Fernando Castilho
Fernando Castilho é arquiteto, professor e escritor. Autor de Depois que Descemos das Árvores, Um Humano Num Pálido Ponto Azul e Dilma, a Sangria Estancada.
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O STF e o dia da vergonha, por Fernando Castilho

O STF acordou o urso faminto. E para cima de quem ele foi? Claro, dos mais fracos, dos que não detém o poder econômico.

Imagem: no_limit_pictures

O STF e o dia da vergonha

por Fernando Castilho

O último dia 21 ficou conhecido por um grupo de aposentados como o Dia da Vergonha.

Foi nesse dia que o Supremo Tribunal Federal buscou uma fórmula para jogar uma pá de cal sobre o processo da Revisão da Vida Toda, que saiu vitorioso naquele já distante dia 1º de dezembro de 2022.

Os vários adiamentos teriam sido uma estratégia para aguardar que ministros novos assumissem suas togas e garimpassem 2 processos relativos ao INSS que hibernavam feito ursos há 23 anos! Como esses novos ministros não puderam votar a RVT em dezembro de 2022, vitoriosa por 6 votos a 5, engendraram uma manobra para tentar rever o mérito da decisão já tomada, o que constitui verdadeiro absurdo jurídico.

Dessa forma, o STF acordou o urso faminto. E para cima de quem ele foi? Claro, dos mais fracos, dos que não detém o poder econômico. Como consequência, os segurados que contribuíram com quantias maiores antes de 1994, acreditando que estariam garantindo uma velhice digna, apenas jogaram dinheiro fora.

Aposentados que recebem apenas um salário-mínimo poderiam ter aumentado seus benefícios com a vitória da Revisão da Vida Toda. Agora essa vitória corre um enorme risco de ser anulada em sede de embargos de declaração, contrariando a própria justiça, já que nesta fase, rediscutir o mérito já julgado constitui uma ilegalidade e gera uma irresponsável insegurança jurídica.

A planilha apresentada pelo INSS ao STF que afirma que a RVT causaria um impacto financeiro da ordem de 480 bilhões de reais foi o que motivou ministros a utilizarem os processos antigos como instrumento para derrubar a ação.

Os escritórios que defendem os segurados se cansaram de contestar essa falácia, demonstrando que o que se pretende é tão somente corrigir injustiças cometidas contra apenas um grupo de 25 a 30 mil aposentados num universo de 39 milhões! Isso dá, na ponta do lápis, apenas cerca de 3 bilhões de reais! Contudo, a maioria dos ministros e boa parte da imprensa desdenharam em estudar os valores, afinal, trata-se de apenas velhinhos no fim da vida. Alegaram, apressadamente, que a RVT, e, por consequência, os pobres dos aposentados, pasmem, tinham a intenção de quebrar o Brasil. Isso, num país que pagou em 2022 a bagatela de 586 bilhões em juros da dívida!

No Dia da Vergonha, cerca de 30 aposentados até tentaram fazer uma manifestação pacífica em frente ao tribunal, mas foram impedidos pela polícia. Historicamente, no Brasil, quando se trata de minorias sem voz, é muito mais fácil cometer injustiças, afinal, não há força para reação e ninguém está vendo mesmo.

O julgamento final estava marcado para 3 de abril, mas o presidente Barroso o retirou da pauta e agora nem mais aparece na programação do mês, talvez devido a duas questões de ordem impetradas pelo IEPREV, que é amigo da corte e pela Defensoria Pública da União. Barroso vai se debruçar sobre essas questões para tentar derrubá-las também.

De qualquer forma, mesmo a RVT seja julgada mais à frente, é imprescindível e humano que o governo e o STF revejam sua posição e olhem para esse grupo de aposentados que vivem uma situação de hipossuficiência, não como velhinhos chorões, mas sim, como cidadãos que buscam tão somente seus direitos para viverem de maneira um pouco mais digna seus últimos dias. Há tempo para isso.

Afinal, esse não é um governo que se elegeu com a bandeira do combate à fome e às desigualdades sociais no Brasil?

Fernando Castilho é arquiteto, professor e escritor. Autor de Depois que Descemos das Árvores, Um Humano Num Pálido Ponto Azul e Dilma, a Sangria Estancada.

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Fernando Castilho

Fernando Castilho é arquiteto, professor e escritor. Autor de Depois que Descemos das Árvores, Um Humano Num Pálido Ponto Azul e Dilma, a Sangria Estancada.

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