Sem grupo de trabalho, a neoindustrialização empaca, por Luís Nassif

Agora, o governo pega seu principal quadro gerencial - o Ministro Fernando Haddad - e o coloca para caçar buracos fiscais

Agência Brasil

Tenho insistido aqui que, sem a montagem de grupos de trabalho para cada missão, juntando todos os setores envolvidos, e reportando-se diretamente ao presidente da República, o projeto da neoindustrialização não sairá do lugar.

Foi assim com JK e seu Plano de Metas, com Getúlio Vargas no seu segundo governo.

Confira na entrevista com Reginaldo Arcuri, presidente-executivo do Grupo Farmabrasil, formado preponderantemente por empresas farmacêuticas brasileiras.

Há uma meta ambiciosa, do Brasil produzir 70% dos medicamentos consumidos. E há um emaranhado de medidas que precisam ser tomadas, para viabilizar a meta.

Por exemplo, a Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária) retém autorizações equivalentes a um faturamento de 17 bilhões de reais/ano. Culpa dela? Claro que não. Trata-se de numa agência exemplar, uma criação histórica de Gonçalo Veccina e que, graças ao seu diretor-presidente, Almirante Barras Torres, resistiu à avalanche bolsonarista.

(Perdão, esqueci que ninguém mais se lembra que 700 mil brasileiros foram vitimados pela Covid, em um governo negacionista).

Ocorre que a Anvisa não realiza concurso público desde 2013, quando foram ofertadas 200 vagas para o cargo de Agente de Regulação Sanitária.

Em 2023, a Anvisa finalmente obteve autorização para realizar um novo concurso público, com 50 vagas para o cargo de Especialista em Regulação e Vigilância Sanitária.

Portanto, a Anvisa não realiza concurso público há 11 anos, enquanto os idiotas da objetividade colocam como objetivo único da política econômica a meta de déficit público zero. E estamos falando apenas em um dos obstáculos da missão mais ambiciosa do governo federal.

Se houvesse um Grupo de Trabalho, haveria a definição de todas as etapas necessárias para se chegar à meta. Se saberia do gargalo da Anvisa e, com o GT respondendo diretamente ao presidente da República, ele trataria de aprovar um concurso de emergência para repor os quadros da instituição.

Não apenas isso. Uma missão desse porte – e são 6 missões -, dentro do modelo proposto – de tratar cada tema de maneira sistêmica – exige uma gestão muito mais detalhada, só possível em um Grupo de Trabalho respondendo ao presidente da República.

Agora, o governo pega seu principal quadro gerencial – o Ministro Fernando Haddad – e o coloca para caçar buracos fiscais. Houvesse um mínimo de racionalidade, ele estaria coordenando os grupos de trabalho, articulando medidas fiscais, monetárias, regulatórias, poder de compra do Estado, parcerias com instituições de pesquisa e com o setor privado, para que as metas propostas não se tonassem apenas um número simbólico.

Ao tomar conhecimento do programa, na véspera do seu lançamento, a única observação de Lula é que não havia metas explícitas. Deu 90 dias para definir metas. Agora, se terá metas explícitas e nenhuma garantia de que serão alcançadas.

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Luis Nassif

5 Comentários

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  1. Nassif e sua boa fé (ingenuidade?).

    Não há (neo) industrialização tardia, meu caro.

    Os casos histórico são exceções que confirmam a regra, e mesmo assim, com contingentes históricos específicos, os quais nos faltam todos.

    A indústria global e sua participação nas rendas globais estão no fim, amigo.

    O gargalo está muito mais estreito.

    Não temos armas para “convencer” que somos pacíficos.

    Todos sabem que somos impotentes, por isso vêm aqui nos dar as mãos, como o ensaio pré nupcial com o francês.

    Você imagina uma cena daquelas entre Biden e Macron ou entre Macron e Trudeau?

    Não dá né?

    Aquilo é coisa de turismo sexual geopolítico, de acordo caracu.

    Estas instancias de JK, ou Vargas, Nassif, são fantasias, desculpe.

    O que houve na época era uma demanda externa, que obrigou os tupinambás a criarem algum tipo de “estuário” de geração de bens Df capitais e bens de consumo, mas com a manutenção rigorosa das remessas às matrizes (olha a dívida com desequilíbrio na balança de pagamentos!!!).

    Dá não, amigo, sem tributar os ultra ricos e ricos, e sem soberania nacional na emissão de moeda, não dá.

    Abrimos mão de emitir moeda, porque seríamos inflacionados, aí compramos dividas e pagamos os tributos privados aos mercados com os juros, que são mantidos nas alturas para….para… para?

    Conter a inflação… rerererere

  2. E você acha, Nassif, que Haddad quer mesmo saber deste papo desenvolvimentista e iria querer trocar de funções? Haddad está é felicíssimo fazendo dupla Pelé-Coutinho com Campos Neto em busca da batida perfeita da Faria Lima – dos juros sagrados e do deficit zero. Se forem falar para ele deste seu artigo, ele certamente pensará: “ih, o Nassif tá complicando”.

    Afinadíssimos como estão, os dois só vão brigar mais adiante, na hora de receber a benção da banca eleitoral dos rentistas, cada um querendo ser o melhor representante da Avenida, o Pelé da história.

    Quanto a Lula, não manda mais em nada: marcador de reunião, confiscador de aposentados, virou apenas um falastrão, o rei do bla-bla-bla, e se torna cada vez mais uma rainha da Inglaterra em busca da “glória” de um premio Nobel. Pau mandado dos rentistas, através de Haddad. Pau mandado de milico, através de Mucio. Pau subserviente do congresso, através de Lira e Pacheco. Aliancista com gangsters do judiciário para confiscar trabalhadores e assim garantir burras ainda mais cheias para os rentistas.

  3. De inteiro acordo, Nassif. Esse “espontaneísmo” deliberado, faz parte da tradição do “tendecismo” que, de um lado nega o Projeto Nacional de Desenvolvimento; de outro, faz apologia das políticas compensatórias enquanto acomoda-se nas sinecuras institucionais.

  4. Acrescentando ao comentário anterior, eu diria:

    A estultice da teoria econômica, que preconiza o controle inflacionário com manejo monetário (juros) não é uma estultice (apenas), é uma ação dolosa deliberada.

    Só é estultice para os que desconhecem suas entranhas, e mesmo assim vociferam apoio a tais asneiras.

    Outros conhecem bem do que se trata, e agem só por ganância e/ou cinismo.

    Vejamos.

    Na compreensão comum, o mercado de capitais fictícios, ou aqueles que derivam da remuneração do próprio dinheiro, sempre foram considerados como instrumentos dedicados a corrigir as assimetrias entre as geografias do capital, permitindo o aporte de capital onde ele falta (ou não é suficiente), para ampliar as complementaridades necessárias ao funcionamento global do sistema, recuperando ou instalando dinâmicas onde antes havia capital concentrado e parado.

    É que Marx chamava de capital empoçado, ou água parada capitalista

    Caberia ao mercado evitar o acúmulo de liquidez retida, e reverter tais excessos em novos arranjos produtivos ou inovações tecnológicas destinadas às vantagens competitivas e aumentos de produtividade.

    O problema é que esqueceram de combinar com os russos.

    Hoje, toda essa água parada se move de um lado para o outro em dutos próprios, e só se comunicam com a economia chamada de “real” como inundações pavorosas ou secas mortais.

    Bem lá atrás, até que houve um cumprimento parcial dessas tarefas pelo mercado.

    Enquanto havia uma regulação estatal forte, impedindo que a arbitragem das taxas dos capitais emprestados se tornassem, ao mesmo tempo, mais atrativas que a próprio produção, e que criassem ferramentas de (auto)alavancagem.

    Os chamados, derivativos dos derivativos, dos derivativos, quem viu o filme The Big Short (A grande aposta) pode se deliciar com a explicação de Margot Robbie na banheira, ou do personagem Ryan Gosling que ainda nem sonhava em fazer par com a moça no papel de Ken.

    Bem, e o que aconteceu?

    A teoria foi pelo ralo, mas foi defendida com unhas e dentes pela tigrada (e ainda é, não é Haddad?).

    O uso das taxas de juros como instrumento de controle inflacionário é como apagar incêndios com gasolina.

    O que explica as taxas inflacionárias inerciais e crescentes, mesmo com o mundo sofrendo com falta absoluta de demanda, pela precarização do trabalho e empobrecimento da base de consumo, restrita ao uso do crédito como moeda, ao invés de salários?

    Ora, ao remunerar o mercado com taxas obscenas, seja no Brasil, seja em qualquer outro lugar, ou até mesmo quando há taxas menores ou negativas de juros, o que expele os capitais empoçados nestes países para quem exportem déficits em economias mais fracas, com aquisição de títulos nesses locais com taxas positivas, o que acontece é o seguinte:

    – Aquele recurso que deveria servir como investimento produtivo, com retorno de algum juro pelos riscos, se torna um fator de aquisição e reprodução de mais e mais recursos, que se amontoam (se concentram) em contas dos fundos de investimentos, que vão se aninhando, e crescendo e gerando outras formas de reprodução.

    – Não bastasse isso, esse dinheiro que não vai para a produção industrial, infla preços de commodities com as operações flutuantes e incessantes dessas bolsas de mercadorias, e no caso dos mercados agrícolas, estimulam, de um lado o abandono de produção de comida (no Brasil, arroz, feijão, banana, leite) a concentração e internacionalização de terras, pela falência dos pequenos que vendem suas glebas aos grandes, e enfim, pelo encarecimento (inflação?????) dos preços de alimentos por essa tendência de mercado, somada aos câmbios depreciados, que desestimulam correções pelas importações.

    – Esse fenômeno também incide sobre preços administrados, onde empresas públicas, mistas e as concessões são alvos dos fundos de investimentos, que sugam toda lucratividade possível, sem qualquer compromisso estratégico e com política de preços (de novo, mais inflação, Haddad??????).

    Exemplo: Petrobrás no ciclo bolsonariano, e a Enel, que agora, depois de extrair todas as gotas de lucratividade, vai devolver sem indenizar nada, e até já combinou com a mídia e com o governo o seu papel de vilã nº 1.

    A Arteris na concessão da BR 101, Rodovia Mário Covas, entre a capital do Rio e o sul capixaba tenta a mesma manobra, mas nãos ei se dará certo.

    Assim, a cada tutu de juro pago para conter inflação, mais inflação vai ser gerada.

    Outro exemplo?

    Mercado imobiliário e a gentrificação.

    Não falo nem daqui, um mercado subsidiário e pobre, mas vejam Nova York, e o ataque às leis de proteção do inquilinato e dos pequenos proprietários.

    Há vários outros exemplos de como a teoria monetária de controle inflacionário é um crime perfeito, praticado de forma impune, e com anuência das vítimas.

    Ao invés dos estados soberanos dizerem quanto de liquidez no mercado vai existir, tributando este ou aquele produto, ou esta ou aquela faixa de renda para enxugar os volumes excedentes, e determinar quais setores estratégicos necessitam de aportes, ou quais áreas sociais requerem mais atenção, estes estados delegam aos mercados, e renunciam a dois dos poderes intrínsecos da soberania:

    Emitir moeda e determinar assim qual é o preço pago pelas trocas, e tributar, para corrigir distorções e desigualdades e determinar o quanto de liquidez vai haver.

    Como consequência, trocou-se moeda por crédito (leia-se, dívida), e deram aos mercados o poder de tributar: juros.

    Deixem de besteira com o Banco Central, aquela autarquia já foi privatizada desde 1980.

    Neo industrialização Nassif?

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