Especialistas apontam que autonomia escolar ainda é desafio no Brasil

Do Centro de Referências em Educação Integral

Jéssica Moreira

Mesmo após a promulgação da Lei de Diretrizes e Bases (LDB) da educação em 1996, apontando que as unidades públicas de ensino devem possuir progressivos graus de autonomia pedagógica, administrativa e financeira (artigo 15º), a realidade no país mostra que a maioria das escolas ainda tem dificuldade em sair do padrão. Apresentam baixa efetividade dos conselhos escolares e associações de pais e mestres, disciplinas fragmentadas e um currículo que não dialoga com a realidade dos alunos.

Reconhecida  por transformar a escola a partir da mobilização dos moradores locais e fazer de Heliópolis (SP) um bairro educador, a escola municipal Campos Salles foi palco na manhã da última sexta-feira (22/11), de debate sobre autonomia escolar, na qual foi discutido o papel da comunidade e da direção escolar para introduzir uma cultura democrática nas unidades. A mesa de diálogo fez parte da programação do III Seminário da Educação “Heliópolis, bairro educador”, que teve início na última quinta-feira (21/11).

Segundo o diretor da Campos Salles, Braz Nogueira, para que a escola seja efetivamente autônoma, é importante que haja uma articulação que venha de dentro da própria instituição, envolvendo todos os seus membros. “É preciso existir diálogo constante e formação continuada dos profissionais da educação dentro da escola, colocando professores e diretores em um mesmo patamar de poder de decisão”.

EMEF Campos Salles transforma currículo e valoriza a autonomia do estudante

No lugar da aula expositiva, os estudantes passaram a receber roteiros de estudo, nos quais, desenvolvem percursos de aprendizagem individuais e em grupo sobre os mais diferentes campos do conhecimento. Embora existam atividades de matemática ou de português, ciências e história, existem roteiros interdisciplinares que têm por pressuposto o estímulo ao pensamento e investigação contextualizada do estudante.

A articulação da Campos Salles com moradores e líderes do bairro  rendeu uma  reforma da proposta pedagógica. Para estimular a convivência entre os estudantes e transformação nas relações de ensino e aprendizagem, as salas de aula perderam as paredes e se transformaram em verdadeiros salões, onde atuam de três a quatro professores em turmas de 75 alunos de idades diversas. Também foram criadas comissões mediadoras em que os estudantes se tornaram responsáveis pela convivência, pelo respeito ao espaço, entre os estudantes e pela relação professor-aluno.

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Braz aponta que uma das maiores dificuldades para a mudança de paradigma se deu entre os adultos e não entre as crianças, que, a cada dia, têm se apropriado mais do projeto pedagógico da escola. “Ainda há muitos elementos cristalizados entre os adultos. Mas, como estratégia temos trabalhado com a ideia de docência solidária, em que os professores trabalham em equipe”.

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Comissões de pais e comunidade transformaram a EMEF Campos Salles

Com o objetivo de aproximar a comunidade da escola, a EMEF Campos Salles implementou comissões temáticas que reuniam as famílias dos estudantes e lideranças comunitárias para pensar a educação no território e todos os temas que tangenciam a vida escolar e o desenvolvimento integral das crianças e adolescentes no bairro. Saiba mais sobre o bairro educador clicando aqui.

Para a diretora da Associação Cidade Escola Aprendiz, Helena Singer, a atual estrutura separada em séries por idade não prepara o estudante para a vida em sociedade, que não faz essa divisão entre faixas etárias.

Helena criticou também a atual forma de organização do sistema de ensino, no qual os profissionais escolhem atuar em uma escola pela facilidade de locomoção e não pela identificação com o projeto educacional. “Esse modelo faz com que a alma da escola – que é a equipe escolar -, não tenha vínculos com os estudantes, e muito menos com a comunidade ao redor da unidade”.

Ela discorda ainda da forma como as secretarias de educação padronizam a estrutura escolar, ao determinar a estrutura da instituição, impedindo que as escolas optem por um desenho que dialogue com seu Projeto Político Pedagógico (PPP).  “A escola deve se apropriar do que diz a lei [LDB] e se organizar de forma diferente. Isso, porém, é um desafio, já que as pessoas têm que lutar para não aceitar aquilo que já vem pronto”.

A diretora de orientação técnica de ensino fundamental e média da Secretaria Municipal de Educação de São Paulo, Fátima Antonio, disse que a pasta tem fomentado entre as diretorias regionais de ensino da cidade maior compartilhamento dos PPPs das escolas nas comunidades locais.  ”Não se constrói autonomia se não há compromisso de todos. Esse movimento curricular não se constrói a paredes fechadas. É preciso olhar a realidade local e a história da comunidade. O currículo deve levar em consideração a história do sujeito local, considerando todas as suas dimensões – cultural, social e histórica”.

Redação

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