Izaias Almada
Izaías Almada é romancista, dramaturgo e roteirista brasileiro nascido em BH. Em 1963 mudou-se para a cidade de São Paulo, onde trabalhou em teatro, jornalismo, publicidade na TV e roteiro. Entre os anos de 1969 e 1971, foi prisioneiro político do golpe militar no Brasil que ocorreu em 1964.
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Segunda carta aos idosos (para passar o tempo), por Izaías Almada

Assim como os produtos que compramos em supermercados, nós os humanos deveríamos receber tão logo nascemos a data de validade

Arte na Rua – Lisboa

Segunda carta aos idosos

(para passar o tempo)

por Izaías Almada

Caríssimos companheiros idosos e não só:

Em meio ao desconforto político-institucional que ainda iremos viver nos próximos meses antes das eleições municipais e para não esquentar a cabeça (minha e dos leitores), peço licença para falar um pouquinho da minha gente, os velhos… Os idosos ou, melhor ainda, a turma da melhor idade.

Isso: a turma da melhor idade. De eufemismo em eufemismo, algum cretino inventou a expressão “melhor idade”. Melhor em quê? Para quê? Para quem?

Muitos dizem que o idoso, pelo conhecimento adquirido com o passar dos anos, vai ganhando cultura e novas habilidades como, por exemplo, a de conseguir rir, tossir, espirrar e mijar, tudo ao mesmo tempo.

Não, não riam. Isso pode acontecer de verdade e muitas outras situações mais desagradáveis como, por exemplo, levar tombos perigosos, muitos deles fatais.

Meu tio Zezinho, nascido e criado nas Minas Gerais, vivendo a maior parte de sua vida na cidade de Cataguazes criou, a certa altura, o hábito de tomar suas refeições no próprio quarto, pois suas mãos tremiam e ele fazia uma grande sujeira com os talheres…

De caducos ou gagás, tornamo-nos vítimas do Alzheimer e ficamos neurastênicos, esquecidos de que o somos nos dois sentidos, isto é, esquecemos as coisas e somos esquecidos para muitas coisas, sobretudo para o trabalho… Muitos idosos, pela experiência de vida e pela cultura e conhecimentos acumulados, estão aptos a trabalharem.

Assim como marcam a validade dos produtos que compramos em supermercados e outras quitandas, nós os humanos deveríamos receber tão logo nascemos a data de validade: produzido em tal dia, mês e ano. Data de validade até mês tal do ano tal. Deus, tão previdente na criação do mundo, esqueceu-se desse pormenor…

Tivemos na pré-história a sorte de podermos nos comunicar por palavras, com guinchos e sons guturais no início, mas com o uso dos gestos fomos aprimorando a comunicação, depois de muitos pontapés e pauladas na cabeça.

Os guinchos e uivos foram sendo transformados em sons entrecortados de silêncio e conseguimos dar nomes aos bois, muito embora nos dias de hoje seja ainda possível encontrar alguns homens das cavernas por aí a arrastar as mulheres pelos cabelos e a reclamar que foram enganados nas últimas eleições presidenciais no Brasil e preparar um golpe de estado.

Tudo indica, entretanto, na toada em que o mundo vai caminhando, que não demoraremos a voltar aos bons e velhos costumes de nossos antepassados. Temos feito o possível para isso. Aqui no Brasil, então, nem se fala!… A ignorância ao alcance de todos!

De vinte em vinte anos temos aquela sensação de que finalmente “entramos nos eixos” e vamos nos tornar um país desenvolvido, com saudável democracia, forte economicamente, livre e soberano, justo com todos os seus cidadãos e de repente, pimba! Como Sísifos da espécie lá vamos nós levarmos mais uma vez a pedra da civilização ladeira acima.

Mas nós, os mais idosos, no auge da nossa ‘melhor idade’, temos o consolo e a possibilidade de enfrentarmos tudo isso com alguma serenidade, pois a cada século que passa, vamos ganhando mais tempo de envelhecimento e a expectativa já quase real de que chegaremos aos 90, 100, 110 anos de idade, ao contrário daqueles “velhotes” da Idade Média que desapareciam encarquilhados aí com seus trinta ou quarenta aninhos de idade…

Ou seja, dizem os estudiosos da condição humana, que aí por volta da década de 2050/60, se não tivermos uma nova guerra mundial a atrapalhar, nosso planetinha já estará habitado por uns dez bilhões de trogloditas, quem sabe disputando a tapa uma caverninha para morar e fazendo a Copa do Mundo de Futebol ou no Polo Sul ou Polo Norte… E quem diz que não?

É só viver para crer!

Izaías Almada é romancista, dramaturgo e roteirista brasileiro nascido em BH. Em 1963 mudou-se para a cidade de São Paulo, onde trabalhou em teatro, jornalismo, publicidade na TV e roteiro. Entre os anos de 1969 e 1971, foi prisioneiro político do golpe militar no Brasil que ocorreu em 1964.

O texto não representa necessariamente a opinião do Jornal GGN. Concorda ou tem ponto de vista diferente? Mande seu artigo para [email protected]. O artigo será publicado se atender aos critérios do Jornal GGN.

Izaias Almada

Izaías Almada é romancista, dramaturgo e roteirista brasileiro nascido em BH. Em 1963 mudou-se para a cidade de São Paulo, onde trabalhou em teatro, jornalismo, publicidade na TV e roteiro. Entre os anos de 1969 e 1971, foi prisioneiro político do golpe militar no Brasil que ocorreu em 1964.

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