Gestão da saúde pública: há vacina contra a corrupção?

            A edição no. 126 da Revista RADIS, editada pela Escola Nacional de Saúde Pública Sergio Arouca, traz o panorama encontrado pelos atuais titulares das secretarias municipais de saúde em 10 capitais brasileiras. Vários gestores relatam ter encontrado heranças malditas e pesados esqueletos nos armários: irregularidades na contratação de pessoal e fornecedores, comprometimento de quase todo o orçamento com a folha de pagamento do funcionalismo, atraso no pagamento de salários, dívidas milionárias deixadas pela administração anterior, falta de material e sucateamento de hospitais e ambulatórios.


            Em 27 de março, a Secretaria de Estado da Saúde de São Paulo e a Corregedoria Geral da Administração da Casa Civil anunciaram uma cooperação com o Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD) para prevenir a corrupção na saúde. Direcionado aos gestores responsáveis por administração, finanças, compras, auditoria e recursos humanos de unidades públicas de saúde, o projeto “Prevenção à Corrupção na Saúde” propõe-se a capacitar 600 agentes para “reverter a malversação de recursos públicos” da saúde no Estado.


            Embora existam meios de fiscalização e controle como o Sistema Nacional de Auditoria do SUS, os tribunais de contas dos Estados e da União e o Ministério Público, as denúncias de desvio de verbas, superfaturamento, contratações sem concurso público ou licitação e outros problemas graves no setor de saúde aparecem em praticamente todas as administrações, em todos os níveis de governo.


            Sem dúvida é essencial apurar formalmente as denúncias e punir quem, de má fé, lesa os cofres públicos e prejudica o cuidado com a saúde da população. As ouvidorias, a imprensa, os conselhos de saúde e o poder legislativo têm papel decisivo para iniciar e acompanhar o processo de apuração até seu desfecho. De nada adianta a população formular uma denúncia e vê-la acabar na amnésia jornalística e burocrática, ou mesmo em pizza.


É preciso também instruir todos os agentes públicos de saúde pelo menos com noções de Administração e Direito. O bem intencionado desinformado pode resultar tão nocivo à saúde pública quanto o corrupto de carteirinha. Quantos médicos e enfermeiros sensibilizados com o drama de um paciente não correm o risco de atropelar as normas do Direito Administrativo para agilizar a contratação de um exame ou a compra de um medicamento de alto custo?


Mais: quantos profissionais têm a consciência e o treinamento para usar material estéril apenas quando estritamente necessário, evitar pedidos duplos de exames para o mesmo paciente, apagar as lâmpadas ao sair do ambiente e separar o lixo comum das unidades de saúde, já que a coleta e o processamento do lixo hospitalar são bem mais caros? Somados, os mínimos desperdícios dilatam o rombo da subfinanciada saúde pública brasileira.


Numa época em que a informatização é cada vez maior, vigora a lei de acesso à informação e muitos profissionais de saúde anunciam títulos MBA (“Master of Business Administration”) para lustrar o currículo, os usuários do SUS tentam compreender como ainda pode haver tanta desorganização, falta de comunicação, ineficiência e desperdício. Quem conseguirá responder com honestidade?


 Aracy P. S. Balbani é médica otorrinolaringologista. CRM-SP 81.725

Redação

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