A mídia volta a tratar a economia como caso de polícia, por Luís Nassif

Imaginaram poder reproduzir estratégia do início do governo Dilma, onde miravam alvos, faziam a crítica e conseguiam resposta da presidente.

O episódio Márcio Pochmann – alvo de ataques quando foi aventado seu nome para a presidência do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatísticas) – é um pequeno ensaio de um dos maiores pesos que o país carrega: a ignorância coletiva da mídia.

Acompanhe o que aconteceu.

  1. Miriam Leitão, que é jornalista de economia, tem broncas antigas com Pochmann, ainda do tempo de presidente do IPEA (Instituto de Pesquisas Econômicas Aplicadas). Na época, Pochmann resolveu filtrar as manifestações de técnicos do órgão e também impediu que algumas fontes de Mirian, já aposentadas, continuassem a utilizar a estrutura do órgão. Criou-se uma questão pessoal.
  2. Quando surgiu o seu nome, Mirian partiu para o velho jogo do assassinato de reputações, repetindo integralmente as disputas intestinas que sempre emporcalharam a discussão econômica no país. E lançou a suspeita de que Pochmann poderia manipular as estatísticas do IBGE. Só uma profunda ignorância ou má fé para supor que um presidente do IBGE possa fazer qualquer espécie de manipulação. É ignorar por completo toda a estrutura de coleta de dados e de checagens do IBGE.
  3. Mas, confiando no espírito de torcida e na ignorância de seus pares, deu a senha: a volta da briga do bem contra o mal. O bem, obviamente, o mercado e os economistas ortodoxos; o mal, os desenvolvimentistas. Imediatamente ergueu-se um coro de araras e papagaios na Globonews e na CNN, com o alerta de que o PT estaria querendo interferir na política econômica. Quem é que vai explicar a esse bando de terra planistas que IBGE não formula nem nunca formulou política econômica? Mirian sabe disso, por isso veio com a suspeita ignominiosa de que um intelectual da envergadura de Pochmann poderia – repito “poderia” – manipular os dados. Os demais, sem nenhuma noção, foram atrás do primeiro bordão que encontraram. Houve colunista que disse que ele iria trombar com Fernando Haddad; a outra que garantiu que Simone Tebet estava descontente; um solene “membro do Planejamento” – assim mesmo -, dizendo que era uma escolha pior do que todas as escolhas de Jair Bolsonaro.

Com isso, volta-se ao mesmo clima de 10 anos atrás. Nem se pode dizer que é resquício do lavajatismo. Na verdade, a Lava Jato foi consequência dessa falta de decoro de tratar o pensamento contrário como inimigo e criminalizar todas suas atitudes, colocar a vítima sob suspeita dos crimes (intelectuais) mais hediondos e não agir com a responsabilidade que um veículo de massa exige, atacando a vítima sem lhe dar as mesmas armas para se defender.

Volta-se ao subjornalismo, ao estilo típico do pré-bolsonarismo. Aliás, alguém comentou outro dia que o bolsonarismo foi o maior instrumento de lavar reputações manchadas pelo lavajatismo.

Durante algum tempo, pareceu que haviam aprendido a lição e passariam a fazer críticas fundamentadas e civilizadas, sem emular o comportamento das torcidas organizadas.

Lego engano! O jornalismo brasileiro ainda é uma construção do terceiro mundo.

Depois da escolha de Pochmann, o mesmo O Globo soltou uma matéria mostrando a total tranquilidade de Simone Tebet com a escolha e a constatação óbvia de que o IBGE é imune a manipulações. E qual a evidência que tinham de que Pochmann tentaria manipular? Nenhuma! Uma acusação leviana, jogada ao vento como penas de galinha, para utilizar a imagem bíblica..

Em vez de admitir a impossibilidade de manipulações do IBGE, mudaram a versão para um presidente figurativo, ignorando a biografia de Pochmann.

Imaginaram que poderiam reproduzir a estratégia do início do governo Dilma, na qual simulavam apoio à presidente, a “faxineira da República”, miravam alvos, faziam a crítica e conseguiam imediatamente derrubá-las. Com Lula, ocorre o contrário. Provavelmente foram os ataques baixos a Pochmann que consolidaram a sua escolha para o IBGE. E se de fato existiu uma fonte do Planejamento espalhando as infâmias, faria bem a Ministra Simone Tebet em localizar, porque só atrapalhou a boa imagem colaborativa que vem construindo. Na minha opinião, a fonte inicial, na qual se baseou Malu Gaspar tem as iniciais ML.

Aqui, o currículo do candidato de Miriam à presidência do IBGE.

Aqui, os livros de Pochmann na Amazon:

8 Comentários

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  1. Salve, Salve Brizolla: Globo é contra? É bom para o povo brasileiro e para o Brasil… rede Globo é sucursal dos interesses do imperialismo dos EUA.

  2. É indiferente quem seja Marcio Pochmann, sua obra intelectual e o que ele fez nos cargos que ocupou. Depois de três dias de bombardeio dos veículos da Globo e da CNN, fora a reprodução da discussão na Folha, Estadão, Veja etc, ele já está marcado para o grande público como “economista do PT”, “militante do PT”, “quadro do PT” e por aí afora. O mal já está feito e é irreversível. É só imaginar o que vai acontecer no jornalismo diário a cada novo número publicado pelo IBGE, com manchetes e artigos assim: “O quanto se pode confiar nos números do IBGE atual”, “Considerando que sejam vedadeiros os dados publicados pelo IBGE presidido por Marcio Pochmann, saiu a nova prévia da inflação” e por aí vai…

  3. A mídia brasileira não se aproxima sequer da barra pesadíssima que é e sempre foi o jornalismo americano. E todos os presidentes do país viveram e vivem com isso. O jogo sempre foi esse desde os panfletos anônimos que inundavam a França antes, durante e depois da Revolução Francesa. Não consigo entender esse anseio por um jornalismo ideal, sensato, coerente etc. Nunca existiu tal coisa. Truman dizia isso: “Quem não aguenta o calor, que saia da cozinha”.

  4. Uma correção ao belo texto. Onde está “a ignorância coletiva da mídia”, leia-se a canalhice… Por mais mequetrefes que seja, a canaille sempre sabe onde quer chegar.

    O nome do jogo, desde 31/10/22, é ‘2026’. Estão babando e rezando para que aparece alguém minimamente competente para encarar o candidato de esquerda adiante.

    Enquanto isso, jogam o jogo de futricas de comadres de interior, tentando de alguma maneira criar caso.

  5. Penso que pessoas ácidas, ardilosas, altamente preconceituosas e que possivelmente não conseguem amar a si mesmas, só são toleráveis e/ou aceitáveis em círculos sociais, por força de um poder protetor que as projetam e sustentam ao custo de aceitarem, por uma indutiva imposição, a se manterem fiéis, servis e submissas.
    Esse poder, porém, seja qual for o produto da maquiagem que usam para tentar maquiar a aparência e o convívio, jamais conseguirá fazê-las serem sequer a metade do que a desejam transformar.
    Quando alguém desce ao submundo das ambições para tentar subir no mundo real, a marca indestrutível desse submundo e o cheiro que exala, se mistura ao odor da sua pele e nada impedirá a revelação da sua identificação e das suas más intenções.

  6. Os barões da mídia querem governar o país inclusive e principalmente quando o candidato deles perde a eleição. O presidente da Câmara dos Deputados acha que é mais importante do que o presidente da República muito embora não tenha sido eleito pela população para governar o Brasil. Juízes e desembargadores federais, membros do MPF e Ministros dos Tribunais acreditam que podem impedir o país de ser governado para garantir aumentos salariais. Generais e coronéis pensam que a autoridade deles pode se projetar fora dos Quartéis como se fossem os únicos cidadãos. Juristas como Ives Gandra ajudam a escrever mimutas para rupturas da legalidade e não perdem suas inscrições na OAB. Pastores evangélicos querem comandar o sistema público de educação. Donos de lojas de armas de fogo e de clubes de tiro ameaçam a autoridade do Estado dizendo que pretendem aderir ao terrorismo político e não são imediatamente enjaulados. E o povo, coitado, trabalha quando pode, se vira para comer, pede uns trocados no farol para tomar pinga e não sabe se torce mais para a seleção feminina de futebol do que para a seleção masculina de garotos propaganda das fábricas de material esportivo, shampoo, cerveja, refrigerantes, etc… Nosso caos político parece ser programático.

  7. Caro Nassif, concordo em parte com sua opinião sobre o ataque vil de algumas figurinhas marcadas da imprensa a indicação de Márcio Pochmman..
    Vc reúne informações importantes e se posiciona com relação às medidas adotadas pelo então presidente de IPEA…
    Quando vc fala em declarações vc está se referindo a publicações.?! É isso?!
    De qualquer forma o Presidente de qualquer instituição tem direito e obrigação de ter acesso inclusive antes do que é produzido e o no que os técnicos da instituição estão produzindo..
    Qual o problema disso??
    Outra coisa é ir contra o que as regras da instituição determinam..
    Rigor técnico e debate sobre os dados.. críticas interna revisões de dados, texto.. são práticas comuns para quem trabalha nesse ramos. Outra coisa é proibir ou interferir na publicação…
    Presidência ou superior analisar e a avaliar o que é produzido ñ é censura. Pesquisador tem uma certa autonomia. Ok .. mas de alguma forma alguém precisa fazer a crítica.
    Não sei dizer se a questão do Ipea de censura foi dessa forma con alguns estão vendendo e comprando.

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