Deputadas tentam impedir que aborto previsto em lei seja proibido no Brasil

Cintia Alves
Cintia Alves é graduada em jornalismo (2012) e pós-graduada em Gestão de Mídias Digitais (2018). Certificada em treinamento executivo para jornalistas (2023) pela Craig Newmark Graduate School of Journalism, da CUNY (The City University of New York). É editora e atua no Jornal GGN desde 2014.
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Jornal GGN – Um grupo de deputadas integrado por Luiza Erundina (PSOL) e Erika Kokay (PT) conseguiram impedir, nesta quarta (8), que parlamentares da bancada evangélica usem uma proposta que amplia a licença-maternidade para proibir, por tabela, todas as formas de aborto já previstas em lei, no Brasil.

 A manobra dos deputados gira em torno de uma PEC (Proposta de Emenda à Constituição) que já conseguiu votos suficientes para ser aprovada, pois tinha um objetivo aparentemente nobre: ampliar de 120 para 240 dias o tempo de licença-maternidade quando o bebê nasce prematuro. Dados da comissão especial indicam que 12% dos nascimentos registrados hoje são prematuros e demandam tempo de interção similar ao que é proposto.

Porém, quase na reta final da aprovação da matéria, o relator Jorge Tadeu Mudalen, deputado do DEM de São Paulo, decidiu inserir um jabuti (jargão usado em alusão a emendas que não têm conexão com o texto original) de última hora, versando sobre o direito à vida desde a concepção.

Nas palavras da própria assessoria da Câmara, se a PEC for aprovada com esta nova redação, na prática, as mulheres perderão o direito ao aborto segundo as 3 formas que já possuem jurisprudência: em casos de estupro, anencefalia ou risco de morte. 

As intenções da bancada evangélica ficam claras também no trecho da reportagem da Agência Câmara que informa que essa PEC começou a tramitar imediatamente após o Supremo Tribunal Federal autorizar um aborto no primeiro trimestre da gestação. 

“Se as mulheres tivessem representação maior na Casa, o resultado dessa discussão seria outro. Não legislem por nós”, disse a deputada Luiza Erundina (PSB-SP).

A deputada Erika Kokay denunciou a comissão por fraude, já que a bancada evangélica decidiu “desrespeitar os 171 deputados que assinaram a proposta original que apenas amplia a licença maternidade para mães de bebês prematuros.”
 
A resposta do deputado Givaldo Carimbão (PHS-AL) foi que a acusação de “fraude” é improcedente e que “a posição dos deputados religiosos têm que ser respeitada”. O deputado João Campos (PRB-GO) acrescentou que ser contra a PEC é sofrer de “intolerância religiosa”.
 
Leia a reportagem completa da Agência Câmara.
 
Comissão suspende reunião que discutia proibição de todas as formas de aborto
 
A comissão especial da Câmara que analisa a ampliação da licença maternidade em caso de bebê prematuro suspendeu nesta tarde a reunião que votaria a proposta que, além de aumentar o período de afastamento da mãe de 120 dias para até 240 dias, insere na Constituição a proibição de todas as formas de aborto no País. A suspensão se deu pelo início da Ordem do Dia do Plenário.
 
Ao analisar duas propostas de emenda à Constituição que tratam da licença maternidade – PEC 181/15, do senador Aécio Neves (PSDB-MG), e PEC 58/11, do deputado Dr. Jorge Silva (PHS-ES) –, o relator do colegiado, deputado Jorge Tadeu Mudalen (DEM-SP), optou por um novo texto.
 
Nele, Mudalen estabelece que o princípio da dignidade da pessoa humana e a garantia de inviolabilidade do direito à vida, ambos já previstos na Constituição, deverão ser respeitados desde a concepção – ou seja, do momento em que o óvulo é fecundado pelo espermatozoide –, e não apenas após o nascimento. “Isso significa que nós somos favoráveis à vida”, disse. Segundo ele, o Código Penal não é alterado pela proposta.
 
A medida poderá inviabilizar o aborto nos casos permitidos pelo ordenamento jurídico brasileiro. Atualmente, o Código Penal (Decreto-Lei 2.848/40) não considera crime o aborto praticado nos casos em que a gestação decorre de estupro ou põe em risco a vida da mulher. Em abril de 2012, o Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu que não é crime a interrupção da gravidez quando o feto apresentar má formação do cérebro (anencefalia).
 
Criada em 30 de novembro do ano passado, a comissão especial da Câmara surgiu como resposta a uma decisão da Primeira Turma do STF que, um dia antes, havia decidido não considerar crime a prática do aborto durante o primeiro trimestre de gestação.
 
Tentativas de adiamento
Durante as quase quatro horas de discussão nesta quarta-feira, deputados da oposição tentaram adiar a votação da proposta. A deputada Erika Kokay (PT-DF) apresentou questão de ordem argumentando que o parecer de Mudalen trata de tema estranho à proposta original.
 
O presidente da comissão especial, Evandro Gussi (PV-SP), decidiu que o relator pode incluir ponto que não estava na PEC original desde que guarde relação com o tema. Segundo ele, se o plenário da comissão entendesse que o parecer extrapola o tema, deveria se manifestar contrariamente por meio do voto.
 
Para Kokay, a decisão configura “fraude”, ao desrespeitar os 171 deputados que assinaram a proposta original que apenas amplia a licença maternidade para mães de bebês prematuros. O deputado Givaldo Carimbão (PHS-AL) rejeitou a acusação de “fraude” e disse que a posição dos deputados religiosos têm que ser respeitada. O deputado João Campos (PRB-GO) acusou de “intolerância religiosa” aqueles que são contrários ao parecer de Mudalen.
 
O deputado Glauber Braga (Psol-RJ), por sua vez, questionou a legalidade do funcionamento da comissão, mesmo sem a deliberação, pelo presidente da Câmara, de requerimento de Gussi para prorrogar o prazo dos trabalhos. “Se uma mulher que sofreu um estupro coletivo e realizou interrupção da gravidez, vocês acham que ela deve ser presa?”, questionou. Em resposta, o deputado Sostenes Cavalcante (DEM-RJ) afirmou ser “a favor da vida” e contra “a morte dos indefesos”.
 
Para Diego Garcia (PHS-PR), o relatório contempla grande parte da sociedade brasileira, “contrária ao aborto”, inclusive as mulheres. “Se as mulheres tivessem representação maior na Casa, o resultado dessa discussão seria outro. Não legislem por nós”, contra-argumentou Luiza Erundina (PSB-SP).
 
Análise da constitucionalidade 
 
Já a deputada Pollyana Gama (PPS-SP) defendeu que a Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania (CCJ) da Câmara se manifeste também sobre o parecer de Mudalen. A CCJ, que tem como atribuição examinar preliminarmente a constitucionalidade das PECs, aprovou a admissibilidade apenas da versão original apresentada pelo deputado Dr. Jorge Silva.
 
Durante o debate, Dr. Jorge Silva destacou que 12% dos nascimentos hoje são de crianças prematuras e que muitas ficam internadas por mais de 240 dias. Atualmente, o texto constitucional estabelece que a gestante tem direito, sem prejuízo do emprego e do salário, à licença maternidade com a duração de 120 dias. Já a Lei 11.770/08 autoriza a prorrogação dessa licença por 60 dias para a funcionária de empresas que aderirem ao Programa Empresa Cidadã.
 
Cintia Alves

Cintia Alves é graduada em jornalismo (2012) e pós-graduada em Gestão de Mídias Digitais (2018). Certificada em treinamento executivo para jornalistas (2023) pela Craig Newmark Graduate School of Journalism, da CUNY (The City University of New York). É editora e atua no Jornal GGN desde 2014.

1 Comentário

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  1. Vai ser dificil o Brasil

    Vai ser dificil o Brasil avançar nas questões de familia, procriação, casamento de homossexuais e o aborto. Por bom tempo ainda, vão se utilizar do aborto como forma de instrumento de ganho de voto conservador  e qualquer tentativa de avanço, puxarão o freio e colocarão novamente a espada sobre a cabeça das mulheres.  

    Como diz a deputada Erundina não somos suficientemente representadas no Congresso. Precisamos nos filiar aos partidos e participar mais ativamente da politica. 

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