Especialistas debatem a regulação das redes sociais no TVGGN Justiça

Novo projeto deve garantir maior transparência sobre o uso de dados pelas plataformas e a circulação dos conteúdos publicados. 

Crédito: Freepik

Depois de uma série de ataques do bilionário sul-africano Elon Musk ao ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal, a regulação das redes sociais no país voltou a ser debatida no Judiciário e no Legislativo Federal. Esta semana, o presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira (PP-AL) anunciou a criação de um grupo de trabalho para elaborar novas propostas, uma vez que a PL das Fake News, do deputado Orlando Silva (PCdoB-SP) não seria aprovada pela Casa por ser ‘polêmica’.

Para discutir as propostas de regulação das redes, o programa TVGGN Justiça desta sexta-feira (12) recebeu o cientista social, mestre e doutor em Comunicação pela UFRJ Afonso de Albuquerque; Roseli Aparecida Figaro Paulino, professora titular da USP, bolsista Produtividade em Pesquisa do CNPq; e Reynaldo José Aragon Gonçalves, jornalista e diretor executivo da Rede Conecta de Inteligência Artificial e Educação Científica e Midiática (UFF/CNPq). 

Ao acusar Alexandre de Moraes de promover a censura no país, Musk não surpreendeu Roseli Paulino. A docente aponta que a atitude do bilionário nada mais é que uma campanha midiática e de opinião adotada há tempos que “diz respeito ao poder dessas empresas nos Estados nacionais”. 

“Mais que fazer marketing política internacional, inclusive, ele está mostrando objetivamente que esses conglomerados que monopolizam o setor de produção de conteúdo estão intimamente vinculados a todo esse movimento de desinformação, porque isso rende dinheiro, isso dá lucro. O monopólio de poder econômico vai se mostrando um monopólio de poder político que contesta os Estados nacionais. É muito sério isso”, opina Paulino.

Lado bom

Para Afonso de Albuquerque, o conflito público entre Musk e Moraes teve um lado positivo por romper, de vez, com a ideia de que as plataformas digitais seriam uma tecnologia da liberdade, espaços em que pessoas simplesmente colocam suas opiniões. 

Nada despretensiosos, os donos de plataformas demonstram que têm poder de intervir em assuntos nacionais, como já aconteceu antes, a exemplo da série O Mecanismo, lançada pela plataforma de streaming Netflix, que interferiu na política brasileira ao criar uma narrativa falsa e conspiratória.

“Há uma série de evidências de que as plataformas intervêm na dinâmica política brasileira, mas o Musk explicita isso de uma maneira maior do que as outras porque não é apenas a plataforma que atua de determinada maneira, através dos seus algoritmos, mas o dono da plataforma se vale do seu poder global para tentar intervir em assuntos internos do Brasil”, continua o cientista social. 

Teste 

Diante da tendência global de regulação das redes sociais, os donos das plataformas digitais estão preocupados com a possibilidade de perder o poder que conquistaram nas últimas décadas, segundo a análise do jornalista Reynaldo Gonçalves. 

“A ação do Musk, ao meu ver, foi testar um pouco a que ponto as instituições nacionais estão sólidas o suficiente, que na visão dessa elite é um país periférico”, opina. 

O Brasil serve de laboratório global, não só sobre a reação dos poderes, mas também em relação aos avanços na Legislação e exemplo de política pública. “O que acho muito sintomático é que no dia seguinte à declaração do Musk, o [ministro Luís Roberto, presidente do STF] Barroso botou em pauta novamente a votação da regulação das redes sociais. Na parte da tarde, o Lira simplesmente rasgou o que já vinha sido discutido desde 2020. Isso abre um precedente”, continua Gonçalves.

Responsabilidade compartilhada

Um dos aspectos que devem ser contemplados na nova proposta de regulação das redes sociais, segundo Roseli Paulino, é a responsabilidade compartilhada da plataforma em relação ao conteúdo publicado nas redes sociais. “Quer dizer que mesmo eu pagando para impulsionar o conteúdo, mas a plataforma se não retirar a tempo como a justiça mandou, também será culpabilizada.”

O novo projeto deve garantir ainda maior transparência sobre o uso de dados pelas plataformas e a circulação dos conteúdos publicados. 

“Também ficou no PL a questão dos dados. Onde ficam esses dados? Vão ficar no Brasil, como manda a lei de direito de propriedade? Fica nada. Então, é preciso regular isso também. O medo deles é colocar regras no negócio que não tem nenhuma regra”, emenda. 

Determinar o órgão regulador e informações do negócio como as receitas da plataforma e as regras de trabalho também devem fazer parte das discussões do grupo de trabalho, para Paulino, a fim de resolver um problema econômico (o excesso de demissões promovidos pelas big techs) e um problema político.

Assista ao debate na íntegra:

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Camila Bezerra

Jornalista

1 Comentário

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  1. No Código Civil, a propriedade tem muito mais valor jurídico do que a posse. A mera detenção da coisa em nome de terceiro origina menos direitos do que a posse dela.
    A Lei garante aos usuários de internet a propriedade dos dados que eles produzem. Mas esse direito não produz qualquer efeito econômico, pois só quem tem a posse dos dados e o direito de propriedade sobre algorítmos (Big Techs e plataformas de internet) podem utilizá-los para obter lucro.
    No mundo virtual, portanto, a posse ou detenção dos dados tem muito mais valor jurídico do que a propriedade. Essa inversão paradoxal dos conceitos jurídicos, que coexiste com a versão prescrita no Código Civil, foi inventada para beneficiar os barões dos dados. Se ela as Big Techs teram que implorar para usar nossos dados ou pagar para fazer isso. Elas obviamente não concentrariam poder e riqueza se não pudessem desfrutar o privilégio legal que desfrutam.
    Esse é um tema importante que geralmente não é levado em consideração. Os usuários de internet são iludidos com serviços supostamente gratuítos, mas na verdade o que eles fazem é produzir gratuitamente dados que concentram mais e mais riqueza econômica e poder político nas mãos dos barões dos dados.

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