Militares que participaram de ataque às urnas foram condecorados após eleições. Todos eles, por Hugo Souza

Todos os 10 militares da assim chamada Equipe das Forças Armadas de Fiscalização do Sistema Eletrônico de Votação.

Coronel Ricardo Sant’ana, de máscara camuflada, inspecionando códigos-fonte das urnas eletrônicas no prédio do TSE (Foto: Antonio Augusto/Secom/TSE).

do Come Ananás

Exclusivo: militares que participaram de ataque às urnas foram condecorados após eleições. Todos eles

por Hugo Souza

Todos os 10 militares que participaram da assim chamada Equipe das Forças Armadas de Fiscalização do Sistema Eletrônico de Votação (EFASEV) foram condecorados entre o fim do processo eleitoral de 2022 e os ataques do 8/1. A EFASEV, que foi instrumento de Jair Bolsonaro e das Forças Armadas para lançar dúvidas a respeito da lisura das eleições, estimulando a revolta social, era composta por quatro militares do Exército, três da Marinha e três da Aeronáutica.

Entre os condecorados está o coronel do Exército Ricardo Sant’ana, integrante da EFASEV que foi impedido pelo TSE de acessar as dependências do tribunal após a imprensa identificar que Sant’ana publicava em suas redes sociais notícias falsas sobre o PT e sobre o sistema brasileiro de votação eletrônica. Apesar disso, Ricardo Sant’ana ainda atua no Centro de Desenvolvimento de Sistemas do Exército.

Entre os militares da EFASEV condecorados está também o capitão de fragata Vilc Queupe Rufino, da Marinha. No ano passado, Come Ananás informou com exclusividade que Rufino também fez postagens pró-Bolsonaro e antipetistas nas redes sociais. Para isso, o capitão de fragata usava um pseudônimo. Após a reportagem tentar contato com o militar, sem resposta, as postagens foram apagadas.

Integraram a EFASEV, pelo Exército, além de Ricardo Sant’ana, o coronel Marcelo Nogueira de Sousa (chefe da equipe) e os majores Renato Vargas Monteiro e Marcio Antônio Amite; pela Marinha, além de Vilc Rufino, os também capitães de fragata Marcus Rogers Cavalcante Andrade e Hélio Mendes Salmon; pela Aeronáutica, o coronel Wagner Oliveira da Silva, o tenente-coronel Rafael Salema Marques e o capitão Heitor Albuquerque Vieira.

Após as eleições, os três oficiais intermediários que integraram a EFASEV ganharam a Medalha da Vitória, por força de uma portaria do Ministério da Defesa de 17 de novembro do ano passado assinada pelo então titular da pasta, general Paulo Sérgio Nogueira de Oliveira.

Já os sete oficiais superiores que integraram a EFASEV viraram oficiais ou cavaleiros da Ordem do Mérito da Defesa, por força de um decreto do dia 22 de novembro assinado pelo general Paulo Sérgio e pelo então presidente Bolsonaro.

O coronel Ricardo Sant’ana e o coronel aviador Wagner Oliveira da Silva, admitidos no grau de Oficial no Quadro Ordinário da Ordem do Mérito da Defesa, assinavam documentos da EFASEV como representantes, respectivamente, do Exército e da Aeronáutica. O capitão de fragata Marcus Rogers Cavalcante Andrade assinava como representante da Marinha.

Na última quinta-feira, 24, Come Ananás mostrou, com documentos, que a EFASEV e sua atuação golpista no segundo semestre do ano passado foram produtos de mobilização institucional das Forças Armadas, ao invés de a equipe ter surgido e atuado à revelia dos comandos das Forças Singulares; ao invés de a EFASEV ter sido mero fruto de pressões políticas de Bolsonaro sobre o general Paulo Sérgio, conforme “narrativa” que em dado momento chegou a prevalecer.

Antes das eleições, o coronel Marcelo Nogueira de Sousa chegou a dizer o seguinte em uma audiência pública no Senado: “é possível que um código malicioso tenha sido inserido na urna e fique lá latente esperando algum tipo de acionamento”. Após as eleições, no dia 9 de novembro, o Ministério da Defesa divulgou um relatório da EFASEV segundo o qual, por supostas dificuldades criadas pelo TSE, o trabalho da equipe das Forças Armadas havia sido “inconclusivo para a detecção de eventuais anomalias no funcionamento das urnas”.

Algo esquecida nas investigações sobre o 8/1, a atuação sediciosa da EFASEV, para envenenar a sociedade brasileira com suspeitas sobre as urnas eletrônicas, voltou à baila na semana passada após o hacker Walter Delgatti Neto dizer à CPMI do 8/1 e à Polícia Federal que esteve cinco vezes no Ministério da Defesa antes das eleições, a fim de participar de uma operação para desacreditar as urnas. Muito provavelmente, por lógica elementar, Delgatti esteve com membros da EFASEV.

Sem anistia?

O regulamento da Medalha da Vitória diz que a honraria será cassada em caso de militares condecorados “que cometerem atos contrários à dignidade e à honra militar, ao prestígio ou ao decoro da corporação ou à moral pública”. O regulamento da Ordem do Mérito da Defesa prevê que serão excluídos da ordem “os agraciados que cometerem faltas contrárias à dignidade e à honra militar, à moral da corporação ou da sociedade”.

Com a palavra, o atual comandante do Exército, general Tomás Paiva, que na última sexta-feira, Dia do Soldado, prometeu que “desvios de conduta serão repudiados e corrigidos, a exemplo do que fez Caxias, o forjador do caráter militar brasileiro”.

Com a palavra, o governo Lula, que prometeu: “sem anistia”.

Porém, o chefe da EFASEV, coronel Marcelo Nogueira de Sousa – aquele que foi ao Senado insinuar que as urnas eletrônicas estavam batizadas com um malware – ganhou em março, no governo Lula e com o Exército sob o comando do general Tomás Paiva, a medalha da Ordem do Mérito Militar, nada menos que a mais alta honraria da Força Terrestre. O decreto de mais esta condecoração do coronel que encabeçou a EFASEV foi assinado pelo presidente Lula e pelo sucessor do general Paulo Sérgio no Ministério da Defesa, José Múcio Monteiro.

Hugo Souza é jornalista

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Hugo Souza

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