A sentença a la carte nas decisões do Supremo, por J. Carlos de Assis

Movimento Brasil Agora

A sentença a la carte nas decisões do Supremo

por J. Carlos de Assis

O Supremo Tribunal Federal acaba de inventar a sentença a la carte, ou sob medida. A lei que se aplica a Lula não é a mesma que se aplica a Moreira Franco. Os fatos fundamentais são os mesmos, ou seja, uma suposta tentativa de fugir da justiça de primeira instância e ganhar foro privilegiado como ministro de Estado, mas a decisão difere em razão da personalidade do paciente da ação. Os detalhes jurídicos são de menor importância. Para a opinião pública, estamos diante de um esbulho do sistema jurídico hipertrofiado.

O que impressiona em tudo isso é que a decisão relativa a Moreira Franco parece bem fundamentada. O chefe do Executivo tem todo o direito de nomear seus ministros independentemente de sua condição jurídica. É uma prerrogativa. A Justiça que se vire para transformar o acusado em réu, e réu em condenado. Um simples indiciado em processo criminal merece, em todos os sistemas civilizados, o benefício da presunção de inocência. O grande problema é: por que esse mesmo princípio não se aplicou a Lula?

É claro que, no caso do ex-Presidente, o Supremo cometeu um ingerência espúria em outro Poder da República. Pessoalmente, não acredito que a nomeação de Lula teria alterado muito o curso da história tendo em vista as forças formidáveis que se juntaram em favor do impeachment. Contudo, pelo menos em tese, poderia ter havido uma mudança de rumo. Nessa hipótese, uma decisão ilegal do Supremo favoreceu descaradamente o impeachment em favor de um partido, concorrendo para a instabilidade em que ainda nos encontramos.

O que fazer quando a Suprema Corte viola as bases constitucionais que deveria proteger? Se o derretimento de sua credibilidade se acrescenta ao derretimento inequívoco da credibilidade do Executivo, do Legislativo, do Ministério Público, estamos diante de uma situação que, nos livros textos, prenunciam uma revolução. É uma perspectiva terrível, pois nada seria pior para o Brasil do que uma nação fisicamente dividida, sem perspectiva de regeneração das instituições republicanas e totalmente afastada de um pacto nacional.

Anos atrás escrevi um livro, “O Atentado da Nova Era”, no qual considerava que na era nuclear a única estratégia possível para países nuclearizados era a busca da paz, tendo em vista os efeitos da dissuasão. E afirmava, no que diz respeito a conflitos internos em nações com elevado grau de industrialização, que neles havia uma espécie de segundo nível de dissuasão, tendo em vista os terríveis estragos domésticos que o armamento dito “convencional”, aplicado no conflito, poderia causar a pessoas e propriedades.

A despeito disso, quando nos confrontamos com a ruptura institucional de cima para baixo, muitos tem uma espécie de nostalgia revolucionária. Entretanto, temos que resistir a isso. A revolução líbia instigada pelos Estados Unidos (Hillary Clinton) mostrou que um país, mesmo armado de fora para dentro e sem uma estrutura industrial interna, pode ser totalmente destruído em situações revolucionárias. O mesmo aconteceria com o Egito, não fosse a reação dos militares; e o mesmo acontece com a Síria, a despeito da intervenção russa.

O Supremo atual é o escárnio, assim como o Executivo e o Legislativo. Nossa única salvação é a busca de legitimidade do poder civil que seja capaz de restaurar as instituições republicanas. Falo em eleição direta em 2018, mas falo também na possibilidade, ainda que remota, de uma eleição indireta antes disso, ancorada num processo que garanta a plena legitimidade do que vier a ser eleito para completar o mandato de Dilma mediante um grande pacto político. Não é nada fácil. Mas o pior seria uma intervenção militar ou uma guerra civil.

Redação

12 Comentários

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  1. “sentenças a la carte” como o

    “sentenças a la carte” como o autor descreveu são uma prova indiscutível de que o país aonde isso é praticado não possui justiça de verdade. Vocês brasileiros deveriam dissolver esse simulacro de tribunal que é o STF e todos os outros tribunais relacionados e recomeçar do zero sem representantes dos escravocratas e dos saudosos do tempo do império.

    1. Nosso amigo Somebody é da

      Nosso amigo Somebody é da terra do procura-se “Dead or Alive” – é isso mesmo: a primeira opção é trazer o defunto para a justiça; se o desgraçado não for morto, que remédio, traz vivo mesmo…

      Dissolver o STF e outros tribunais?

      Recomeçar do zero sem representantes dos escravocratas e saudosistas do império?!

      Com essas duas exceções, teríamos que trazer 11 Wasps para o nosso STF, ainda que haja controvérsias em relação às inclinações escravocratas…

      Ô amigo americano, talvez você seja um brazilianista de primeira, mas, a julgar pelos comentários que posta aqui no GGN, você não faz a menor idéia do que é o Brasil.

  2. A SETENÇA A LA CARTE NAS DECCISÕES DO SUPREMO

    Admirei seu artigo, J. Carlos de Assis. Tenho a plena convicção que você só não desejou explicitar as diferenças para ter maior liberdade de crítica pois sabemos que a questão passou mais pelo nome da pessoa a ser nomeada do que qualquer outra razão.

    Uma eleição indireta, em minha opiniõa,  não cabe neste País, com o congresso (em minúsculo mesmo) que temos pois seria a escolha de um elemento da mesma vertente dos golpistas, aliás, acredito que esse tenha sido o desejo inicial do gople gestasdo por americanos, que fizeram uma intervençao sem a necessidade de “revolução”,  de armas ou de qualquer outra hipótese que não a da mentira e a da desfaçatez.

    E para a população, não há outro caminho se não aquele de deixar de ser cordeitinho de presépio. Mesmo que seja através de uma revolução silenciosa e sem armas.

     

  3. A presunção da inocência foi
    A presunção da inocência foi tornada obsoleta ha algum tempo. É tratada como obstaculo ao exercicio da justica ou seja lá o que isso for.

  4. No tempo de D. João XVI, o

    No tempo de D. João XVI, o STF seria moderno. Hoje é apenas um restolho mofado e fedorento do ancien régime brésilien.

  5. Se com uma presidente eleita,

    Se com uma presidente eleita, fizeram o que fizeram, imaginem o que a plutocracia e a serpente global fariam em uma eleição indireta. Respeito a opinião do J. Carlos de Assis, ninguém com bom senso deseja um conflito sangrento. Entretanto, ao mergulhar fundo na realidade brasileira, encontramos um estado de guerra, tanto que as estatísticas indicam que ocorrem mais mortes por  assassinatos no Brasil do que em diversos conflitos armados pelo mundo.  Com essa política de terra-arrasada praticada pelos golpistas, a desigualdade social se elevará exponencialmente. Historicamente, os pactos são feitos sem a participação da população que paga a conta de tudo.  Acho que o caminho mais racional é a esquerda adotar uma estratégia de poder, mesmo que seja a nível municipal, com um programa revolucionário na educação. 

  6. Ora, pior exatamente porque?

    Ora, pior exatamente porque? não entendi…. eu acho somente que seria impossivel uma revolução aqui, haja vista que as pessoas estão mais preocupadas com o novo modelo de celular do que com que os caras lá de cima fizeram e fazem com o país… veja, nós estamos em  um país que está sendo literalmemte pilhado, sem um único poder que possa reequilibar e dar um basta ou refrear a sede das hienas – leia-se PMDB/PSDB e agregrados –  de sangue em dilapidar tudo e qualquer coisa que seja público ou nossa tênue tentativa de um Estado de Bem-Estar Social….

    Nós ainda não passamos da Idade Média aqui e se não tiver a nossa “queda da Bastilha” , não creio que haja realmente mudança de fato sem isso, e não conheço uma outra forma de fazê-la ruir senão com atos violentos… uma eleição resolveria o que exatamente?? muitos destes Congressistas irão conseguir a releição – eles tem acesso a financiamento de campanhas e não me parece que os eleitores em geral estão mais “cosncientes” do que antes…. fora ainda o risco de termos de aturar um Moro ou Bolsanaros feitos de encomenda pelos marketeiros e nossa grande mídia,..

  7. O stf sempre avalizou todas a

    O stf sempre avalizou todas a ditaduras possíveis e até tempos não remotos não punia nenhum político, só passou a faze-lo quando teve que se tornar um capitão-do-mato explícito e sair do confortável papel que fingiam desempenhar; é um tribunal atrasado, com vestes ridiculas, linguagem arcaica, caro e inútil para a população que lhes paga, deveriam demoli-lo de cima abaixo e reconstruir em bases modernas, inclusive, com mandato com prazo fixo, o ministro fica um periodo pré- determinado e depois vaza……

  8. tem uma lógica absurda aí

    Os contraPT tem plena convicção que a eleição e exercício de mandatos de se inimigo é indevida e qualquer impecilho a ela constitui benefício público.

    São absolutamente coerentes no uso das regras legais e das garantias constitucionais. Elas só são aplicáveis em relação a agentes em que reconhecem legitimidade.

    Este me parece ser seu maior e primário crime: discordam da decisão da maioria nas eleições por julgarem-na ignorante e se acham no direito de respeitá-la. Deveríamos ser muito mais duros e exigir leis mais fortes quanto a qualquer desafio aos princípios democráticos, mormente o que diz que o poder é do povo e deve ser exercido em seu nome. Qualquer dúvida em relação ao respeito a esta máxima deveria ser punida sem remorso.

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