Opinião impressionista sobre a Semana de 1922, por Jorge Alberto Benitz

Não existe nada mais provinciano do que reduzir a discussão do modernismo de 1922, e do modernismo do Brasil, a uma disputa entre Rio e São Paulo

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Opinião impressionista sobre a Semana de 1922

por Jorge Alberto Benitz

    Lendo um artigo de um professor acerca da Semana de Arte Moderna de 1922, assunto que me interessa, percebi algo que há tempo me incomoda vide link Guardiões do mito da Semana de 22 apagaram cultura popular e artistas negros – 04_06_2022 – Ilustríssima – Folha.pdf. O professor é alguém muito conceituado. O autor do artigo é Doutor formado em Londres, coordenador do programa de pós- graduação em História da Arte da UFRJ. Em um primeiro momento, deixei de lado o referido artigo. Voltei a me interessar quando me deparei com uma crítica do amigo feicebuqueano Tales Ab’ Sáber ao distinto doutor, sem cita- lo. Diz Tales “MACUNAÍMA FOI À MACUMBA DA TIA CIATA E MÁRIO DE ANDRADE ENTREVISTOU PIXINGUINHA

    Não existe nada mais provinciano do que reduzir a discussão do modernismo de 1922, e do modernismo do Brasil, a uma disputa entre Rio e São Paulo, elitismo e popular, modernistas e política, a esta altura do fim do mundo. Em dizer que ao se falar de Oswald, Mário e Vila-Lobos, não se fala de João do Rio, Pixinguinha e tia Ciata… Que aqueles artistas não foram suficientemente engajados… Sério? Mas que maçada! O que há de novo agora é anterior ao que há de velho? Nossa senhora da boa morte, acudai-nos! Nosso Santo e Bandeira, clareai! Acho que o pessoal não entendeu nada não…, nada, nada, nada… Vixe&helli p; E viva o Rio de Janeiro, o Brasil, que continua lindo!, ainda que encharcado em sangue, como sempre…”.

    Eu, impressionista juramentado, que apesar de não considerar a Semana de 1922, o marco zero da cultura brasileira, como foi vendida por importantes intelectuais uspianos, tenho que concordar com Tales ao postular que é muita “forçação de barra” requentar, nesta altura do campeonato, este assunto trazendo à baila a disputa entre Rio e São Paulo, na época.

    Reflexão que me levou a outra. Sempre lembro que aprendi, e ainda aprendo, muito, lendo autores acadêmicos. Só nunca engoli a tese corporativa deles dando a entender que são o monopólio da cultura e da inteligência. Alguns, dos mais arrogantes deles vão mais fundo neste desprezo ao mundo intelectual não- acadêmico  rotulando –os, em tom pejorativo e debochado, de meros impressionistas. Realmente, concordo que a academia, nas áreas das chamadas ciências humanas, significou, para usar um termo atual, um up- grade na discussão cultural em geral. Só que, por exemplo, ficando nesta discussão sobre a Semana de 1922, percebo que o q ue mais prepondera é o impressionismo. Por exemplo, o artigo citado, que saiu neste domingo (05 06 22) na FSP, não é mais que um texto eivado de subjetivismo, portanto, um texto impressionista que “puxa brasa para o assado” do Rio de janeiro. Claro, é um texto de alguém com uma cultura e conhecimento acima da média, com argumentos bem formulados, mas na essência, é um libelo pró Rio que pode muito bem ser motivo de um artigo também impressionista, com uma réplica pró São Paulo de um outro doutor, dotado também de  cultura acima da média, com argumentos bem formulados, etc, eteceterá. Aliás, todos os artigos escritos pró ou contra a Semana de 22 pecam, em algum momento ou o tempo todo, por parcialidade ainda que todos defendam escreverem atendendo o rigor acadêmico e de modo isento, imparcial e objetivo.

    Evidente que toda a discussão sobre Arte e Literatura é bem vinda. Só que se espera de um doutor, formado em uma universidade europeia prestigiada, algo menos requentado e datado, algo menos do mesmo. A propósito, em certa parte do artigo ele defende a ideia de que “A boa metodologia histórica recomenda não interpretar o passado pelo crivo do que veio depois: isso se chama historicismo. “ Justamente, o que ele faz, exigindo dos protagonistas de semana de 1922 a defesa de bandeiras de luta de hoje, quando afirma que ela “consagrou expressões eruditas e apagou a cultura popular e artistas afrodescendentes. ” Que eu saiba, eles fizeram o contrário. Não sou eu quem diz isso, mas Angel Rama quando defende que os movimentos vanguardistas dos anos 20 do século passado, entre os quais insere os protagonistas do movimento da Semana de 22 brasileira, trouxeram   “Uma postura nova na cena latino-americana “já sem vergonha das culturas populares e reconhecendo como válidas, facilitando sua expansão”.

Jorge Alberto Benitz é engenheiro e escritor.

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Redação

1 Comentário

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  1. O mais importante desta discussão é que estamos verificando a importância cultural inigualável acontecida há 1 século. Quando o Brasil ainda era cabeça antes de metamorfosear-se em rabo a partir de 1930. Depois do Golpe Ditatorial Esquerdopata-Fascista o que mais criamos de relevância mundial?? Pabblo Vittar? Anitta? Mais uma Caricatura Brasileira, como Carmen Miranda, inventada a partir dos interesses comerciais norte-americanos??!! Basta lembrar que esta Geração é contemporânea dos negros, periféricos, brasileiros Machado de Assis e Lima Barreto. Pobre país rico. 1 século enterrando uma Nação Potência Continental na Latrina. Mas de muito fácil explicação.

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