Brasilianas: como a regulação ajudou a ampliar produção audiovisual independente no Brasil

Fernando Dias da Grifa Filmes e ex-presidente da BRAVI faz um balanço das políticas que ajudaram a aumentar a competição na produção de filmes, documentários e seriados brasileiros nos mercados interno e externo
 
Como a regulação ajudou a ampliar produção independente de audiovisual no Brasil
 
Do Brasilianas
 
A produção de material audiovisual no Brasil – filmes, documentários, seriados e desenhos animados – sofreu um crescimento exponencial nos últimos anos e estudos mais recentes da Agência Nacional do Cinema (Ancine) apontam que um dos mecanismos responsáveis pela ampliação foi a Lei da TV Paga (12.485/2011) que obriga a veiculação de um percentual mínimo de horas de exibição de conteúdo brasileiro. 
 
No último levantamento divulgado em maio deste ano, a Agência apontou que o Brasil já contava com 5.759 produtoras independentes, ainda em 2016 e, no ano anterior, foram registrados 3.284 horas de obras inéditas brasileiras independentes veiculadas nos canais pagos, sendo 75% seriados e 14% longas-metragens (40% deles variedades e 32% de documentários). 
 
Em entrevista para Luis Nassif no programa Brasilianas, realização do GGN com a TV PUC de São Paulo, Fernando Dias, produtor e diretor fundador da Grifa Filmes faz um balanço dos fatores que levaram a essa virada da produção audiovisual, conquistando também mercados externos.  

 
Outras mudanças positivas da lei foi permitir a entrada de empresas de telefonia na transmissão de conteúdo, aumentando ainda mais a competição e também a regulamentação sobre conteúdo condicionado. Antigamente as leis eram determinadas em cima do tipo de tecnologia onde o produto era veiculado. “Então, por exemplo, a Lei do Cabo regulava o conteúdo distribuído por cabo, quando era por satélite e lei morria”, explica Dias. Agora, não importa a mídia ou tecnologia, a comercialização do produto é feita em cima do acesso. 
 
Não só a Lei da TV Paga ajudou o Brasil a ampliar sua produção no mercado externo, mas também a criação da BRAVI (Brasil Audiovisual Independente) em 1999, antiga ABPITV, foi fundamental para determinar o salto da produção nacional, ajudando os produtores a se mobilizarem politicamente. 
 
“Eu brincava antigamente falando que o Brasil era autofágico em termos de produção de televisão, porque tudo que se produzia aqui era produzido para o mercado interno e consumo interno”, reflete Dias, se referindo ao domínio que os grupos de televisão sempre tiveram sobre o conteúdo que transmitem. Com a BRAVI os produtores independentes se organizaram para discutir modelos de negócios e contratos que permitissem romper um pouco com o vertical estabelecido no Brasil. 
 
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Exportações e redução do monopólio das TVs
 
Dias, que dirigiu a BRAVI por oito anos, foi um dos responsáveis pelo projeto de exportação do audiovisual brasileiro levado para a Apex (Agência Brasileira de Promoção de Exportações e Investimentos). 
 
“A Apex recebeu bem nossa proposta o que foi curioso porque esse foi o primeiro projeto de serviços que apoiou. Até então estavam acostumados a vender calça jeans, parafusos, café. Serviço tem uma complexidade! Eu vendo projeto e credibilidade, e a outra parte tem que acreditar”. 
 
Com a ajuda da Agência as produtoras independentes do país conseguiram aumentar o contrato de co-produção em outros países, reforça o produtor, destacando que a regulação de audiovisual no mundo sempre foi muito rígida, não permitindo que os donos das televisões também fossem donos da produção, a não ser para conteúdos editoriais ou de esportes, gerando uma condição de competição mais acirrada. 
 
“Só no Brasil você ganha uma ‘rodovia onde só passa seu carro’, ou seja, é como se a montadora tivesse sua própria rodovia”, compara, fazendo uma analogia do modelo regulatório das concessões públicas para uso de espaço televisivo no país. Ferando Dias reforça que até nos Estados Unidos o marco regulatório proíbe que os grandes grupos de mídia sejam produtores dos conteúdos. “Então, as grandes séries norte-americanas foram feitas e são feitas até hoje por produtores independentes”.
 
Mercado em mudança 
 
O mercado de consumo audiovisual está em transformação no Brasil e no mundo, primeiro pelo acesso à tecnologia de produção, ou seja, câmeras e plataformas de edição nunca estiveram tão acessíveis, segundo, porque as novas tecnologias (celulares, tablets, smart tvs e a própria conectividade pela internet) estão alterando o modelo de acesso de usuários. Por isso, pontua Dias, a discussão do momento na regulação é o VoD (video on demand) ou vídeo sob demanda. 
 
Cada vez mais o usuário terá poder para escolher o conteúdo que irá acessar. Esse, por exemplo, é o modelo de negócios do Netflix e que se espalha para outros canais que estão desenvolvendo seus próprios portais oferecendo mais serviços por streaming.  Segundo um estudo independente – pois a empresa não divulga dados estatísticos por cada país – o Brasil já era o 4º maior mercado da Netflix em 2015 com 2,9 milhões de assinantes. 
 
Soft Power
 
Fernando Dias sempre defendeu que as negociações do setor não fossem feitas apenas com o Ministério da Cultura mas sim por uma equipe multiministerial por se tratar de um setor capaz de vender não apenas o produto audiovisual em si, mas uma imagem do Brasil que pode beneficiar vários setores da economia. 
 
Nesse ponto, o apresentador Luis Nassif lembra que uma das formas eficientes do soft power (ou poder suave de influência) dos Estados Unidos é Hollywood, destacando que na década de 1930, o jornalista Olympio Guilherme, convidado pela Fox para participar de um concurso em Hollywood, tentou produzir um filme sobre a miséria americana, decorrente da crise econômica, mas foi proibido pelo governo, apontando que a produção cinematográfica norte-americana foi conduzida também como um fator geopolítico. 
 
No caso brasileiro não necessariamente a produção audiovisual deveria esconder as mazelas. O ponto, na verdade, é que o audiovisual está sendo subutilizado como ferramenta para destacar a capacidade de produção e criatividade local.  
 
Redação

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