Projeto de lei coloca fiscais agropecuários em alerta

Tatiane Correia
Repórter do GGN desde 2019. Graduada em Comunicação Social - Habilitação em Jornalismo pela Universidade Municipal de São Caetano do Sul (USCS), MBA em Derivativos e Informações Econômico-Financeiras pela Fundação Instituto de Administração (FIA). Com passagens pela revista Executivos Financeiros e Agência Dinheiro Vivo.
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Terceirização pode esvaziar funções de uma categoria que ajudou a garantir qualidade e confiabilidade dos itens exportados pelo país

Foto: Reprodução/Governo do Tocantins

A terceirização da fiscalização de produtos agropecuários traz preocupação entre a categoria de fiscais agropecuários, tanto por um possível esvaziamento da função como pelo impacto na saúde pública e na competitividade do setor no mercado internacional.

O tema tem sido debatido pela categoria por conta do avanço do Projeto de Lei 1293/21, que atualmente está nas mãos do Senado Federal depois de aprovado pela Comissão de Constituição e Justiça (CCJ).

Em linhas gerais, o projeto realiza uma série de mudanças no controle sanitário vigente no país, e permite que produtores rurais e a indústria exerçam o autocontrole de suas atividades, esvaziando a fiscalização existente atualmente.

“É função do governo estabelecer um nível adequado de proteção à vida dos animais, vegetais e das pessoas”, disse um dos fiscais ouvidos pelo Jornal GGN sob condição de anonimato, ressaltando que o mais importante para esse profissional é “alcançar a eficiência, credibilidade e respeito funcional”.

“Isso é essencial para o cumprimento das normas de sanidade e segurança alimentar exigidas nas inter-relações do mundo moderno”, ressalta o fiscal. “Nesse contexto, nós temos que garantir a exigência de alimentos sadios, certificação de origem. Temos a responsabilidade de garantir qualidade e confiabilidade, essa é a nossa função de governo”.

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O Serviço de Inspeção Federal (SIF/MAPA) faz o controle permanente dos estabelecimentos que comercializam itens de origem animal no Brasil e no exterior. No caso, é feita uma inspeção ante mortem e post mortem por inspetores veterinários e agentes de inspeção industrial e sanitária.

Um exemplo da importância da função de fiscal agropecuário pode ser visto na avaliação de produto para exportação. Para que uma empresa possa vencer um container de filé mignon ao exterior, que tem 20 toneladas de carga, é necessário o abate de mais de 6 mil cabeças de boi, com peso médio de 500 kg e média de idade em torno de três anos.

O fiscal é responsável por acompanhar todo esse processo, do nascimento ao abate do boi. “(O fiscal) tem que fiscalizar vacinas, medicamentos, ração e outros insumos”, diz. “A partir desse projeto, o fiscal só vai dar conformidade ao que vier da iniciativa privada. Será que vai ter a mesma credibilidade?”

Categoria é mais uma afetada pelo arrocho salarial

A função de fiscal agropecuária passou por um período de valorização na esfera federal. Um dos fiscais relembra que a categoria chegou a receber o equivalente a 92% do salário pago na Receita Federal, mas começaram a ver uma regressão expressiva no holerite.

“Hoje, o menor salário da Receita Federal é menor do que o nosso maior salário”, diz o fiscal. “O menor salário na Receita Federal é de R$ 22.529, e o nosso maior é de R$ 20,3 mil. Estamos com uma grande defasagem, e isso contradiz com a importância que nossa carreira tem”.

Embora o principal argumento do PL 1293/21 é a falta de pessoal, a lei 9849/ 99 admite contratação Temporária para ações e atividades da Defesa Agropecuária. “Nossa preocupação é que um projeto desses pode trazer danos irreversíveis a um sistema que é responsável pelo sucesso do agronegócio brasileiro”.

Um fiscal agropecuário chega a questionar se a iniciativa privada terá o mesmo compromisso dos servidores públicos federais no que se refere à segurança dos produtos comercializados, como prega inclusive o artigo 37 da Constituição Federal.

“Passando para a iniciativa privada, ela vai ter condições de obedecer? Com esses princípios, você não pode admitir falhas. A iniciativa privada vai ter condição? Provavelmente não, pois o principal objetivo é o lucro”, ressalta o profissional.

“O agro tem uma importância grande para as contas públicas. Quando envolve segurança alimentar e mercado, você tem que ter um setor público altamente competente para sustentar as regras, normas e padrões, para que os produtos tenham qualidade e confiabilidade”.

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Repórter do GGN desde 2019. Graduada em Comunicação Social - Habilitação em Jornalismo pela Universidade Municipal de São Caetano do Sul (USCS), MBA em Derivativos e Informações Econômico-Financeiras pela Fundação Instituto de Administração (FIA). Com passagens pela revista Executivos Financeiros e Agência Dinheiro Vivo.

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  1. O olho da Cleptocracia dentro das Fábricas Brasileiras controlando, criminalizando e burocratizando a Produção AgroPecuária Brasileira. Não esquecemos da Operação farsante e criminosa da Cleptocracia: Carne Fraca. Senadores indicavam até Fiscais de Linha, para terem o controle da produção e assim mais informações para extorquirem Trabalhadores e Industriais Brasileiros da AgroIndústria. Senadores, Deputados, Ministros gritando aos 4 ventos que salsicha era feita com papel. Condenando 550.000 EMPREGOS BRASILEIROS apenas na JBS. Mas o que importa é a manutenção dos Feudos da Cleptocracia Estatal. Indústria da Miséria, da Desindustrializaçã, do AntiCapitalismo e AntiNacionalismo. Pobre país rico. Mas de muito, muito, muito fácil explicação.

  2. Fiscais agropecuários públicos, altamente treinados e bem remunerados são fundamentais para averiguar procedimentos corretos nos frigoríficos, verificar a sanidade dos animais, a qualidade dos produtos, etc. Ao terceirizar ou privatizar estas atividades, profissionais ou empresas prestadoras contratadas para esta finalidade facilmente se submeterão aos interesses financeiros dos empresários contratantes. O primeiro que condenar uma carga ou um lote é demitido; o próximo a ser contratado já saberão as regras do jogo.
    Na década de 80, Inglaterra com Tatcher fez algo parecido e foi comprovado que esta política permitiu o alastramento do Mal da vaca Louca. Acho que a bancada do agronégocio está dando um tiro no pé, num tempo em que o mundo está cada vez mais atento para as questões sanitárias, ambientais, etc.

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