
O lugar da ciência, tecnologia e inovação no Rio de Janeiro
por Denizar Vianna, Márcio Albuquerque e Mônica Savedra
É consenso que a ciência é uma das vocações do Rio de Janeiro. O estado sedia importantes instituições científicas, que, ao longo do tempo, se articularam com empresas públicas e privadas conformando um processo virtuoso, ainda que não linear, de desenvolvimento de tecnologias, inovações com formação profissional e desenvolvimento econômico. Exploração de petróleo em águas profundas, produtividade, energias limpas, otimização do uso da terra para agricultura e pecuária e o desenvolvimento nacional da indústria aeroespacial resultaram de investimentos permanentes em instituições e empresas produtoras de ciência e tecnologia inovadoras. O decantado destino reservado aos países periféricos, copiar ou comprar tecnologias, foi recusado, ao menos parcialmente.
Nos anos 1990, o otimismo com a industrialização como estratégia de modernização foi abalado. A disputa entre a autonomia tecnológica, exigência de trabalho qualificado e facilidades para exploração predatória de bens naturais com mão de obra barata retornou com força ao debate sobre políticas públicas. O Rio de Janeiro, onde a perda de dinamismo econômico foi antecipada com a transferência da capital do país para o Brasilia, se afastou inclusive da trajetória brasileira. Entre 1970 e 2021 a participação do estado no PIB nacional caiu de 18,2% para 10,5%.
Disparidades sociais no território fluminense se acentuaram. A capacidade científica instalada e a oferta de soluções úteis e efetivas para equacionar e responder necessidades básicas da população local se tornou assimétrica. Temos expertise em áreas de conhecimento de ponta. Mas, o Rio de Janeiro possui 6 cidades entre as 50 mais violentas do país, segundo o Anuário Brasileiro de Segurança Pública 2023. Universidades públicas e privadas, fundações, institutos de ciência e tecnologia aqui instaladas convivem com cerca de 15% de domicílios precários em 2019, de acordo com o IBGE. Tampouco indicadores de saúde e educação estaduais estão entre os melhores do país.
Pandemia da covid-19 e mudanças climáticas aproximaram cientistas e suas instituições à população. Sustentabilidade ambiental, exigente de mudanças radicais, entre as quais a adoção de uma temporalidade baseada no equilíbrio entre passado, presente e futuro e acesso universal a bens e serviços essenciais à vida são novos desafios. Para a ciência e tecnologia do Rio de Janeiro a tarefa não é trivial. Trata-se de contribuir decisivamente para escrever a muitas mãos um roteiro que combine descarbonização, educação, empregabilidade e bem-estar social. Abordagens que priorizem melhoria da infraestrutura, direitos humanos e sociais não admitem receitas prontas ou imposição de supostos modelos de sucesso.
A legislação estadual, instituída em 2022, prevê a criação de um sistema de ciência, tecnologia e inovação ainda não devidamente institucionalizado. Planejamento e sobretudo políticas que explicitem prioridades, objetivos e metas de curto, médio e longo prazo ficaram pendentes. Entidades empresariais e a rede de pesquisas podem contribuir para impulsionar articulações entre a ciência, tecnologia e inovação. Tecnologias, incluindo automação e inteligência artificial não estão predestinadas a ampliar desigualdades estruturais, respondem a normas sociais, incentivos econômicos, políticos. Esforços podem ser direcionados para estimular e não substituir o trabalho. Inovações em si não são antagônicas a solidariedade e inclusão social, desde que quem as produz e quem as utiliza mantenham relações intermediadas por políticas públicas para o bem comum. A aposta do Rio de Janeiro na ciência, tecnologia e inovação é correta, para que seja honrada precisamos de coordenação, implementação de ações bem como monitorar, avaliar decisões e resultados e intensificar a cooperação entre governo e as empresas privadas, baseada em responsabilidades mútuas.
Denizar Vianna, médico, Associação Comercial do Rio de Janeiro
Márcio Albuquerque, pesquisador, Centro Brasileiro de Pesquisas Físicas/MCTI
Mônica Savedra, professora, Universidade Federal Fluminense
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