“A política de cultura, construída em ambiente livre, fomenta a criatividade e o pensamento crítico” avalia Márcio Tavares

Ele também ressaltou o papel indispensável de coletivos e movimentos sociais como parceiros  na concepção e implementação de projetos culturais.

“A política de cultura, construída em ambiente livre, fomenta a criatividade e o pensamento crítico” avalia Márcio Tavares

por Arnaldo Cardoso

Com o título “A recriação do Ministério da Cultura é medida fundamental para um governo democrático” foi publicada neste Jornal GGN no último dia 6 de maio a primeira parte de uma entrevista com Márcio Tavares, historiador, curador e Secretário Nacional de Cultura do Partido dos Trabalhadores, na qual ele tratou da necessidade de recriação do MinC, da importância de investimentos públicos e privados em cultura bem como da valorização da cultura popular regional em um pais tão rico e diverso culturalmente como o Brasil. Ele também ressaltou o papel indispensável de coletivos e movimentos sociais como parceiros  na concepção e implementação de projetos culturais.

Planejamento e liberdade

Nesta segunda parte da entrevista, perguntamos para Tavares se ele considera que uma política cultural pública de âmbito nacional pode promover transformações sociais significativas, sem comprometer a liberdade essencial para uma democrática fruição das artes e da cultura. Em resposta ele desenvolveu as considerações que seguem.

“A política cultural deve ser ampla. Precisamos atuar na valorização das culturais locais e populares com políticas específicas, além disso precisamos construir imensas possibilidades de acesso à repertório diverso e à circulação de linguagens. A produção e fruição de arte e cultura deve ser acessível e possível para todos e em todo o país. Disso depende a reestruturação da gestão, do financiamento e da criação de programas capazes de responder à dinâmica artística e cultural contemporânea. Uma política nacional para as artes, por exemplo, é fundamental. Além disso, a atuação de artistas e fazedores de cultura deve ser livre. A censura que retornou ao país e o dirigismo cultural tosco do governo Bolsonaro devem ser enterrados como entulhos autoritários inaceitáveis em uma democracia. A política de cultura, construída em ambiente livre, fomenta a criatividade e o pensamento crítico que são indispensáveis para aprofundar a democracia”.

Descolonizar o pensamento e as artes

Abordando os debates e iniciativas acerca da necessidade de descolonizar o pensamento e as artes, que tem ganhado espaço em várias sociedades, Márcio Tavares demonstrou compreensão e afinidade com o debate, defendendo sua pertinência.

“As visões pós-coloniais e decoloniais têm oferecido uma contribuição importante para que olhemos para a riqueza do pensamento e das epistemologias criadas fora dos grandes centros do poder ocidental. As políticas públicas, inclusive as de cultura, podem e devem acompanhar os avanços que esses estudos trazem. Há, por exemplo, nos museus atualmente uma preocupação cada vez maior com a presença da produção de artistas negros e mulheres que foram historicamente invisibilizados e isso é resultado desse movimento. Um país como o nosso precisa promover a igualdade e um dos elementos que estrutura hierarquias, preconceitos e desigualdades é justamente a herança colonial. Ver a riqueza e a elaboração do pensamento dos povos originários e povos indígenas é algo da maior importância para o desenvolvimento de políticas culturais que façam a diferença”.

A importância de um sistema nacional de cultura e o caráter estratégico de grandes eventos como bienais de artes

Fazendo menção à 34ª Bienal Internacional de Arte de São Paulo, que ecoou o verso “Faz escuro mas eu canto”, do poeta amazonense Thiago de Mello (1926-2022) e teve como principal realização, a exibição de um número expressivo de obras de arte indígena e de artistas latino-americanos, abarcando uma maior pluralidade de vozes, perguntamos a Tavares qual a sua avaliação sobre a realização de eventos como esse e se a Administração Pública pode ser um agente relevante para a ampliação de oferta desse tipo de evento artístico-cultural.

Márcio respaldou a importância de eventos dessa natureza e salientou seu caráter estratégico na projeção nacional e internacional da arte e da cultura brasileiras.

“Considero extremamente importante. Em linha com a pergunta anterior, atualmente curadores estão mais atentos para uma produção mais diversa e com diferentes matrizes de origem. Bienais e eventos do tipo são plataformas de longo alcance que devem ter o apoio do setor público tanto quanto possível pelo impacto que causam na sociedade e no próprio campo artístico. O apoio a eventos como esse, claro, deve estar em linha com um fomento às artes que não esqueça os espaços independentes e os pequenos coletivos, as iniciativas periféricas, etc. Porém, um país importante como o Brasil precisa de museus com acervos cada vez mais relevantes e de iniciativas artísticas como as bienais”.

Na terceira e última parte desta entrevista com o Secretário Nacional de Cultura do Partido dos Trabalhadores, a ser publicada neste Jornal GGN na próxima semana, serão abordadas questões como a relação entre arte e juventude, imagens urbanas, periferias e arte de rua, a cultura hip-hop e a potência criativa dos jovens.

Arnaldo Cardoso, sociólogo e cientista político formado pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP), escritor e professor universitário.

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