A perda de fôlego da Inbev, comentário de Boeotorum Brasiliensis

A Ambev InBev vêm perdendo impulso. Parte deve-se ao excesso de volúpia pelo gigantismo e de ambição por market share e, em boa parte, deve-se à mentalidade egocêntrica, insensível e predatória dos seus principais acionistas, com Lemann à frente.

Por Boeotorum Brasiliensis
comentário no post Ações da AB Inbev caem mais de 50% e colocam em xeque estilo Lehmann de gestão, por Luis Nassif

Fiquei curioso e fui olhar os balance sheet 2019 da AB-InBev (ambev consolidado). Não olhei com detalhes, por falta de tempo, mas alguns fatos despertam atenção ao primeiro olhar.

A atividade é lucrativa, menos que em 2018, mas lucrativa em níveis considerados satisfatórios. Logo, o problema não é de modelo de gestão, mas de estratégia de crescimento, provavelmente, vindo das levaraged buyouts (LBO’s) realizadas nos últimos anos (Budweiser, Miller, e outras).

LBO é a aquisição de outra empresa usando financiamentos para cobrir o custo de aquisição usando os ativos da empresa que está sendo adquirida como garantia para os empréstimos e o seu cash flow para amortizar a dívida. Esse tipo de aquisição é estratégia comum aos hedge funds e bancos de investimento. A aquisição da Nabisco pela JR Reynolds e sua posterior aquisição por especuladores de Wall Street ficou notória e foi objeto do livro e filme, Barbarians at gate. Ambos, são recomendáveis como entretenimento e para se ter uma ideia de como os tubarões nadam e se alimentam no mercado de M&A, sendo o livro, como de hábito, muito melhor que o filme.

Quanto a IN Ambev o que se vê é que está, como acontece com esse tipo de estrutura de aquisição, se equilibrando sobre um castelo de cartas. Tem ativos de USD 236MM, dos quais 128 são registrados como goodwil (valor da marca) e 42 como intangíveis. Os passivos de financiamento oneroso (empréstimos, financiamentos e derivativos) representam cerca de USD 107MM, a maior parte no longo prazo. O patrimônio liquido soma USD 85MM.

Uma conclusão simples : há um enorme risco envolvido nessa estrutura resultante de um endividamento elevado. Isso deixa implícita a necessidade de captação de recursos para rolagem dessa dívida ao passo em que futuros resultados positivos irão absorver esse desequilíbrio. O risco se consolida no aspecto em que isso poderá não ser possível, seja por conta de comportamento de mercado, seja por impossibilidade de geração de recursos suficiente para fazer frente a possíveis cenários desfavoráveis, dado o efeito de variáveis que venha a afetar a performance do negócio. Este é um ponto vital, trata-se do nível de dependência criado com fatores pouco ou nada controláveis e a fragilidade inerente que se criou. Em suma, se algo der errado dará tudo errado.

O goodwill e os ativos intangíveis têm valor na medida da sua capacidade em alavancar positivamente a operação, mas essa capacidade é tão presente quanto é presente a imagem de solidez da operação, dos seus negócios e da própria companhia. Tal capacidade e em consequência, o seu valor, diminui e até, in extremis, pode desaparecer na medida em que a percepção de solidez e a confiança desvanecem. Isso, em termos contábeis, implica em que diminuindo o valor do goodwil e dos ativos intangíveis se diminui, no mesmo montante, o patrimônio líquido. Face seu valor equiparar-se ao dos ativos tangíveis e superar em muito o valor do PL, uma eventual perda de confiança abalará a estrutura de capitais da companhia e poderá chagar ao ponte ameaçar sua existência. Ao menos, ameaçar a posição dos atuais acionistas controladores o que, no caso, seria o mais provável de ocorrer.

A Ambev InBev vêm perdendo impulso. Parte deve-se ao excesso de volúpia pelo gigantismo e de ambição por market share, parte deve-se a uma prática de takeover agressiva, parte vem da desaceleração do consumo em regiões como a América Latina e, em boa parte, deve-se à mentalidade egocêntrica, insensível e predatória dos seus principais acionistas, com Lemann à frente.

Acredito que, admirados e bajulados por uns, são odiados por muita gente. Alguns, por inveja, outros por terem sofrido em suas mãos e outros, como eu, por não aceitarem por princípio a imoralidade presente em tamanha concentração de riqueza e pela consciência que isso traz mais mal do que bem.
Não importa a razão, nem quem os odeia. O que importa é que, tubarões nadando em meio de tubarões, se feridos serão devorados.

E, no caso AB-ImBev a mensagem foi dada, há sangue na água!

Luis Nassif

11 Comentários

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  1. O cabeção híbrido, humanóide viu por bem embebedar com alegria a nossa população alegre fazendo-a consumir descontroladamente o seu produto. Implantou o vício.
    Mais que isso, quis devorar a concorrência. Tanto estendeu os seus tentáculos que pode te-los cortado nos cacos de vidro das garrafas quebradas de seus concorrentes que, se não quebraram, estão em vias de quebrar.
    Curioso é como fortunas de bilionários brasileiros vão de quase mais rico do mundo para o presidiário careca da semana ou o arruinado do mês.

    1. e é tão vagabundo que para embebedar-se com o produto deles é preciso consumir mais unidades, tendo em vista que transformou todas as suas cervejas em agua.

      1. Caro jossimar.
        Água não, milho fermentado. Conseguiu estragar todas as nossas antigas cervejas (até a nossa primeira Premium, Antarctica Original Faixa Azul) e detonou as americanas (Budweiser e Miller) e Belgas (Stella Artois) também

  2. Muito boa análise, valeu mesmo. Pergunta de leigo: Algum tempo atrás li que a estrátegia de Lehmann et caterva era comprar marcas consagradas nos setores de A&B dos EUA/Europa e alavancar essas com as vendas nos mercados latino-americanos. Confere? Se sim, alguma relação dessa queda com a retração desses mercados? Thanks, man.

    1. Não tenho maiores informações sobre isso, mas, se olharmos as prateleiras por aqui veremos Buds e Coronas ao lado de Stellas Artoir, Leffes e Hoegaardens disputando espaço com as marcas nacionais, próprias e dos concorrentes. Nos supermercados da China é a mesma coisa. Então, você deve estar certo em sua suposição.

  3. Eu até consideraria que a concentração de riqueza é culpa principalmente do capitalismo, que não só não coíbe como incentiva essa excrescência. E consegue vicejar até em países não capitalistas. Porém, informações veiculadas na imprensa, inclusive aqui no GGN, mostram que a pessoa referida como representante da Inbev tem uma agressividade ímpar na acumulação de riqueza, com métodos de aquisição de empresas que não resistem a uma investigação séria. Não tenho inveja alguma desse senhor, não sofri em suas mãos e não o odeio. O que creio que ele mereceria era ter uma grande parte de sua fortuna revertida para o bem da sociedade, legalmente. Só que é mais fácil ele entrar no céu do que isso acontecer.

  4. Prezados Camaradas

    Estamos sempre aprendendo. Pelo que entendi do texto:

    1 – O véio da AmBev e seus comparsas (todos execráveis) usaram o próprio dinheiro das empresas e sua projeção de lucros para financiar sua aquisição? Impressionante, parece um golpe 171 culto e sofisticado; mas um golpe

    2 – Maior parte do valor da empresa é um troço chamado “goodwill” (boa vontade?) e ativos intangíveis. Quer dizer, só fumaça?

    Fico pensando que este modelo pode ser ampliado para as outras empresas. Por isso que a bolsa murcha, estava cheia de vento.

    Vejam, camaradas: sou leigo, faço estas comparações nesta condição. Como engenheiro, acho difícil pôr preço em coisas intangíveis como vontade, market share e outros quesitos. Mas admira ver como a financeirização da economia parece ter desmontado o contato com o mundo real

    1. Você não está, na essência, errado nas suas afirmações. Quanto ao valor da marca, para exemplificar, no final dos anos 90, 1997 se não me engano, a marca Bamerindus, uma das marcas com maior recall em meio ao público à época, tida com uma das mais valiosas marcas nacionais, foi repassada ao HCBC, junto com o fundo de comércio e outros intangíveis do banco, por algo como R$ 380 milhões. Em contrapartida o HSBC recebeu da viúva, através do BC/Proer um emprestimo de valor semelhante. Michael Geoghegan, presidente do HSBC, afirmou, em CPI aberta mais tarde no Senado, que a marca não valia nada e somente aceitou pagar por pressão do Banco Central que, como é sabido, retribuiu de forma equivalente. Em suma, esses valores atribuídos a marcas são relativos, valem enquanto que as ostenta tem vitalidade e usa a força da marca para manter ou ganhar mercado. Caso contrário, nas mãos de quem não tem vigor e força comercial vale zero e zero é que o recebe por ela.

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