Sede de justiça contagiou jovens procuradores contra crimes da ditadura, diz Aurélio Rios

Patricia Faermann
Jornalista, pós-graduada em Estudos Internacionais pela Universidade do Chile, repórter de Política, Justiça e América Latina do GGN há 10 anos.
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Jornal GGN – O subprocurador geral da Procuradoria Federal de Defesa do Cidadão (PFDC), Aurélio Virgílio Veiga Rios, é um dos representantes da luta contra os resquícios da ditadura militar no Brasil. Aurélio está na linha de frente de um esforço conjunto do Ministério Público Federal por dar voz aos familiares de vítimas da repressão. “Há mais de 40 anos luto pela justiça, pra que seja esclarecido o que aconteceu”, resume o subprocurador, em entrevista exclusiva ao Jornal GGN.

Aurélio Rios conta que a sede de justiça contagiou jovens procuradores da República, crianças quando a Lei da Anistia foi aprovada, e que hoje tentam não só recuperar uma história, mas buscar justiça. Em uma das frentes do Ministério Público para esse trabalho de resistência está o grupo Justiça de Transição, ligada à Câmara de Coordenação Criminal, que ainda buscam relatos, documentos e buscas pelas tragédias da Guerrilha do Araguaia, e também desvendam pedaços ainda não completamente explicados do caso Riocentro. “O que mais me encanta nisso é que nenhum deles viveu pessoalmente a tragédia da tortura ou os dissabores da ditadura, eles já nasceram no período democrático e, ainda assim, têm utilizado toda a energia pra buscar a responsabilização das pessoas que praticaram esses atos”.

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As novas provas que surgiram desde os trabalhos do grupo Justiça de Transição permitiram novas denúncias – pelo menos oito só das investigações da Guerrilha do Araguaia -. Neste novo cenário, Aurélio Rios lembra que alguns torturadores já se reconhecem e admitem os crimes cometidos, não só possibilitando as responsabilizações, como também revelando mais informações para a forma como a máquina da ditadura operava.

“O caso do Riocentro, em especial, merece atenção porque quem viveu aquela época, como eu, já sabia desde o início da fraude montada pra esconder os fatos e durante muito tempo a Justiça Militar, infelizmente a Auditoria Militar também, fizeram um trabalho de se omitir em relação a provas explícitas de um atentado terrorista praticado por grupos de extrema direita mais encrostrado dentro da estrutura repressiva do Estado, e que se tivesse sucesso certamente seria o maior atentado terrorista do Brasil”, afirmou o subprocurador.

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Aurélio Virgílio Veiga Rios relembra o histórico do Ministério Público Federal. “Em 1981, era um Ministério Público tolido das suas atribuições, sem autonomia, sem independência funcional, e que funcionava como um órgão de advocacia da União, imagina, era o órgão que de algum modo dava sustentação, pelo menos jurídica, ao regime militar”. Foi nesse contexto que se inseriu a primeira investigação do caso Riocentro, em 1981: a conclusão foi que o sargento e o capitão dentro do carro que levaria os explosivos foram vítimas e não autores do atentado. De acordo com o subprocurador, retomar o assunto na época poderia significar “uma confragação por partes dos setores mais radicais do Exército”, e também poderia interferir no processo de abertura política.

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Quando questionado se haveria possibilidade de a extrema-direita retomar sua força, diante das manifestações realizadas na rua no final de março, com a reedição da Marcha da Família, o subprocurador foi enfático: “Não significam nada, não tem nenhuma legitimidade, a Marcha da Família com Deus pela Liberdade foi um absoluto e retumbante fracasso e não há como fugir da roda da História”.

Sobre as pessoas que ainda insistem em defender que as torturas e repressão não existiram, Aurélio responde: “[eles] não têm ideia, principalmente, que a falta de uma imprensa livre, de jornalistas que tivessem a capacidade de investigar isso, fez com que todos os fatos grosseiros, seja de violência explícita de agentes do Estado, seja em relação aos casos de corrupção, não fossem investigados, tudo estava sob censura prévia. Somente um absoluto desconhecimento do que se passou no país pode levar pessoas mais desavisadas a sustentar isso”.

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Nesse sentido, e alinhado à grande parcela dos que lutam justiça contra a ditadura, Aurélio Virgílio Veiga Rios critica a Lei da Anistia e caracteriza-a como “uma decisão acomodada”. “Dizer que nada vai ser apurado, que nenhuma denúncia vai ser feita, ainda que os crimes mais bárbaros de lesa humanidade tenham sido cometidos, como o desaparecimento forçado de centenas de pessoas e a tortura e o assassinato covarde delas, não pode, obviamente, estar acobertado”.

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Outro resultado de memória dos anos de chumbo e de repressão brasileira do Ministério Público Federal, em conjunto com o Conselho Mundial de Igrejas e a Arquidiocese de São Paulo, é o projeto “Brasil: Nunca Mais Digital“, com o objetivo de evitar que os processos judiciais por crimes políticos fossem destruídos com o fim da ditadura militar, como já ocorreu no pós Estado Novo. Reúne relatórios da análise de cerca de 900 mil páginas de ações e documentos oficiais.

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Entre os resíduos atuais da ditadura militar, o subprocurador afirma que há instituições que ainda não aprenderam a funcionar dentro do estado democrático de direito, como o nosso sistema de segurança pública. “As polícias militares talvez sejam o exemplo mais clássico de instituições que são resistentes, que não entenderam ainda e não assimilaram a Constituição de 88”.

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Todo o trabalho já feito até hoje é visto como pequeno para Aurélio Rios: “Ainda temos um país que exclui uma grande parte da população; índices de violência insustentável para um país se diz democrático; as nossas polícias militares são extremamente violentas, ainda têm um mau hábito de executar pessoas, presumindo que elas são inimigas, adversárias do regime; esse debate recente que quer transformar manifestante em terrorista é absolutamente surreal, isso mostra o quanto as instituições precisam evoluir”.

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“E em relação à distribuição dos documentos, ou do registro da história, isso será permanente”, concluiu Aurélio.

Patricia Faermann

Jornalista, pós-graduada em Estudos Internacionais pela Universidade do Chile, repórter de Política, Justiça e América Latina do GGN há 10 anos.

12 Comentários

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  1. Todo o sistema político no

    Todo o sistema político no Brasil, esta bichado. Coisa de País colonizado, esta tudo cartelizado, herança das Capitanias Hereditárias.

     

    A contrapartida na cobrança excessiva dos impostos não existe.

    IPVA

    IPTU

    Imposto de renda

     

    E mesmo assim tem que pagar, por segurança, moradia, transporte, educação, saúde…

     

    Por isto que voto nulo. Qualquer um que chegar ao poder não vai mudar nada, mesmo.

     

    Se o voto nulo, abstenção e branco chegar a 70 – 80% como ficara a classe política?

     

    De alguma forma serão obrigados a sentar e estudar mudanças factíveis e reais. E não somente manobras para se perpetuar no poder as minorias e panelinhas, a coisa toda esta chegando no deboche.

     

    Como ficarão as instituições políticas diante do mundo, perderão credibilidade, legalidade.

     

    É a DESOBEDIENCIA CIVIL.

     

    Cade as vozes que se levantaram contra a Ditadura Militar? Estão cooptadas. Fazem parte das benesses do poder em todos os níveis. O poder no Brasil nada mais é do que uma infinita mamata. Lamentável.

    Virou modinha estes filhotes da elite focar em revanchismo. Coisa inventada para ocupar o tempo e sentirem-se muitooooooos uteis.

    Até parece que a tortura, a brutalidade do estado, a exclusão social acabou no Brasil.

    Cade as vozes para denuncuar as Capitanias Hereditarias que até hoje subjugam este Pais?

    1. “Dizer que nada vai ser

      “Dizer que nada vai ser apurado, que nenhuma denúncia vai ser feita, ainda que os crimes mais bárbaros de lesa humanidade tenham sido cometidos, como o desaparecimento forçado de centenas de pessoas e a tortura e o assassinato covarde delas, não pode, obviamente, estar acobertado”.

       

      Isto acabou no Brasil?

      Somente as vitimas da ditadura militar, merecem ser defendidas?

    2. “Se o voto nulo, abstenção e

      “Se o voto nulo, abstenção e branco chegar a 70 – 80% como ficara a classe política?”

      não muda nada vão ser eleitos da mesma forma.

      Voto nulo, voto em branco etc, e o mesmo que dar voto para o governo.

  2. Enquanto isso nas Minas…

    Policiais federais fazem manifestação nesta quarta-feira
    Durante a paralisação, os agente mostraram um elefante branco, representando o inquérito policial, que para eles seria ineficiente

    PUBLICADO EM 23/04/14 – 12p6
    JOSÉ VÍTOR CAMILO

    Na manhã desta quarta-feira (23), agentes, escrivães e papiloscopistas da Polícia Federal (PF) de Minas Gerais fizeram uma manifestação em frente à sede da corporação, no bairro Gutierrez, na região Oeste de Belo Horizonte.

    O protesto teve início por volta das 9h e pede a reestruturação da PF, além do reajuste salarial. De acordo com o agente da PF e diretor jurídico do Sindicado dos Policiais Federais de Minas Gerais (Sinpef), Paulo Murta, esta já é a 9ª manifestação da classe somente em 2014.

    “O nosso pleito central é o fim do modelo da polícia que nós temos, pois queremos uma segurança pública que funcione de verdade. Nas polícias civis de todo o país apenas 8% dos homicídios são elucidados, sendo que 50 mil pessoas assassinadas por ano. Na PF, apenas 4% dos inquéritos chegam ao fim”, criticou o agente.

    Para eles, uma solução para o problema seria o fim do Inquérito Policial, que, para eles, seriam o elefante branco da PF. “É ineficiente por conta do modelo, que concentra a investigação em uma única pessoa. Queremos que a população ganhe com mais crimes elucidados e, para isso, a nossa classe precisa de ter a possibilidade de investigação”, afirma Murta.

    Ainda conforme o policial, eles fizeram o concurso público que não exigia ensino superior, mas exercem funções à altura do cargo. “Queremos melhorar o serviço prestado à população e , assim, termos um grau de responsabilidade que nos permita ser remunerados adequadamente. A faixa de remuneração que exigimos é igual à das carreiras de nível superior da administração pública federal”, finaliza o diretor.

    Movimento “apartidário”

    Durante a manifestação, um dos atos feitos pelos policiais federais foi a queima de bandeiras do Partido dos Trabalhados (PT). “Isso não significa a partidarização do movimento. O alvo do protesto não é diretamente o partido, mas sim aos quadros que comandam o poder público federal, mais diretamente na figura da presidenta Dilma e do Ministro da Justiça”, afirma Paulo Murta.
     

  3. Erro feio

    Erro feio no titulo: nao e’ “contaminou” e sim “contagiou”. Apesar de objetivamente serem quase a mesma coisa, o sentido subjetivo muda da agua para o vinho.

  4. Mais um ” indignado ”
    Não

    Mais um ” indignado “

    Não contra os crimes do periodo contra direitos humanos, pois se assim fosse a comissão da suposta ” verdade ” iria ter a missao de revelar a verdade sobre TODOS os que foram mortos no periodo

    Sendo pela direita ou pela esquerda , como tambem os autores dos fatos

    Pois verdade nao tem lado.

    Mas como é a comissão nacional da OPINIÃO dos que dela fazem parte, eles e esses ditos juristas humanistas só se preocupa com as vitimas dos militares

    As pessoas que foram mortas devido as açoes dos que lutavam para substituir uma ditadura por outra podem ser esquecidas , as familias delas nao tem duvidas, sao mortos cuja verdade sobre os seus algozes nao merecem explicações…rs

  5. Porque estudar o passado?

    Transcrição de alguns trechos da palestra do Procurador da República Andrey Borges de Mendonça

    Porque estudar o passado?

    Eu nasci depois da lei da anistia, não tive nenhum parente torturado, mas porquê isso é importante para mim?

    O Ministério Público Federal teve também sua omissão, a polícia, o judiciário… Tiveram participação no mínimo omissiva durante a ditadura.

    A Folha de São Paulo teve um editorial que disse “Ditabranda”. Disse que não foi uma ditadura como na Argentina ou em outros países onde houve 40 mil mortos. No Brasil, realmente, o número de mortos foi muito mais baixo, porem o número de torturados foi muito elevado. Mais de 20 mil torturados.

    Isso aconteceu porque aqui eles usavam o poder judiciário, eles não usaram uma sistemática de desaparecimento.

    Eles torturavam, obtinham as confissões, iam no poder judiciário e o poder judiciário fazia vista grossa.

    Consta num processo que um preso disse para um juiz “Eu fui torturado”

    “Nem vamos falar de tortura. Isso é tão bárbaro, que acho melhor tirar dos apontamentos”, disse o juiz.

    Nos queremos demonstrar que o estado brasileiro atualmente não aceita esse tipo de prática. É necessário punir quem praticou esse tipo de ato.

    Infelizmente o Brasil chancelou a lei de anistia, porém nem tudo está perdido. A Corte Interamericana de Direitos Humanos disse: “Brasil, você tem que punir”. Contrariou a decisão do STF.
    A lei de anistia não pode ser uma autoanistia. (imaginem) Eu, no poder me dou anistia. Olha que beleza. Eu me perdôo!

    (…)

    Em nome do Ministério Público eu agradeço este convite, hoje nos temos um grupo de trabalho que só estuda isso, isso foi uma luta dentro do Ministério Público, fiz o meu mestrado sobre o Direito ä Memória, as pessoas olhavam para mim e diziam “você não tem coisa mais importante para fazer?”

    E é isso que nós temos que mudar.

    Andrey Borges de Mendonça
    Procurador da República desde 2004. Graduado pela Universidade de São Paulo. Mestre pela Universidade Pablo de Olavide, em Sevilha, na Espanha. Mestrando pela Universidade de São Paulo, em processo penal. Professor universitário de Direito Processual Penal e em diversos Cursos Preparatórios para concurso. Professor da Escola Superior do Ministério Público da União e palestrante pela Escola Superior do Ministério Público do Estado de São Paulo.

    1ª Jornada da Ditadura 30 de abril de 2011
    Feitos e efeitos da Ditadura Civil-Militar em Rio Claro
    Mesa Redonda: “A atualidade da ditadura civil-militar: avanços e retrocessos”
    A Prefeitura Municipal de Rio Claro, por meio do Arquivo Público e Histórico e da Secretaria de Segurança e Defesa Civil, recebeu em abril de 2011 familiares, amigos e defensores dos direitos humanos para a Jornada sobre Ditadura Militar em Rio Claro, que homenageou Maria Cecília Bárbara Wetten, Orlando Moura Momente e Abílio Clemente Filho.
    A mesa redonda foi composta por Olga Lopes Salomão, Prof. Dr. Andrey Borges Mendonça, Dr. Luis Carlos Fabri, Carlos Gilberto Pereira e Frei José Alamiro Andrade e Silva.
    http://www.aphrioclaro.sp.gov.br/2014/03/18/jornada-da-ditadura-2011/

     

     

    [video:http://youtu.be/kdHg7nIhomI%5D

  6. Pois é…
    A DITADURA

    Pois é…

    A DITADURA ACABOU?

    Leis para uns e leis para outros.

    Cade os cantores da ditadura?

    Calice!

    A rapaziada do rapper são verdadeiros revolucionarios da atualidade.

  7. Conversa mole essa de querer

    Conversa mole essa de querer “saber a verdade”, nunca vi ate o advento da internet informação sobre o que os ditos “defensores da democracia” realmetne fizeram e fazem.

    Nunca vimos qualquer imformação sobre os crimes cometidos pela esquerda no Brasil e no mundo.

    Na escola, tv, jornal sempre o proselitismo esquerdista reinava.

    A principal mentira é ainda contada que lutavam pela democracia.

    [video:https://www.youtube.com/watch?v=jguhH-QwBgY#t=195%5D

     

     

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