Como a indústria de armas vai levar os EUA à guerra, por Luís Nassif

Defesa corresponde a mais da metade do orçamento, reduzindo recursos para saúde pública, educação, moradia, proteção ambiental e transporte.

Paraquedistas do exército dos EUA designados para a 1ª Brigada de Combate se preparam para embarcar em uma aeronave com destino à área de operações do Comando Central dos EUA da Carolina do Norte [Arquivo: Reuters]

Recentemente, o ex-presidente Jimmy Carter explicou as razões do crescimento da China ameaçar a economia norte-americana. Enquanto os EUA se metem em guerras ao redor do mundo, a China se concentra em investimentos na infraestrutura interna.

Há mais em jogo do que a vocação americana para intervir em países. Em dezembro de 2022, o presidente americano Joe Biden aprovou um orçamento militar da ordem de US$ 858 bilhões para o ano fiscal de 2023. Serve para cobrir gastos do Pentágono, desenvolvimento de ogivas nucleares no Departamento de Energia. É um aumento de 4,3% em relação ao ano anterior, o segundo maior aumento desde a Segunda Guerra Mundial. Juntando segurança interna, assistência a veteranos e ajuda militar à Ucrânia, o total ultrapassa US $1,4 trilhão.

A lei foi aprovada por 350 a 80 na Câmara e 83 a 11 no Senado. Para efeito de comparação, o orçamento militar chinês será de US $239 bilhões.

Hoje em dia há 750 bases militares dos EUA espalhadas em todos os continentes, 170 mil soldados no exterior e operações antiterroristas em pelo menos 85 países. A China tem oito bases militares.

Aí se entra no complexo industrial-militar. Mais da metade das despesas vão para os cinco principais fornecedores militares, a Lockheed Martin, Raytheon, Boeing, General Dynamics e Northrop Grumman. Seu lobby pressiona constantemente pela adoção de novos sistemas de armas e são pródigos em ajuda aos congressistas. O atual chefe do Comitê de Serviços Armados da Câmara, por exemplo, recebeu mais de US $444 mil em doações de campanhas de fabricantes de armas.

Os militares também gastam a granel. O Departamento de Defesa tem utilizado os recursos para promover filmes que consagram a atuação militar, como é o caso de Top Gun: Maverick. Um estudo em cima de documentos internos do Departamento de Defesa comprovou o controle editorial direto sobre mais de 2.500 filmes e programas de televisão.

O Pentágono também financia think tanks de política externa e um programa agressivo de recrutamento nas escolas secundárias, como o Corpo de Treinamento de Oficiais da Reserva Junior, com programas em 3.500 escolas secundárias.

A máquina é alimentada pela expectativa permanente de novas guerras. A nova guerra fria com a Ásia enquadra-se no negócio bélico. Em abril passado, Biden anunciou que os EUA enviariam submarinos com armas nucleares para a Coreia do Sul. No mesmo mês, Japão e Coreia do Sul concordaram em exercício conjuntos de defesas antimísseis e anti-submarino para combater a Coreia do Norte e “promover a paz e a segurança na região do Indo-Pacífico”.

Anuncia-se para breve exercício militares bilaterais com a Austrália. Tudo em nome do combate à China, apontada como ameaça aos “interesses, segurança e valores” do países membros da OTAN (Organização do Tratado do Atlântico Norte). Esse espírito de guerra fria tem levado governos de vários países a aumentar os gastos militares, em detrimento dos gastos em benefício da população.

Nos Estados Unidos, por exemplo, o orçamento de defesa corresponde a mais da metade do orçamento discricionário federal, reduzindo recursos para saúde pública, educação, moradia, proteção ambiental e transporte.

Ao mesmo tempo, essa militarização e a figura do inimigo externo levou o clima de guerra à própria polícia, especialmente contra a população negra. 

O artigo se baseou em dados do blog americano Relatórios da Frente Econômica.

Luis Nassif

6 Comentários

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

  1. Há mais de 10 a frase dita a um jornalista por uma autoridade do governo Bush Jr. reverbera na minha consciência. Ele disse algo mais ou menos assim: os EUA é um império e cria sua própria realidade quanto age cabendo aos intelectuais descreve-la, mas enquanto eles fazem isso os EUA volta a agir transformando nnovamente a realidade. Joe Biden é democrata e parece se orientar segundo a crença daquele líder republicano, sendo digno de nota algo que você esqueceu de explicitar Nassif: nos EUA nunca existe divergência política entre republicanos e democratas em relação ao aumento do Orçamento Militar e a construção de novas bases militares no exterior. A ideologia imperial que domina as políticas interna e externa dos EUA é extremamente sedutora, ela somente deixará de existir quando aquele país for militarmente derrotado. Mas para que isso ocorra o planeta inteiro terá que ser devastado. Não existe um caminho que não leve ao conflito nuclear: ele é inevitável.

  2. O mundo está assistindo a China do passado caminhando para o futuro e os EUA do futuro indo para o passado. A guerra no território da Ucrânia nos mostra um fato curioso: Os quatro maiores exportadores de armas no mundo, estão envolvidas no conflito e aí cabe uma pergunta. A quem interessa o conflito? Não podemos esquecer que destes quatro maiores exportadores, três (EUA, França e Reino Unido) dão suporte bélico à Ucrânia e o segundo maior exportador(Russia) do lado contrário. Assim sendo, a guerra vai continuar até que os ucranianos percebam que estão sendo usados como bucha de canhão.

  3. A Indústria bélica não vai levar os Estados Unidos à guerra, Nassif; ela tem feito isso, sistematicamente, PELO MENOS desde a década de 50, conforme foi admitido explicitamente pelo presidente Eisenhower (um general) em seu discurso de despedida da Casa Branca. Faturou horrores, com as duas grandes guerras, e, como se sabe, em time que está ganhando não se mexe. É só consultar a História e constatar o envolvimento americano ininterrupto em guerras, revoluções, invasões, conflitos de naturezas diversas, inclusive convulsões sociais e guerras civis. E a tática recentemente adotada para derrubar governos hostis – o lawfare, a guerra híbrida – só fez impulsionar o lobby da indústria de armamentos, que sentiu seu espaço invadido por executivos de outras indústrias, inclusive a da advocacia, e pelo judiciário. A indústria das armas precisa vender o que produz, senão vai à falência. Qualquer indústria precisa, mas nesse caso específico, a demanda é gerada por conflitos, guerras, e é portanto necessário que haja conflitos e guerras. Some-se a isso o caso das armas de alta tecnologia, que só podem – ao menos teoricamente – ser vendidas para um cliente único, o Pentágono. Assim como não há interesse – nem se alocam recursos para isso – em erradicar doenças, somente em atacar sintomas, também não há interesse na Paz, pois ela não movimenta a economia em seus setores com maior valor agregado – farmacêutica e bélica, entre outras – e com maior volume de recursos para o lobby. Congressistas gostam muito dessa situação. O Capitalismo – quando começaram a ser produzidas mercadorias não apenas para satisfação de necessidades humanas, mas também para satisfação de desejos, sonhos, fantasias, e, por vias transversas, vícios, cupidez, etc.,etc.,etc. – necessita que as sociedades estejam em crescente e constante estado de inquietude. E a necessidade de consumo é um dos principais fatores dessa inquietude. Da mesma forma, os estados nacionais estão em constante premência de manter e ampliar essa necessidade, numa situação de retroalimentação que só pode levar a um caminho:o da supressão dessas mesmas capacidades em outras sociedades. E quando essas outras sociedades dispõem de materiais extremamante necessários para a manutenção dessa premeência – nomeadamente, recursos naturais, minerais, fósseis (a lista é longa) – adiciona-se um outro fator à equação. E quando, ainda, outros estados nacionais, resolvem adotar os mesmos métodos, ou correlatos, para passarem da condição de fornecedor de matérias-primas para a de produtor de bens industriais, aí é que a coisa pega de vez. Os Estados Unidos estão na primeira posição mencionada. A China, na segunda. A ela se juntarão, em breve, a Índia e talvez a Rússia. A guerra já está aí, Nassif. Sempre esteve, para a glória e crescimento dos capitalistas. No tempo de Vargas, havia o que negociar, havia ganho marginal para ser conquistado. E agora? Ganha a indústria bélica, e, a reboque, a farmacêutica, a da construção civil, para reconstruir o que for destruído, etc. Ganham, portanto, os países industrializados. E a gente fica no ora veja, clamando por paz, que não tem valor de mercado. E o planeta ganha mais alguns milhões de cadáveres para acolher em seu seio. Alguma novidade? A guerra sempre esteve aí. E seus gigolôs agradecem.

  4. Uma grossa olhada na História dos Estados Unidos, e é o que sempre fizeram: a guerra. Provocados e quase sem provocantes. Guerra e mais guerras. Depois de Segundo Grande Guerra investiram no soft power, inclusive higienizando o arte cinematográfica não engajada, com a primeira grande vítima em Charles Chaplin, sendo bem sucedidos até a ganância ultrapassar os limites do razoável. E tome-lhe guerra. É, de fato, o que eles fazem. O resto são complementos, quase sempre com material humano importado. E tome-lhe guerra. No dia que forem obrigados a parar… enlouquecem.

  5. Mais da metade do orçamento dos EUA é para gasto militares. Aqui no Brasil, mais da metadade
    do orçamento é para pagamento do serviço da dívida pública. Tem alguma coisa errada
    nessa história.

Você pode fazer o Jornal GGN ser cada vez melhor.

Apoie e faça parte desta caminhada para que ele se torne um veículo cada vez mais respeitado e forte.

Seja um apoiador