Sessão das dez: Gente no Domingo (1930)

GENTE NO DOMINGO (Menschen am Sonntag, 1930)

Este documentário do cinema mudo mostra uma Alemanha dos anos 20 bem diferente dos terrores nazistas, repleta de beleza e paz retratadas pela vida cotidiana de pessoas comuns.


Gente no Domingo é um filme que é muito lembrado hoje principalmente pelos nomes que estavam envolvidos nele: Robert Siodmak com seu irmão Curt Siodmak, Edgar G. Ulmer, Billy Wilder e Fred Zinnemann. Eles imigraram para Hollywood fugindo do horror nazista e realizaram uma carreira no cinema mais ou menos bem sucedida. Curt Siodmak e Edgar G. Ulmer não foram tão bem sucedidos, assim, quanto seus pares. O primeiro era escritor e o segundo fotográfico cinematográfico que acabou se especializado em filmes B, cujo capital recolhemos em pequenas joias escondidas em alguns de seus filmes noir. Enquanto Robert Siodmak construiu uma carreira mais sólida, com um grande número de filmes em preto e branco. Fred Zinnemann teve grandes sucessos com filmes como Matar ou Morrer (High Noon, 1952) e A Um Passo da Eternidade (From Here to Eternity, 1953). Já Billy Wilder… bem, este dispensa comentários. Esta foi sua estréia no cinema, por detrás da câmera, num filme que foi mais um trabalho coletivo, apesar de figurar nos créditos como dirigido por Siodmak e Ulmer, escrito por Billy Wilder, sobre reportagem de Curt Siodmak, mas no Cineplayers são creditados como sendo de Curt Siodmak, Robert Siodmak, Edgar G. Ulmer e Fred Zinnemann, incluindo Billy Wilder como um dos roteiristas. 

A premissa do filme é muito interessante e, de certa forma, antecipou o estilo neo-realista que a Europa, sobretudo a Itália, viria explorar no final dos anos 40 e 50. Os protagonistas encarnam quatro atores não-profissionais (na verdade cinco, se contarmos o motorista de táxi) e o filme foi encenado principalmente nas ruas de Berlim. O argumento é quase um passeio turístico, uma ‘desculpa’ para refletir a classe trabalhadora de Berlim desfrutando das atividades de lazer num domingo qualquer. Os personagens principais são dois homens que saíram com duas meninas para passar o domingo juntos: um deles é casado, mas não parece se dar bem com sua esposa, que deixou em casa dormindo; o outro, inicialmente tenta seduzir a garota que ele conheceu no dia anterior, mas quando ela o rejeita, ele dá a vez para o amigo que veio simplesmente como um companheiro. Obviamente, no final do encontro tudo será esquecido por ambos. Embora os quatro protagonistas não são atores profissionais, mas eles exercem seus papéis com muita facilidade e credibilidade. Isso por que, os personagens são exibidos como um reflexo de suas próprias vidas reais e, portanto, não envolve tanto esforço para fazer um bom trabalho. 
Os diretores do filme buscam recriar um ambiente a ponto de esquecer, por vezes, os atores para transformar brevemente num documentário sobre Berlim, na Alemanha antes do desastre que estava prestes a ocorrer. Se tivermos isso em mente, é estranho ver hoje, as perspectivas de rostos tão inocentes e felizes diante de acontecimentos históricos que certamente todos eles ‘desconhecessem’ que estavam prestes a chegar. Por outro lado, ao contrário do grande documentário sobre a capital alemã, o magnífico  Berlim, Sinfonia da Metróple (1927), Gente no Domingo tem um estilo ousado e inovador, mais estilizado e clássico, e mais poético. Abundam cenas idílicas, cheias de parques e praias, crianças nuas brincando inocentemente, e há muitos closes que mostram o interesse dos criadores em retratar esses alemães operários e humildes, nos oferecendo diversos close-ups de rostos desconhecidos (como as pequenas e ao mesmo tempo grandes cenas de rostos de pessoas que vimos ao logo do filme). Neste contexto, o argumento associado com os quatro protagonistas é mais que cenas que o documentário nos dá, mas as muitas sutilezas que perpassam no filme. A diferença de outros filmes alemães do período é que este é mais realista que impressionista, fundamentado numa estética, embora documental, mas enfatizada também num enredo minimalista.

Gente no Domingo
é também um dos últimos grandes filmes mudos da época alemã. Quando filmado, novas formas já tinha entrado no mercado alemão mudando completamente a estética e o estilo com várias obras sendo realizadas. É também um dos últimos grandes filmes a serem produzidos antes que a indústria cinematográfica alemã caisse na mão dos nazistas e perdesse muitas de suas figuras principais, que imigravam para escapar da repressão do Estado Nazifascista. Depois disso, os cineastas mais importantes da Alemanha fugiram progressivamente para a França e os Estados Unidos. Mas o realismo e a beleza de Gente no Domingo são um testemunho de uma Alemanha que poderia ter sido pacificada e que, no entanto, estava prestes a sofrer um dos piores períodos de sua história.

Fonte (tradução livre): Site espanhol El Gabinete del Doctor Mabuse

 

Redação

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