Maira Vasconcelos
Maíra Mateus de Vasconcelos - jornalista, de Belo Horizonte, mora há anos em Buenos Aires. Publica matérias e artigos sobre política argentina no Jornal GGN, cobriu algumas eleições presidenciais na América Latina. Também escreve crônicas para o GGN. Tem uma plaqueta e dois livros de poesia publicados, sendo o último “Algumas ideias para filmes de terror” (editora 7Letras, 2022).
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Não que saiba falar sobre almas, por Maíra Vasconcelos

Não que saiba falar sobre almas, por Maíra Vasconcelos

Não que eu saiba falar sobre almas, mas sempre desconfiei dos seus esconderijos e jeitos para se balançar no ar. E que almas não podem ser como estátuas, porque almas existem no movimento. Nada muito fixo no tempo possui alma. Museus, por exemplo, não têm alma. Museu tem história e história não tem alma, é cronologia, pretendem medir o tempo e apontar o que está morto e não volta mais. E a alma está na vida, junto. Assim como a música que brinca entre mentes e corpos sem ter hora para sair e voltar. Também a alma gosta de bater asas.

Em meu peito sei quando é sinal de alma e quando não é, quando despertam essa parte que gosta de se expressar e sorrio pela leveza que o mundo pode ter. Claro, pois perceber o que é da alma também nos mostra o peso de tudo. E não convém achar que intuir sobre coisas da alma seja algo bonito ou elevado. Não é. Não que eu saiba falar sobre almas, mas se aprende a sorrir. Como ontem no jardim ou como acontece em alguns despertares sem rigidez, sem muros.

Ah, almas odeiam muros. Buenos Aires tem lugares e pessoas deslizas com menos muros, tal como em toda cidade onde se supõe tenham espaços assim transparentes. Almas não gostam de sombras e véus a tapar nada. Almas gostam de ver tudo entre todas as coisas, como se fossem fantasmas, mas não é. Está, mas também deixa de estar, aquele chegar-e-partir alternado e espantoso. Como Buenos Aires, que tem a poesia de uma neve leve que irá se derreter, não adianta, a neve irá se derreter em nossas mãos.

Mas estava a falar de alma. Não que eu saiba falar sobre almas, mas talvez melhor do que sobre carros ou marcas de eletrodomésticos. E isso me é um traço importante para existir ou pensar alguma existência. Alma primeiro, depois os carros e os utensílios. Porque almas gostam de passear, livres, e poder olhar ao longe. E isso é muito importante: descansar o olhar. Como hoje, que olhei para a neve em Buenos Aires. Mas, que se saiba, em Buenos Aires não neva desde 2007.

Maira Vasconcelos

Maíra Mateus de Vasconcelos - jornalista, de Belo Horizonte, mora há anos em Buenos Aires. Publica matérias e artigos sobre política argentina no Jornal GGN, cobriu algumas eleições presidenciais na América Latina. Também escreve crônicas para o GGN. Tem uma plaqueta e dois livros de poesia publicados, sendo o último “Algumas ideias para filmes de terror” (editora 7Letras, 2022).

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