Foto: Michel Pêcheux
O apanhador no campo do sentido – Vol.6
Por Gustavo Conde
[Continuação]
Análise do discurso e marxismo da linguagem
Essa cena teórica, portanto, aqui arrolada, possibilitou a emergência de uma teoria de análise linguística ainda mais sofisticada, justamente porque é mais um passo em direção à complexidade da linguagem – que é, a rigor, infinita.
Falo da Análise do Discurso Francesa, teoria formulada em 1969 através das publicações de um conjunto de pesquisadores ligados ao marxismo e à psicanálise, cujo expoente atende pelo nome de Michel Pêcheux.
Este campo do conhecimento lida com um triplex teórico: marxismo, psicanálise e linguística. Sua organização metodológica pressupõe, portanto e em primeiro lugar, a existência de uma língua estruturalmente estabelecida através do recorte teórico saussuriano.
Essa premissa é fundamental para que se consiga produzir análises consistentes a respeito do fenômeno da linguagem em ação.
Posta a língua ‘científica’ de Saussure, a análise do discurso foi instada a procurar uma teoria da história para fundamentar um conjunto de codificações específicas para a contextualização da emergência do discurso, seja ele político, seja ele teórico, estético ou fático.
A teoria da história invocada e mobilizada por esse campo de conhecimento foi-é o marxismo, mas não um marxismo qualquer: trata-se do marxismo althusseriano, da operação técnica que o filósofo francês fez com o texto teórico de Karl Marx.
Muito simplificadamente: Althusser formulou a existência de aparelhos ideológicos do Estado que controlariam os sentidos das palavras e dos discursos que poderiam-deveriam circular nas sociedades. Toda a experiência social, portanto, para Althusser, ensejava um regime de controles e violências, quase sempre oriundo das instituições consagradas e viciadas.
Até aqui, temos dois andares do triplex. Falta o terceiro. Revelo, em tempo, que se trata nada mais nada menos do que a teoria do sujeito, ou: a psicanálise.
O sentido não existe a priori, ele é um efeito
A análise do discurso ousou propor, a despeito de seus pares e componentes teóricos ‘especificantes’, uma teoria geral da produção de sentido. Tal como o marxismo propôs uma teoria que explicasse a experiência social diante da produção de riqueza material, a análise do discurso propõe uma teoria que explique a experiência social diante da produção de riqueza intelectual, ou: uma teoria que contribua para a compreensão técnica de como nascem os sentidos de uma língua humana – que não são dados a priori, mas sim significados produzidos nas sociedades como qualquer outro tipo de riqueza.
Esse conceito é um conceito de interpretação de texto, nada mais. É apenas uma intepretação de texto qualificada e repleta de nuances, estratégias e desdobramentos de leituras transversas, da história, do sujeito, da língua e, também – e após os anos 90 – de dimensões pragmáticas postuladas por filósofos da linguagem como John Austin e Paul Grice – se se quiser.
Essa fatoração da produção do sentido é extremamente poderosa, porque tende a não deixar arestas falaciosas, uma vez que toda a sua estruturação de leitura é baseada no próprio monitoramento crítico interno da produção da análise em si. É algo, realmente, denso.
Chega a realmente impressionar que o mundo do direito e o mundo do jornalismo não tenham ainda sequer conhecido esse tipo de concepção técnica da linguagem. Eles vivem em um passado distante, obsoleto, conservador e tragado por forças simplificadoras do século 19 no que diz respeito à intepretação de texto. Estão, por assim dizer e com todo o respeito, aquém das complexidades do próprio tempo.
[Continua]
Aqui, os links do ensaio:
O apanhador no campo do sentido – Vol.1
O apanhador no campo do sentido – Vol.2
O apanhador no campo do sentido – Vol.3
O apanhador no campo do sentido – Vol.4
O apanhador no campo do sentido – Vol.5
O apanhador no campo do sentido – Vol.6
O apanhador no campo do sentido – Vol.7
O apanhador no campo do sentido – Vol.8
O apanhador no campo do sentido – Vol.9
O apanhador no campo do sentido – Vol.10
O apanhador no campo do sentido – Vol.11
O apanhador no campo do sentido – Vol.12
O apanhador no campo do sentido – Vol.13
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