Observatorio de Geopolitica
O Observatório de Geopolítica do GGN tem como propósito analisar, de uma perspectiva crítica, a conjuntura internacional e os principais movimentos do Sistemas Mundial Moderno. Partimos do entendimento que o Sistema Internacional passa por profundas transformações estruturais, de caráter secular. E à partir desta compreensão se direcionam nossas contribuições no campo das Relações Internacionais, da Economia Política Internacional e da Geopolítica.
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Putin e o Balanço Geral da Rússia em 2023, por Valdir da Silva Bezerra

A normalização das relações entre a Rússia e a Europa, Putin deixou claro que não foram os russos que não cooperaram, mas os europeus

Mitya Aleshkovsky – Flickr

do Observatório de Geopolítica

Putin e o Balanço Geral da Rússia em 2023

por Valdir da Silva Bezerra

Durante mais de 4 horas de coletiva de imprensa no dia 14 de dezembro para o programa ‘Linha Direta’, Putin expos sua visão sobre o balanço geral da Rússia para o ano de 2023. Afinal, a Rússia comandada por Putin é um dos principais protagonistas das mudanças hoje em curso no mundo.

De início, Putin deixou bem claro que o fortalecimento da soberania da Rússia é um elemento fundamental para sua sobrevivência no cenário internacional. Para a consecução desse objetivo foi que o país iniciou justamente a operação militar especial no ano passado, com o objetivo de mitigar a ameaça eu vinha sendo emanada do país vizinho. A Rússia, além do mais, está lutando para defender as populações do antigo sudeste ucraniano, dado que tais regiões, além de serem territórios historicamente russos, também vinham sofrendo com constantes violações aos direitos humanos ocasionadas pelas tentativas de retomada militar do controle daquelas partes pelo governo de Kiev desde 2014.

Ao mesmo tempo, Putin lembrou que no âmbito de sua atual contraofensiva, a Ucrânia não conseguiu mostrar nenhum sucesso, o que escancara a ilusória expectativa do Ocidente quanto a uma possível derrota das forças russas no campo de batalha, algo que já se mostrou inviável. O exército russo, no âmbito da operação militar especial, não tem outra escolha a não ser a destruição dos tanques e de todo o equipamento fornecido pelo Ocidente a Kiev, de forma a fazer com que os americanos enfim mandem Zelensky à mesa de negociação.

Para além da Ucrânia, temos a questão do conflito em Gaza. Putin prometeu que a Rússia aumentará as entregas de equipamentos e de medicamentos para a região a pedido das autoridades locais, incluindo o governo de Israel. Acrescentou ainda a possibilidade de abrir um hospital russo para ajudar as vítimas civis, o que chegou a ser discutido com a liderança egípcia e israelense. Putin classificou como “catástrofe” as perdas humanas em função das operações de Israel em Gaza, que já vitimaram milhares de pessoas (em especial crianças e mulheres). Não sem razão, o líder russo apontou para o aumento do antissemitismo e da islamofobia ao redor do mundo, como resultado das tensões geradas pelos diversos episódios de destruição urbana e humanitária, que hoje podem ser acompanhadas praticamente em tempo real. Enquanto isso, vale lembrar que a Rússia, desde meados de outubro, propôs uma solução negociada entre Israel e o Hamas, recomendando a implementação de um cessar-fogo humanitário no Conselho de Segurança. Se as proposições da Rússia tivessem sido aceitas logo de começo pelas potências ocidentais, o que não acabou acontecendo, o derramamento de sangue em Gaza e o número de vítimas inocentes teria sido muito menor. 

Quanto à normalização das relações entre a Rússia e a Europa, Putin deixou bem claro que não foram os russos que se recusaram a cooperar, mas sim os próprios europeus, devido à sua submissão frente aos ditames do ‘grande irmão’ estadunidense. Já não é segredo que os países da Europa perderam grande parte de sua soberania desde a segunda metade do século XX por estarem debaixo do guarda-chuva de proteção americano, cuja principal expressão é justamente OTAN. Quase não há hoje na Europa, afirmou Putin, políticos pró-nacionais, que defendam os interesses de seu país, dada a situação de subserviência do continente europeu para com os Estados Unidos.

A Rússia, enquanto isso, continua disposta a construir relações mutuamente benéficas com o Ocidente, desde que sejam criadas condições adequadas para tal, o que não deve acontecer no âmbito da famigerada “ordem baseada em regras”, regras essas que mudam a depender da conveniência e do interesse dos países ocidentais. Essa não é uma ordem na qual a Rússia, a China e os BRICS pretender participar e isso deve ficar bem claro para todos.  Pelo contrário, uma ordem global mais justa passa pelo estabelecimento da multipolaridade nas relações internacionais, que é exatamente um dos objetivos da Rússia hoje. Por fim, Putin, como líder do país-chave por trás dessas mudanças, mostrou que seu país continua de pé tanto política como economicamente apesar das sanções ocidentais. Ao contrário do que se esperava no campo atlanticista, a Rússia terminou o ano de 2023 ainda mais forte.

Valdir da Silva Bezerra – Mestre em Relações Internacionais pela Universidade Estatal de São Petersburgo. Membro do Núcleo de Pesquisas em Relações Internacionais sobre Ásia da Universidade de São Paulo (NUPRI-GEASIA). Pesquisador do Grupo de Estudos Sobre os BRICS da Universidade de São Paulo (GEBRICS-USP). Colaborador do Grupo de Estudos sobre a Rússia (PRORUS) da Universidade Federal de Santa Catarina.

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