E o Irã, também tem direito de defesa?, por Luis Felipe Miguel

Nada de “direito de defesa”. Biden alardeou novamente sua “aliança inabalável com o sionismo e a Europa foi na mesma toada.

Reprodução vídeo RTP

E o Irã, também tem direito de defesa?

por Luis Felipe Miguel

No sábado, o Irã atingiu Israel com drones e mísseis.

É uma resposta ao atentado do dia 1º de abril, quando Israel matou sete militares, inclusive um general, em ataque a um consulado iraniano na Síria.

Como todos sabem, Israel está há mais de seis meses numa campanha de extermínio contra a população de Gaza. Matou mais de 30 mil civis, incluindo quase 15 mil crianças.

Alega estar retaliando uma incursão do Hamas, em 7 de outubro de 2023, que deixou 1,2 mil israelenses mortos (muitos deles, hoje está comprovado, mortos pela reação desastrada do exército sionista) e levou cerca de 200 pessoas como reféns.

A despeito da desproporcionalidade da resposta, o governo de Israel diz (e a mídia repete): estão exercendo o direito de defesa.

Não é preciso ter nenhuma simpatia pelo regime teocrático iraniano para reconhecer a gravidade da agressão israelense.

A pergunta que fica é: então o Irã tem igual direito de defesa?

Em resposta ao atentado terrorista contra suas instalações diplomáticas em Damasco, ele pode chacinar a população de Israel?

Mais uma vez, fica escancarada a hipocrisia do Ocidente, que dá carta branca para todas as atrocidades cometidas pelo sionismo e demonstra a cada dia sua absoluta indiferença à sorte dos palestinos.

Nada de “direito de defesa”. Biden alardeou novamente sua “aliança inabalável com o sionismo e a Europa foi na mesma toada.

Na imprensa brasileira, destaque para a “indignação” da diplomacia israelense, pelo fato de que o nosso governo, embora expressando preocupação com a escalada do conflito, não condenou unilateralmente a ação iraniana.

O Irã, prudentemente, disse que o ataque de sábado – dirigido, cabe registrar, exclusivamente contra alvos militares – esgotava sua resposta à agressão israelense e que se absteria de novas iniciativas.

Com isso, não cai na armadilha de Netanyahu, que precisa desesperadamente de um jeito de transformar Israel em “vítima”, para tentar ganhar terreno na opinião pública mundial.

Esse é um campo de batalha essencial. O caso do regime racista da África do Sul, no final do século passado, serve de exemplo. Em relativamente curto espaço de tempo, as potências ocidentais passaram do apoio entusiástico para a crítica e da crítica para as sanções, até que o apartheid ruiu.

O motivo? O desgaste crescente gerado pelo apoio a um regime que despertava repulsa cada vez maior na opinião dos cidadãos.

Israel tenta se apoiar na memória do Holocausto judeu, mas esse estratagema está desgastado, seja porque o sofrimento vivido anteriormente não justifica infligir hoje sofrimento a outros, seja porque uma parcela significativa da comunidade judaica está se insurgindo contra esta usurpação.

Diante disto, o outro caminho em que Israel aposta é o fortalecimento de seus laços com a extrema-direita mundial, com a qual possui muitas afinidades e com a qual conta para fazer pouco caso dos horrores contra o povo palestino.

A solidariedade à Palestina e a paz no Oriente Médio são dois motivos a mais para combater e derrotar a extrema-direita.

Luis Felipe Miguel é professor do Instituto de Ciência Política da UnB. Autor, entre outros livros, de O colapso da democracia no Brasil (Expressão Popular).

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Luis Felipe Miguel

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