Tony Tornado pagou caro por defender sua cor

Lourdes Nassif
Redatora-chefe no GGN
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do Almanaque Brasil

Tony Tornado pagou caro por defender sua cor

por Bento Andreato

De terno e gravata, Tony Tornado foi muito elogiado pelo papel de Gregório Fortunato, em 1993. A carreira de ator em humorísticos, filmes e novelas ganhou prestígio com o papel de braço direito de Getúlio Vargas em uma minissérie.

Antes de encarar a atuação como profissão, porém, Antonio Viana Gomes já tinha dado muito assunto para a opinião pública em situações bem diferentes.

Lenços extravagantes, sapato plataforma e calça boca de sino: Tony acompanhava Elis Regina na canção Black is Beatiful, no Festival Internacional da Canção de 1971. Quando a frase “Eu quero um homem de cor” soou no estádio do Maracanãzinho lotado, ele deixou o protocolo: levantou o braço com o punho fechado, assim como faziam os panteras negras americanos. “Saí de lá algemado”, lembra. O engajamento do artista pela causa lhe custaria a saída do País, em tempos de ditadura militar. Já conhecia o exterior: tinha sido lá que tomara consciência do movimento.

Paraquedista da turma de Silvio Santos no Exército, Tony chegou até a servir ao Brasil no Egito. Mas a viagem que mais marcou sua vida foi quando desistiu de tudo para arriscar a sorte nos Estados Unidos. Ao voltar para o Rio de Janeiro com um enorme cabelo black power e sotaque nova-iorquino do Harlem, não agradou em nada os militares que haviam tomado o poder quatro anos antes.

Além da dança à la James Brown que o apelidou, no bairro negro de Nova Iorque Tony tinha aprendido também a lutar contra a discriminação racial. Jogou-se na carreira de cantor entoando versos como Sou negro e ninguém vai rir de mim e Quando duas mãos se encontram / Jogam no chão a sombra da mesma cor. Entre vários suingues de soul abrasileirado e letras políticas, teve o compacto Deus Negro censurado. Você teria por ele esse mesmo amor/ Se Jesus fosse um homem de cor?, indagava a faixa.

Enquanto fingia ser uma atração estrangeira em boates cariocas, Tony não incomodava muito. O problema foi quando o articulador do movimento musical Black Rio venceu um Festival Internacional da Canção em escala nacional de televisão, ao interpretar BR-3, em 1970. Ter um caso amoroso com uma apresentadora branca também não ajudava a salvar sua ficha. Inventaram até que a dramática BR-3 fazia apologia ao uso de cocaína.

“Paguei muito caro por comandar o movimento Black Rio. Acharam que estávamos incitando o racismo e me chamavam de crioulo comunista”, comenta ele. Os militares temiam que na agitação cultural de música black nascesse uma espécie de panteras negras tupiniquim. No fim, Tony precisou viver anos exilado no Uruguai, na Tchecoslováquia e em Cuba. Mas quando avalia o período, só guarda orgulho: “O saldo do movimento black foi acima do que estávamos esperando”. Sobre o exílio, também não tem mágoas: “Não tem problema, não, dom. Voltei mais brasileiro que nunca”.

 

 

Lourdes Nassif

Redatora-chefe no GGN

7 Comentários

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  1. São histórias como a de Tony

    São histórias como a de Tony Tornado, tal como relata a post que fogem ao conhecimento daqueles meninos, ou jovens adultos, hoje formando um número expressivo dos ainda tementes ao comunismo, que se pensam muito espertos para votarem em Bolsonaro. Imagine quais desses sabem quem foi Tony Tornado. 

    Já assisti a um documentário com grandes personalidades das artes brasileiras, narrando, meticulosamente, como eram pegos pelos censuradores nas redações dos jornais, por exemplo. Ali eu entendi, sobretudo, a ignorância intelectual desses sensores. Um desses jornalistas, morto há pouco tempo, dá gargalhadas ao contar que o sensor entrou em sua sala, quando ele solvia uns goles de Wisky, que ofereceu ao dedo-duro, e este bebeu tanto que ao se despedir, de tão bêbado, esquecera do que fora lá fazer. Isso pode parecer piada, mas não era. Só demonstrava parte da esculhambação do conjunto de normas seguidas pelo regime ditatorial. Jornalista que viveu aqueles períodos sabem que havia muita maldade, havia muita perseguição, muita prisão sem motivos – como a de Lula agora -, mas também um bocado de imbecilidade, porque militar, em geral é como burro encabrestado, com um único olhar. Obtuso é a palavra certa. 

    Como estudante da UEG, à época, fui assistir no anfietro da Universidade uma palestra do especialista em Teatro, Paulo Pontes, que dividiu o teatro em três tempos pra ser mais didático. Quando foi explicar como agiam os artistas e o público naquela atualidade dentro dos teatros, não teve chance nem de começar. As cortinas e fecharam, e uma voz vinda de dentro dizia: POR MOTIVOS TÉCNICOS, DAMOS POR ENCERRADA A APRESENTAÇÃO. E as luzes se apagaram, quando nós, alunos, voltamos à sala de aula. Alguns anos depois, assistindo tv em Brasília, soube da morte desse Teatrólogo, que desaparecera do mapa. Soubemos que ele viveu um tempo com Bibi Ferreira, mas a artistas, que eu saiba, omiti toda e qualquer informação sobre ele ou eles.

    E não é história de mentioroso, não. O mesmo aconteceu diante dos meus olhos, quando minha irmã e eu fomos a um teatro na rua Siqueira Campos – acho que era o Opinião -, pra assistir Geraldo Vandré, logo após o sucesso de Caminhando no Festival Internacional da Canção. Vimos ele cantar tudo, porém, plateia cheia esperando a última canção, que bombava no Rio e no Brasil inteiro, e que hoje pode-se chamar de Hino, embora ele negue agora ter sido uma canção de protesto. Saímos do teatro frustradíssimos por vermos as cortinas se fecharem e alguém usar o mesmo expediente lá da UEG. Resultado: dali em diante Geraldo Vandré sumiu. As notícias sobre ele eram muitas, até que havia sido preso e castrado. Preso ele foi, com certeza, o resto são especulações. 

    Assim, eu penso que cabe à esquerda, no Congresso, nas ruas, nos palanques em momentos de disputas eleitorais, abrirem o jogo, de forma didática, para tentar, pelo menos, abrir a cabeça dessas pessoas que são muito bobinhas, ignorantes, alienadas, por falta de estudo, por preguiça mental de abrir um livro, ou mesmo de pesquisar no Youtube a verdade sobre as mazelas de uma ditadura, como foi aquela em que o Brasil viveu. 

  2. Ele

    e o Wilson Simonal, cada um a seu modo tiveram suas carreiras destruidas mais que pelo preconceito, pela inveja.

    Ninguém dançava como Tony Tornado e nem tinha o swing do Simonal, que além de tudo estava ganhando muito dinheiro.

  3. E tem gente ingênua que admite votar em Bolsonaro…

    …sem conseguir enxergar, ou sentir no ar que respiramos, que Bolsonaro não passa de um ventríloquo, talvez uma espécie de fantoche, que encena ser candidato à presidência da república (em letras minúsculas, considerados o nome e os reais propósitos envolvidos), quem sabe apenas guardando, como subserviente ex-capitão do EB, a vaga para algum dos altos coturnos falastrões que hoje, muito claramente, soltam seus tuítes na grande rede ou suas perorações anticomunistas nos ambientes que os aceitam com rapapés, com o único objetivo de amedrontarem um Judiciário já acovardado, enquanto mantém sob rédea curta um submisso Executivo desbotado, corrupto, ilegítimo e golpista de entranhas podres, Executivo que parece se divertir anunciando e vendendo partes do nosso bem maior, o Patrimônio Público.

  4. Sou Negro SIm

    Genial

    Me libertei

    Jurei nunca mais fazer som por aqui
    Porque ninguém tinha interesse em ouvir
    Mas agora é hora de me libertar
    E quem quizer ouça primeiro pra depois falar
    Porque

    Todo o meu canto sai do meu coração ( 3x)

    Jurei nunca mais fazer som por aqui
    Porque ninguem tinha interesse em ouvir
    Mas agora é hora de me libertar
    E quem quizer ouça primeiro pra depois ouvir
    Porque

    Todo o meu canto sai do meu coração.

  5. Sou Negro SIm

    Genial

    Me libertei

    Jurei nunca mais fazer som por aqui
    Porque ninguém tinha interesse em ouvir
    Mas agora é hora de me libertar
    E quem quizer ouça primeiro pra depois falar
    Porque

    Todo o meu canto sai do meu coração ( 3x)

    Jurei nunca mais fazer som por aqui
    Porque ninguem tinha interesse em ouvir
    Mas agora é hora de me libertar
    E quem quizer ouça primeiro pra depois ouvir
    Porque

    Todo o meu canto sai do meu coração.

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