É só constatá-lo nos anúncios de detetives particulares e seu instrumental de violações remuneradas.

É inesquecível o caso criado por Gilmar Mendes quando, gravado em telefonema no seu gabinete, acusou Lula de instaurar o estado policial. Um escarcéu. Nelson Jobim foi à Câmara, com prospectos de uma aparelhagem que o Exército comprara e, a seu ver, era a usada para gravar Mendes. Logo se viu que Jobim só mostrara o que era, de fato, uma propaganda na internet. E a gravação foi feita pelo próprio amigo telefônico a quem o ministro do Supremo pedira, para sua enteada, um emprego boca-rica no Senado.

Gravadores clandestinos do SNI foram encontrados por “varreduras” em muitos gabinetes da ditadura. Fernando Henrique foi gravado manipulando a “privatização” da Vale. Depois que Eduardo Cunha deixou a presidência da Telerj, evidências de gravações clandestinas tornaram-se epidêmicas no Rio. Até que foi descoberta, perto de uma instalação da FAB no centro, uma central onde foram presos um ex-técnico da Telerj e um sargento. Na Barra da Tijuca, foi localizada uma central chefiada por um coronel. Em São Paulo, usar apelidos e metáforas era frequente em muitos círculos. Nunca deixou de sê-lo por completo, mas mudou: agora é o permanente. A insegurança no país, pela bandidagem ou pelos novos poderes, torna as “varreduras” aconselháveis: hoje, até a palavra amigo é associada a crime.

Fazer “varredura” é ilegal? Não. Ou sim, desde que direitos, vários, ficaram à mercê do que pretenda um procurador ou um juiz das novas forças – poucos, ainda bem. A conclusão deles, de que “as ‘varreduras’ nas casas de três senadores e de um ex-presidente eram obstrução à Lava Jato”, carece de sentido. Ninguém está obrigado a se sujeitar à hipótese de que esteja com suas conversas sob gravação. Impedir de ter a intimidade violada clandestinamente não é obstrução ilegal. Além disso, nem houve obstrução prática, por falta do que fosse obstruível.

Grampo ilegal foi posto na cela de Alberto Youssef por policiais federais, em Curitiba. Alguns dos que faziam campanha nas redes contra Dilma e o PT e pró-Aécio, o que hoje se pode ver como uma das primeiras evidências da missão político-ideológica que tinham. Têm. Mas a gravação clandestina e a propaganda ficaram nisso mesmo: certas ilegalidades são mais legais do que a lei, a depender do policial, procurador ou juiz que as cometa.

Como disse a presidente do Supremo, Cármen Lúcia, “cada vez que um juiz é agredido, eu e cada um de nós juízes é agredido”. Sem ressalvas. Logo, não importa o que o juiz faça. Calheiros fez pequena agressão verbal ao juiz de primeira instância que mandou a PF apreender equipamentos do Senados e prender quatro da Polícia Legislativa.

Se um congressista só pode ser processado e julgado pelo Supremo, no mínimo é ilógico que o próprio Congresso fique sujeito a um juiz de primeira instância, e não a decisões do Supremo. Ainda mais se a ordem é de que a Polícia Federal, dependência do Executivo, arrebate bens patrimoniais do Poder Legislativo.

Lourdes Nassif

Redatora-chefe no GGN

15 Comentários

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  1. Watergate Tupiniquim

    Não tome precauções para proteger sua intimidade, você pode estar sendo grampeado. E se estiver, ao tomar precauções você estará obstruindo o grampo e pode responder por isso”.

    Mas porque, depois de tanto tempo, o processo do Renan foi pautado pela Ministra Carmem Lúcia só agora?

    “It’s hard to believe in coincidence, but it’s even harder to believe in anything else.” – John Green, Will Grayson
    Esse julgamento tá mais prá vingança corporativa do que prá coincidência.

    Jânio, qual é mesmo o desrespeito que há nas palavras juizeco e chefete?

    Juiz chama Oficial de Justiça de Meirinho. Isso é desrespeito?

  2. Onde vamos parar? Quem ou o que vai parar isso?

    Funcionários do senado, atendendo solicitação da direção (ou não?) fazem varredura em locais ligados ao senado (residências dos senadores) e  a PF, sobre ordens judicial prende os funcionários e apreende equipamentos legalmente pertencente ao senado. E contra quem deu a ordem, o que foi feito? (nada?). Me esclareçam o que não entendi, porque com certeza, alguma coisa eu não entendi

  3. Deram corda d+ pra esses Concurseirozinhos, agora aguentem

    No Caminho, com Maikovski

    (Eduardo Alves da Costa)

    Na primeira noite eles se aproximam
    e roubam uma flor
    do nosso jardim.
    E não dizemos nada.
    Na segunda noite, já não se escondem:
    pisam as flores,
    matam nosso cão,
    e não dizemos nada.
    Até que um dia,
    o mais frágil deles
    entra sozinho em nossa casa,
    rouba-nos a luz, e,
    conhecendo nosso medo,
    arranca-nos a voz da garganta.
    E já não podemos dizer nada.

    1. Não se pode demonizar concurso público por isso

      Não só juízes, mas todos os servidores públicos de carreira são concursados. Auditores Fiscais, Analistas Ambientais do IBAMA, Técnicos do Judiciário, Administradores, Economistas, Professores… Vou dizer que todos estão errados por causa do concurso público? Ou se algum deles fizer uma besteira vou botar a culpa no concurso público?

      O mesmo concurso público que admite um Moro admitiu um Lewandowski, que enfrentou a truculência do Joaquim Barbosa no Mensalão, ou o Teori Zavascki, que condenou excessos da Lava-Jato. Admite também os (não poucos) juízes que condenaram os procedimentos da Lava-Jato na Associação Juízes para a Democracia.

      O mesmo concurso que admitiu um Janot ou um Dallagnol admitiu também um Eugênio Aragão ou uma Ela Wiecko.

      Queria saber qual a alternativa pra nomear juiz sem ser o concurso público. Eleição? Ok, já imaginaram um Maluf, um Feliciano ou um Bolsonaro juiz? Escolha pelo Congresso? Ok, da mesma forma que os isentos ministros do TCU? Ou, quem sabe, sorteio do cargo…

  4. Eu acho que a direção da

    Eu acho que a direção da Folha se contorce muitíssimo incomodada toda vez que Jânio escreve um artigo assim. Esse verniz da falsa imparcialidade está causando, não é de hoje, constrangimentos. Mas, Jânio é Jânio. Muitíssimo mais íntegro e preparado do que essa matilha que tomou de assalto as redações de todos os grandes meios de comunicação (velha mídia).

  5. Como diz o ditado: pimenta

    Como diz o ditado: pimenta nos olhos dos outros é refresco.

    Quem, em sã consciência, sentindo sua privacidade ameaçada, sendo uma autoridade de qualquer poder, não vai usar de instrumentos para confirmar suas dúvidas? Por acaso os ministros do STF não estã sempre a fazer varredura nas dependências do órgão, ou de suas residências? Se eles podem, por que não podem os senadores, ou os deputados, sobretudo se contam com agentes de segurança para lhes dar respaldo.

    Para mim, Carmem Lúcia podia ter ficado calada durante esse episódio, pelo menos até saber, ao certo, como usar as palavras. Da forma que usou, por um lado corretamente pelo modo com que Renan achacou os juízes de primeira instância, por outro, foi na forma de defender a categoria que deu de si uma imagem de corporativismo muito feia. Ela ficou muito feiz nessa fita, essa é que é a verdade. 

     

  6. e a 1.a…

    Peraí, o que está por trás disto tudo? Quem está dando tanto respaldo a juízes de 1.a Instância? Qual é o projeto de país? Porque novamente perdemos meio século. 30 anos só de redemocratização? Era este o resultado e o Estado esperado pelas elites de centro esquerda e pela Constituição desenvolvida por estas pessoas? A destruição de instituições, que como estamos vendo, nunca funcionaram., De um Estado que foi novamente reerguido depois da Anistia para preservar privilégios e elites é aplaudido e incentivado, mas resultará em que? A destruição de empresas e riquezas nacionais, não nos enterrrará ainda mais na dependência, na escravidão, no atraso? Quem está pensando no país? Para onde iremos?

  7. O BRASIL VIROU UMA CASA DA MÃE JUIZ.

    Vamos cair na real, é só os sócios do GOLPE se estrando. Num dia a PEC241 tira tudo do povo, no outro dá aumento de 37% para a PF.  No outro dia a PF ataca o PT, tá tudo muito confuso e estranho, porém muito nítido. Será que isso está vindo de fora? E a puliça é só pau mandado?

  8. Engraçado…

    Quando a Dilma foi impedida de nomear Lula ministro por atos de juízes de 1ª Instância NINGUÉM da mídia que agora grita contra a Operação Métis falou ABSOLUTAMENTE NADA! Nem Reinaldo Azevedo, nem Gilmar Mendes, NINGUÉM!!!

  9. Lutar contra gravações clandestinas

    Lutar contra gravações clandestinas é legitimo. Ninguém quer ter a sua privacidade invadida as escusas, tenha ou não amparo legal. Se a Lava Jato quer fazer isso sem restrições, que seja mais competente. Sem essa de James Bond avisar os inimigos que eles estão grampeados. Agora, se senadores e políticos querem fazer varreduras, que o façam. Mas as suas custas. Sem essa de usar policia legislativa (nem sabia que existia) paga pelo povo para uma atividade também clandestina. Consta que não houve ordem legal e numerada para essa missão. O nosso senado, um dos mais caros do planeta e um dos menos produtivos, precisa ter compostura.  Daqui a pouco, senador que sentir suspeitas de adultério vai colocar escutas na sua casa as expensas do senado. 

     

  10. Toda autoridade de direita

    Toda autoridade de direita agora se sente o próprio Odorico Paraguaçu num palanque de pracinha!

    Vampira, tome tenência!

  11. O povo aí já está tão raivoso

    O povo aí já está tão raivoso que está misturando as estações. Todo mundo acha lindo gritar que o Judiciário ganha muito, que tem privilégios, etc., etc. Isso é o senso comum.

    Coisa muito diversa é atacar a 1ª instância e a abrangência das suas decisões. O sistema judiciário é sistema de decisão inicial/revisão hierárquica. Diferente do exército, em que há obediência/mando. Não tem o menor sentido dividir hierarquias no Judiciário, e a última grande obra desse raciocínio foi a AP470, que deu em uma decisão sem direito a recurso. Todo mundo sabe no que dá, mas estão se juntando à horda para massacrar.

    Estão misturando pessoas com as suas competências para decidir, jogando em um bolo só, e chutando as garantias conquistadas na CF/88 para poder desfilar raiva contra uma instituição. É possível criticar salários sem jogar fora as decisões tomadas por gente com esses salários.

    Vocês que estão vociferando por causa da 1ª instância penal, em um casuísmo, são os mesmos que daqui meia hora vão chorar as pitangas porque o STF reformou uma decisão de 1ª instância cível para fornecer remédio porque o Orçamento não suporta pagar juros e remédio ao mesmo tempo. Ou que vão resmungar que a instância superior acabou com o direito à greve do servidor público como fez hoje.

    A esquerda raivosa caiu na vala comum dos kataguiri. Estão jogando o bebê fora junto com a água suja. Poderia citar autores do século passado unanimemente reconhecidos, que já sabiam que a 1ª instância é que renova o Direito, e que os tribunais superiores são desgastados pelas afinidades políticas que se formam naturalmente em senhores mais experientes.

    Poderia citar decisões recentes do STF que atacaram o direito à greve, à presunção de inocência, que sepultaram correções do FGTS e outras que reduziram garantias trabalhistas. Tudo porque o Orçamento Público a ser empenhado em juros e populismo não suporta mais garantias, ou porque o capital não pode ser ameaçado pelo trabalho. Ocorre que a esquerda raivosa depois de golpeada se tornou tão irracional quanto o MBL, então não adianta citar gente prudente do século passado o ou deste. Preferem linchar e bater, não importa onde. Vou é ficar quieto. 

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