Uma maioria sob medida

Por Fábio de Oliveira Ribeiro

Ontem ao proferir seu voto vencido Joaquim Barbosa confirmou não ter qualquer vocação para ocupar um cargo na cúpula do Judiciário.  Além de depreciar de maneira cruel os votos de seus colegas de STF, qualificando de pífios argumentos que foram solidamente apoiados na doutrina e na jurisprudencia oriunda da própria Corte que Preside, JB disse que o novo resultado do julgamento ocorreu porque “foi formada aqui uma maioria sob medida”.

O STF é um Tribunal colegiado e seus Ministros são investidos na forma da Constituição Federal.  Ao dizer que novo resultado do julgamento ocorreu por causa de uma maioria sob medida” o Presidente do STF questionou a composição do Tribunal, lançando dúvidas sobre a forma como outros Ministros foram investidos nos seus cargos. Curiosamente, o Presidente do STF não apontou como lhe competia quais Ministros foram investidos de maneira irregular e os respectivos vícios constitucionais de suas nomeações.

JB levantou uma questão grave e relevante que acarretaria a nulidade do julgamento proferido ontem. Portanto, ele deveria ir às últimas consequencias quer porque Preside o Tribunal, quer porque ele também é um guardião da Constituição Federal que teria sido violada ao se permitir que Ministros do STF irregularmente empossados proferissem votos durante o julgamento.

O plenário do STF não é um palanque político. As acusações que ali se fazem não podem ser apenas retóricas. Não só isto. Aquele que levianamente questionar a validade da investidura de Ministros do STF durante um julgamento deve responder pelo abuso. In casu o ofensor teria cometido não só um atentado contra a dignidade dos seus colegas de toga, mas conspurcado temerariamente a imagem pública da própria instituição que integra. Os cidadãos jurisdicionados não dão e nunca darão crédito ou importância a um Tribunal colegiado cujas decisões são proferidas por “uma maioria sob medida”.

Desde tempos imemoriais os estudiosos do discurso consideram que existem basicamente duas modalidades discursivas: a apologia e o elogio. A apologia é o discurso de convencimento, aquele cujo conteúdo é definido menos pelas crenças profundas e pessoais de seu autor e mais por necessidades lhe impostas pela platéia a qual se destina a mensagem. O elogio, ao contrário, tem seu conteúdo definido pelo próprio autor e seu uso ocorre quando ele pretende comunicar o que considera bom, belo e justo. Os advogados e políticos usam a primeira modalidade do discurso. Os filósofos e os magistrados podem e devem utilizar a segunda modalidade discursiva, pois deles se espera que comuniquem o que intimamente julgam ser verdadeiro ou o que consideram justo.

Ao dizer que “foi formada aqui uma maioria sob medida” Joaquim Barbosa colocou em dúvida a validade ou justiça da decisão proferida pela maioria STF. No fundo, ele tentou convencer a platéia que a sua decisão era mais justa e, portanto, deveria prevalecer à decisão dos seus pares. Ocorre, porém, que em se tratando de um Tribunal colegiado a decisão mais justa é sempre aquela proferida pela maioria, nunca por um ou mais votos vencidos. Não há e não deve haver qualquer distinção qualitativa entre os Ministros do STF. Isto, porém, parece incomodar JB, que fez a apologia da própria posição como se ela tivesse mais valor e dignidade do que as dos demais Ministros da Corte.

O inadequado caráter apologético do voto de JB fica ainda mais claro nesta frase proferida por ele em plenário “Esta é uma tarde triste para este pleno do STF, porque com argumentos pífios foi reformada, foi, como eu disse, jogada por terra, extirpada do mundo jurídico uma decisão plenária sólida, bem fundamentada…” . Ao contrário do que disse o presidente do STF, a melhor justiça é aquela que a maioria do Tribunal fez ao julgar os recursos dos réus. É para isto que os recursos existem, justamente para devolver ao Tribunal o conhecimento das matérias impugnadas permitindo, assim, que as mesmas sejam novamente julgadas. Válida, eficaz e justa é a nova decisão e não aquela que havia sido anteriormente proferida. Além disto, ao contrário do que a frase de JB sugere, não existe decisão imutável antes de seu trânsito em julgado. Pífio, portanto, foi o argumento apologético usado pelo presidente do STF para tentar transformar em imutável uma decisão que ele mesmo deveria saber que estava sujeita a modificação em plenário naquela oportunidade.

É preocupante a maneira como JB se dirigiu aos seus pares, desqualificando suas investiduras ou mandatos. Mais preocupante ainda é a sua incapacidade de se resignar diante de um fato corriqueiro: a possibilidade de derrota durante votação num Tribunal colegiado. JB parece acreditar que suas razões são melhores, mais dignas, mais justas e mais válidas do que as dos seus pares. Sua crença esbarra, todavia, nos limites da Constituição Federal que ele é obrigado a cumprir e fazer cumprir.

Escrevo com pesar estas palavras duras contra JB. Estive entre aqueles que o defendeu quando ele foi cruelmente ofendido por Gilmar Mendes no plenário do STF. Nos últimos dois dias, entretanto, notei que, após ser empossado na presidência da Corte, JB passou a reproduzir os mesmos vícios que seu antigo adversário. O cargo, ao que parece, inflamou seu ego produzindo aquela cegueira temerária de que falam alguns mitos antigos. Mas isto é assunto para uma outra e longa discussão.

Fábio de Oliveira Ribeiro

24 Comentários

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  1. O que dizer?

    O Sr. Joaquim Barobsa é um desorientado.

    Se não for, então a questão é grave: é um pretenso ditador, que deseja governar sozinho no STF, sem respeitar os outros Ministros, seus iguais.

    Enfim, seria um golpista, sem mais nem menos.

     

  2. Que falta faz um Senado brioso!

    Pois é, se parte do Senado não tivesse o rabo preso no STF e a outra parte não fosse tão acovardada, os briosos senadores já teriam arrastado o Joaquim pela orelha e de quebra levariam o Gilmar também, para que esses dois despirocados prestassem conta àquela Casa sobre as sandices que os dois têm falado. Se…

  3. Desqualificou o STF

    Ele desqualificou o STF e todos os ministros abaixaram a cabeça e foram embora.

    Também que ministro está no STF em situação de servir com honra ao povo brasileiro?

    Ou então ficou provado que brasileiro é frouxo mesmo.

    1. “Ele desqualificou o STF e

      “Ele desqualificou o STF e todos os ministros abaixaram a cabeça e foram embora”:

      So prova que o todo eh desqualificado, de fato.

  4. Noblat reproduziu um texto do

    Noblat reproduziu um texto do Merdal insinuando que desde o início os advogados manobraram para dar tempo de Ayres Brito e Peluzzo serem substituídos por outros, que mudariam os resultados, e transformariam o STF em um tribunal bolivariano como disse GM, o que poderia levar à revisão criminal.

     

    Estão desesperados.

  5. Formação de quadrilha
    “foi formada aqui uma maioria sob medida”. Se Joaquim Barbosa realmente acredita nisso, então ele acredita que que a presidente e os novos ministros juntaram-se para formar uma quadrilha e dela tirar proveito.

  6. A preocupação e o desalento

    A preocupação e o desalento  do  juiz mensaleiro,JB, é procedente. Está aberta a possibilidade  de revisão processual.

    O Globo  , de hoje,  deve ser  folheado somente após aplicação de  vacina anti-rábica.Portanto, calculem,  com a inevitável revisão que os  advogados, desde agora , se empenham  em  organizar, as reações hidrófobas  da mídia

    e sua claque.

  7. “extirpada do mundo jurídico

    “extirpada do mundo jurídico uma decisão plenária sólida”

    Bom, a decisão aludida foi tomada por 5×4. Sólida, portanto???

  8. Desligando a TV

    Chegou a hora de se repensar essa história de transformar plenário do STF, em picadeiro de circo.

    Não se deve transmitir as sessôes do STF ao vivo pela TV, como aliás ocorre na maior parte dos países civilizados do planeta.

    Taí o resultado dessa afronta ao bom senso. Um julgamento midiático, onde a imprensa elegeu os mocinhos e condenou os vilões. Tínhamos torcida organizada e analistas de tribunal fazendo a festa nas emissoras de tv.

    Virou uma bizarra partida de futebol onde a galera torcia para o juíz e os bandeirinhas.

    Como cereja do bolo, no final, um ministro desequilibrado e doente afrontou os colegas por ter sido derrotado em sua “tese de excessão”.

    Não fosse a transmissão de TV esse julgamento já teria terminado (ou nem começado)  e muito provavelmente já esquecido, uma vez que o promotor sequer conseguiu reunir provas de algo mais do que uma tradicionalíssima caixa 2 de partido político.

     

     

     

    1. Não existe garantia de que o resultado seria outro se o julgamento não fosse transmitido. Por outro lado nem todo mundo é burro e manipulável pela mídia.

      Isto é, se por um lado a transmissão prejudicou os réus da AP470, o que tenho minhas dúvidas, por outro lado ela mostrou pra sociedade que pensa como o nosso judiciário é falho e está à mercê das incompetências e idiossincrasias de indivíduos despreparados para a função.

      O JB pode não ser uma regra, mas com certeza ele não é uma exceção… E quanto mais visíveis ficarem, melhor.

      https://secure.avaaz.org/po/petition/Senado_Federal_Impeachment_de_Joaquim_Barbosa

       

  9. E qual o motivo para preocupação?

    O estilo de atuação de JB o confere ainda menos a capacidade de viver na vida legislativa, quiçá a executiva? Seus nervos iriam destruir a si próprio, nos primeiros meses ainda. Ficará protegido na poltrona de sua aposentadoria.

  10. O que preocupa não são as

    O que preocupa não são as atitudes de um, mas sim a falta de atitudes de todos os outros.

    Ora, um louco sempre vai existir e pode acontecer de ocupar cargos chave.

    Parafraseando Warren Buffett, que dizia para os investidores comprarem ações só de empresas que até um idiota pudesse comandar, porque um dia isso vai acontecer. O País tem que ter mecanismos de neutralizar esse tipo de gente bizarra que aparece vez ou outra.

    Na verdade mecanismos existem. O que está faltando são pessoas com coragem de enfrentar esse problema.

    Os pares estão quietos. O parlamento quieto. O governo quieto. A presidente e o ex, quietinhos. Foi a atitude que escolheram ter, mas, depois, se algo de mais grave vier a ocorrer, terá sido pela leniencia de todos.

    Um covarde sempre se retrai quando é confrontado a altura. Mas se não for, ele pode ir seguindo adiante, ir esticando a corda para ver até onde pode ir. É o que está acontecendo.

    Como é uma pessoa pequena em si mesmo, provavelmente não vai fazer grande coisa. Mas mesmo assim ainda pode causar grandes danos ao País. Pode criar muitos problemas ao Governo e ao País como um todo, atrapalhando muita gente.

  11. Muito bom

    As palavras de Barbosa sobre a decisão que o STF tomou nos Embargos Infringentes não colocou em dúvida os critérios de escolha que estão legalmente previstos nas normas legais.

    Barbosa questiona e desqualifica o Poder Executivo e o Legislativo demonstrado a sua falta de respeito ao Estado Republicano e à democracia.

    Por fim, e igualmente grave, as suas palavras desqualificaram o próprio poder judiciário através do seu órgão máximo o STF.

    Barbosa não sabe que a decisão de um colegiado representa a decisão do próprio órgão, em outras palavras, de todos os membros que o compõe

  12. O Barbosa deveria seguir o

    O Barbosa deveria seguir o exemplo do seu colega Marcorélio, o qual tem praticamente todos os seus votos vencids e continua alegre e matreiro, feliz da vida.

  13. Acovardamento

    Triste saber que o silêncio impera após este comportamento irresponsável do JB.

    O acovardamento de todos, alguns por culpa no cartório, outros por populismo, outros por medo mesmo é lamentável.

    Algo deve ser feito para que não se repitam cenas como as que vimos.

  14. A canalhice no STF presidido
    A canalhice no STF presidido por JB não tem fim. Hoje o website do Tribunal publicou na íntegra um dos votos vencidos na AP 470 com a evidente intenção de municiar os jornalistas e telejornalistas que estão questionando a justiça e correção da decisão que beneficiou os réus do Mensalão. O voto vencedor, porém, somente será publicado daqui a alguns dias.  É evidente que a assessoria de imprensa do STF está ajudando a criar um clima de ódio contra a maioria do Tribunal, fornecendo elementos que reforcem não a decisão válida proferida e sim os votos que foram vencidos (e que certamente agradaram os veículos de comunicação que ontem deram mais enfase ao derrotado voto de JB do que ao corretíssimos votos do Ministro Barroso e daqueles que o acompanharam). Se o que ocorreu hoje foi feito por ordem de JB ele deveria ser IMPEDIDO de ficar no cargo, pois ninguém tem o direito de esculhambar uma decisão válida proferida pelo STF, nem mesmo seu presidente.   http://www.stf.jus.br/arquivo/cms/noticiaNoticiaStf/anexo/AP_470EI__Voto.pdf

  15. Pois é…eu tb o defendi das

    Pois é…eu tb o defendi das garras do opressor GM…..mas como  já escrevia Victor Hugo…no oprimido de ontem,  está o opressor do amanhã!!  E, vamos combinar…que opressor….o cara saiu melhor que encomenda. Acabou com a justiça, com o stf, com seus pares……caraco..o cara é um rolo com “o”pressor sem controle nenhum.  O Leviatã está completamente solto e sem rédeas.  Mas deu atestado…..ao deixar subentendido que Dilma, do PT, aparelhou o STF…se esqueceu que foi Lula, do PT, quem o nomeou.  Aí, das duas uma….ou ele se beneficiou e depois cuspiu no prato que comeu…ou ele é o próprio aparelho.  Pois é malandro……todo reinado termina um dia……

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