As disputas jurídicas em questões federativas

Do Valor

Para Mendes, parlamentares legislam contra seus Estados

Por Ribamar Oliveira

Mais de 5 mil ações movidas por Estados contra outros Estados ou contra a União deram entrada no Supremo Tribunal Federal (STF). Esse grande número de processos que envolvem questões federativas, revelado ontem pelo ministro do STF Gilmar Mendes, em seminário realizado pela Secretaria de Assuntos Estratégico da Presidência da República (SAE), é um indicativo, para ele, da necessidade de se discutir seriamente o atual modelo federativo brasileiro.

“É uma espécie de guerra civil que está se travando em torno de questões federativas”, constatou Mendes. Muitas dessas ações, informou o ministro do STF, são sobre questões menores, como a inscrição de um Estado no Cadin (cadastro informativo dos créditos não quitados do setor público federal), que poderiam ser evitadas se houvesse um mínimo de espaço para a negociação entre os entes da federação. “É uma irracionalidade completa”, disse.

Mendes questionou se, em questões como essa, não se poderia, antes do ingresso de ação no Supremo, tentar uma negociação entre os procuradores estaduais e a Advocacia-Geral da União (AGU). O seminário realizado ontem pela SAE discutiu justamente a necessidade de criação de mecanismos que permitam a solução de conflitos entre os entes da federação.

O ministro do Supremo criticou também o que chamou de “quadro de esquizofrenia” atualmente existente, no qual deputados e senadores aprovam leis que criam graves problemas fiscais para os governadores de seus Estados que, então, ingressam no Supremo Tribunal com ações contra essas leis. Ele citou o caso da lei do piso nacional dos professores, que vários governadores alegam não ter condições de pagar. “Há algo de estranho na aprovação de uma lei com grande impacto fiscal e que o Congresso não tenha feito a conta”, disse.

Citando o levantamento feito pelo STF, o secretário-executivo da SAE, Roger Leal, disse que 40% das ações que envolvem questões federativas foram movidas por Estado contra leis do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) de outro Estado. Essas ações terminam não sendo apreciadas pelo Supremo, pois as leis questionadas são revogadas por outras, que reproduzem os mesmos conteúdos das anteriores.

Outros 10% das ações não foram aceitas pelo STF porque os dispositivos questionados são estabelecidos por meio de regulamentos, que não são passíveis de ação direta de inconstitucionalidade. Outros 25% das ações aguardam julgamento. As estatísticas mostram, lembrou Leal, que o STF não consegue julgar a maioria dos casos que são levados a ele. Para o secretário-executivo da SAE, o Supremo tem dificuldades de fazer uma composição entre os vários litígios dos entes da federação.

Na análise de Leal, o Legislativo também tem dificuldade de compor, pois suas deliberações, tomadas por maioria, costumam ter Estados vencedores e perdedores. O secretário-executivo sugeriu uma terceira via, com o estabelecimento de um campo de composição dos interesses estaduais, o que seria feito por um organismo semelhante ao Confaz.

O economista Fernando Rezende, da Fundação Getúlio Vargas (FGV), também defendeu a criação de outro mecanismo institucional para discutir os interesses dos Estados que, na sua avaliação, estão em processo de fragilização. Para ele, a questão federativa entrou, pela primeira vez, na pauta de discussão antes da reforma tributária.

Luis Nassif

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