Ex-assessora da Lava Jato diz que imprensa “comprava tudo”

Mídia foi peça central na destruição da classe política tradicional, atraindo para o centro de poder juízes, procuradores e delegados
 
Foto: Antonio Cruz/Agência Brasil
 
Jornal GGN – Diferente de qualquer outra operação que a antecedeu, a Lava Jato foi capaz de montar uma relação com a imprensa responsável por mantê-la quase que diariamente no centro dos noticiários, especialmente a partir de 2014, quando se deu a 7ª fase.
 
Desempenho esse que, invariavelmente, influenciou as eleições de 2016 – quando o PT sofreu uma perda histórica nos municípios – e, agora, em 2018, como lembra o jornalista político Kennedy Alencar, na coluna de segunda-feira (28): 
 
“Lava Jato abriu caminho para a eleição de Jair Bolsonaro. Embora tenha revelado um enorme esquema de corrupção, a Lava Jato destruiu a classe política tradicional e permitiu que o candidato do PSL se apresentasse como uma novidade contrária ao status quo. Ocorreu no Brasil um efeito semelhante ao vivido pela Itália após a Operação Mãos Limpas [Mani Pulite].”
 
Em uma coluna publicada em outubro de 2015, aqui no GGN, Luis Nassif destacava que a destruição da classe política tradicional era um dos objetivos da Lava Jato, se baseando no conteúdo do paper “Considerações sobre a operação Mani Pulite”, publicado pelo juiz Sérgio Moro, em 2004, onde descreveu um verdadeiro manual de como montar uma operação similar no Brasil, valendo-se da experiência italiana: vazamento torrencial de depoimentos, a marcação cerrada sobre políticos do centro do poder, o pacto incondicional com os grupos de mídia e a prisão de suspeitos até que aceitem a delação premiada.
 
Nesta quarta-feira (30) o Intercept divulgou uma matéria com entrevista da ex-assessora do departamento de comunicação da Lava Jato, Christianne Machiavelli, confirmando a importância de proximidade com a imprensa, apesar de Christianne não acreditar que tenha havido “estratégia, pelo menos por parte da Justiça Federal”, nesta parceria.
 
O que ela avalia é que a imprensa “comprou” a Lava Jato e, nesse processo de catarse de informações, contribuiu para excessos e assassinatos de reputação. Um exemplo, foi quando jornalistas “foram na onda do MPF e da PF” no caso da cunhada do ex-tesoureiro do PT, João Vaccari. 
 
Baseado em imagens de câmera de segurança de bancos, Moro confundiu Marice Corrêa de Lima com uma outra mulher responsável por supostos depósitos ilegais na conta de Vaccari, pedindo sua prisão na 12ª fase da Lava Jato. 
 
“Era tanto escândalo, um atrás do outro, que as pessoas não pensam direito. As coisas eram simplesmente publicadas (…) Quando perceberam o erro, Inês já era morta. O estrago já tinha sido feito”, disse a ex-assessora da Lava Jato, completando:
 
“O áudio do Lula e da Dilma é delicado, polêmico, mas e o editor do jornal, telejornal, também não teve responsabilidade quando divulgou? Saíram áudios que não tinham nada a ver com o processo, conversas de casal, entre pais e filhos, e que estavam na interceptação. A gente erra a mão em nome de um suposto bem maior”.
 
A jornalista que assina a matéria, Amanda Audi, reforça o quadro do que chama de “rituais” que se seguiam a “cada dia de operação da Lava Jato”:
 
“O celular dos jornalistas começava a apitar antes das 7h da manhã com um texto da PF. Por volta das 10h, os policiais faziam uma coletiva de imprensa junto com membros do MPF. Em seguida, o MPF divulgava o seu release, já com os dados da denúncia. Por fim, a Justiça Federal informava o número da ação judicial, junto com a chave para o acesso [às investigações iniciais e até pedidos de prisão]”. Para ler a matéria na íntegra no Intercept clique aqui.
 
No paper de 2004, Moro mostrou que “o inimigo a ser combatido é o sistema político tradicional, composto por partidos que estão no poder, o esquema empresarial que os suporta e o sistema jurídico convencional, suscetível de pressões”, destacou Nassif no artigo sobre o trabalho do juiz.
 
Com isso, o poder político foi parcialmente deslocado para as mãos de pessoas como Moro: jovens juízes, procuradores e delegados. O juiz de primeira instância também falou da importância da imprensa para estimular a “opinião pública esclarecida”:
 
“É a opinião pública esclarecida que pode, pelos meios institucionais próprios, atacar as causas estruturais da corrupção. Ademais, a punição judicial de agentes públicos corruptos é sempre difícil (…). Nessa perspectiva, a opinião pública pode constituir um salutar substitutivo, tendo condições melhores de impor alguma espécie de punição a agentes públicos corruptos, condenando-os ao ostracismo”, assinou no trabalho onde, também admitiu para seus efeitos colaterais: na Itália, dez suspeitos cometeram suicídios por conta da grande exposição na imprensa, ocorreram assassinatos de reputaçãode inocentes e a ascensão de Sílvio Berlusconi.   
 
Leia também: Bolsonaro quer privatizar ou acabar com TV Brasil 
 
Redação

2 Comentários

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  1. Imprensa safada e vendida!!!

    Imprensa safada e vendida!!! Golpistas!!! Compraram em nome do PSDB e receberam um fascista que vai implantar a censura e colocar na cadeia os jornalistas que lhe fizerem oposição!!! Não sei se rio pelo merecido castigo ou se choro pela perda de liberdade de expressão.

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