A desestabilização política promovida pelo judiciário

Do Público

A justiça partidária e o limiar do golpe no Brasil

Por Sylvia Debossan Moretzshon

Surfando a onda de crescente popularidade na sua cruzada contra a corrupção, o juiz Sérgio Moro avançou até ultrapassar todos os limites.

O Brasil vive o auge de sua mais grave crise política desde a redemocratização. O clima de tensão favorece a circulação de boatos sobre a perspectiva de prisão iminente do ex-Presidente Lula, que teve sua nomeação para a Casa Civil sustada pelo ministro Gilmar Mendes. O governo anunciou que entrará com recurso contra essa decisão, mas por ora o ex-Presidente continua vulnerável às ações do juiz Sérgio Moro, que conduz a Operação Lava Jato.

A tensão tende a se refletir nas ruas, até então tomadas por protestos a favor do impeachment da Presidente Dilma Rousseff e manifestações de índole abertamente fascista, que culminaram no ato de domingo dia 13, o maior até o momento. Entretanto, a resposta da esquerda, na última sexta-feira (18/3), demonstrou uma capacidade de reação que acirra o grau de polarização social.

Importa aqui notar a singularidade do processo de desestabilização política, liderada justamente por juízes, os que mais deveriam zelar pela serenidade.

Sérgio Moro já vinha sendo acusado de agir arbitrariamente ao utilizar a prisão preventiva de vários acusados como forma de coagi-los a aceitar a delação premiada. As críticas tendiam a ser menosprezadas porque, para a opinião pública, eram uma forma de proteger poderosos empresários, executivos da Petrobras e colaboradores do PT, até então intocáveis.

Surfando a onda de crescente popularidade na sua cruzada contra a corrupção, o juiz avançou até ultrapassar todos os limites: primeiro, no dia 4 de março, no episódio do abuso na condução coercitiva do ex-Presidente Lula para depoimento – pois esse recurso só se aplica em caso de resistência ao mandado judicial –, depoimento estranhamente realizado no posto da Polícia Federal no aeroporto de Congonhas, o que levantou suspeitas sobre a intenção de conduzi-lo, já preso, a Curitiba, sede da Lava Jato; e agora, com a flagrante ilegalidade do vazamento de conversas telefônicas entre a presidente Dilma Rousseff e Lula, logo após o anúncio de que o ex-Presidente seria nomeado para a Casa Civil.

A ilegalidade do ato é indiscutível por dois motivos: porque um juiz de primeira instância não poderia grampear as ligações da Presidente a não ser com autorização do Supremo Tribunal Federal; e porque a ligação em questão foi feita já quando esse mesmo juiz havia determinado a suspensão das escutas a Lula. Portanto, obviamente não poderia divulgá-la.

Mas não é só: “Moro não quebrou o sigilo telefônico apenas de Roberto Teixeira, advogado do ex-Presidente Luiz Inácio Lula da Silva, mas também do telefone central da sede do escritório dele (…). Com isso, conversas de todos os 25 advogados da banca com pelo menos 300 clientes foram grampeadas, além de telefonemas de empregados e estagiários da banca”.

Tal é o grau do descalabro a que chegamos. Mas, como em Hamlet, há um método nessa loucura. Quem o apontou foi o professor de Direito Geraldo Prado: Moro “sabia que mesmo o mais tolerante Ministro do STF não concordaria em aproveitar em processo algum uma interceptação telefônica ilícita”. Contava, então, que a revolta de grande parte da opinião pública constrangesse o tribunal a acolher esse tipo de prova, bem de acordo, aliás, com o que o Ministério Público Federal do Paraná propôs numa campanha iniciada em março do ano passado. A medida vinha disfarçada sob o eufemismo de “ajustes nas nulidades penais” e assim foi noticiada pela imprensa. O alerta para o significado da proposta partiu de uma fonte alternativa e especializada: o site Consultor Jurídico.

Prado anota que, como previsto, a divulgação das gravações foi feita “sem qualquer juízo crítico acerca da ilegalidade, centrando-se no tom das conversas e não na violação da intimidade”. Este também foi o comportamento do juiz Celso de Mello, decano do STF, ao contestar o desabafo de Lula, que, em outro telefonema, acusava a Suprema Corte de estar “totalmente acovardada”.

A decisão de Gilmar Mendes de sustar a nomeação de Lula, sob o argumento de que se tratava de uma manobra do governo para “blindar” o ex-Presidente contra um provável pedido de prisão preventiva a ser expedido por Moro, foi uma ironia da história, providencialmente assinalada pelo jornalista Janio de Freitas em seu artigo deste domingo (20/3): Mendes beneficiou-se do mesmo tipo de recurso quando era advogado-geral da União e o então Presidente Fernando Henrique Cardoso assinou medida provisória dando-lhe status de ministro, o que lhe garantia foro especial contra ações judiciais em primeira instância. Nesta mesma edição da Folha de S. Paulo, Bernardo Mello Franco dedica sua coluna ao controverso juiz, que “deveria se dizer suspeito por falta de isenção para julgar o assunto, muito menos sozinho”, já que discursara contra a nomeação de Lula em sessão anterior da Corte. Mas o que esperar de um magistrado cuja atuação lhe rendeu “o apelido de ‘líder da oposição’ no STF”?

Redação

8 Comentários

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  1. Moro e Gilmar: a vergonha do judiciário

    Autores de medidas importantes para o Brasil, os dois juízes agora se vêem fazendo lambanças estratosféricas. Embalados pela caçada ao PT e ao Lula, contando com a mídia parcial e mentirosa, Moro e Gilmar estão demonstrando o que não é ser brasileiro, honesto, cumpridor da lei. Gilmar julgou liminar elaborada por sua funcionária (?!) e não se fez de rogado e não se considerou suspeito. Gilmar dá espetáculos no Supremo e fora dele que denigrem em absoluto e sem retorno a imagem do STF. E é de uma agressividade e falta de classe. Pena não estar mais ali o único juiz que o punha no lugar, Joaquim Barbosa. Já Moro, ao que parece, acertando com a Globo sua candidatura para breve, ou colaborando com o PSDB em campanhas eleitorais (vide João Dória), está jogando sua história no lixo ao protagonizar o maior escândalo do Brasil: a condução coercitiva ilegal de Lula e a publicidade (para a Globo) dos grampos ilegais até com a presidente da República, além da ameaça clara de prender Lula, sem que ele seja réu e contra ele nada tenha sido provado. Vamos torcer para que soluções pacíficas sejam encontradas, apesar das medidas absurdas tomadas por esses juízes. A judicialização partidária da política.

  2. citação de hamlet é a síntese

    citação de hamlet é a síntese dessa crise-

    há um método infame, abominável,  nessa loucura..

    macbeth tb cortou cabeças e teve sua cabeça cortada no final…

    robespierre promoveu o terror e foi depois guilhotinado…

    deve haver outros exemplos e sucedaneos histórios…..

  3. E ……………….

    Ao ler ete artigo, sinto que o STF não passa de uma gaiola das loucas!!!!!

    É lamentável dizer, mas o Brasil, esta grande Nação, merecia melhor sorte !!!!!!!!!!!!!!!!

  4. Ah 2013…
    Com todo respeito

    Ah 2013…

    Com todo respeito aos tricolores, mas o tapetão do fluminense naquele ano já era um presságio do que estaria por vir.

  5. até quando?

    há quanto tempo acusa-se a necessidade premente de um expurgo completo no judiciário?

    o judiciário brasileiro tornou-se uma casta de nababos inúteis.

    servem para quê?

    envergonhar o país mundo afora ao desfilar sua arrogância proviciana e jeca em cenários igualmente fúteis; desfilar sua constrangedora ignorância sobre qualquer assunto que verse cultura ou arte; ruminar as línguas pátria e estrangeiras como se estivessem engolindo uma macarronada …

    não têm leitura; não têm cultura; não passam de uns jecas sustentados a peso de ouro.

    para quê?

    para trazer essa inaceitável insegurança político-social?

    que se expurguem todos!

    que sejam defenestrados a bem do serviço público.

    ….

    em tempo: novo código de processo civil

    no caso de suspeição de Gilmar Mendes no caso da liminar concedida contra a nomeação de Lula em ação patrocinada por advogada que é empregada na escola de sua propriedade:

    código de processo civil lei nº13105/15 em vigor desde sexta feira última, dia 18 de março quando o interessado ministro proferiu sua liminar suspeita:

    artigo 145 “há suspeição do juiz”

    inciso I “amigo intimo ou inimigo de qualquer das partes ou seus advogados”

    se isso não é caso de suspeição então o que seria?

  6. Golpe midiático-judicial

    O último capítulo do livro “A Tolice da Inteligência Brasileira”, Jessé Souza (2015), tem o sugestivo título “O golpismo de ontem e de hoje: considerações sobre o momento atual”. De uma forma bastante didática,  detalhadamente, o autor explica o papel desempenhado por agentes públicos no Golpe contra a Democracia que já estava em curso, antes mesmo do lançamento do livro. Lê-Se na página 260: “São os órgãos de controle como o TCU, MP e Polícia Federal, aliados aos “Juízes justiceiros”, incensados pela mídia conservadora como os novos “heróis do povo” (leia-se classe média conservadora), como os novos representantes da “vontade geral” (ou seja, os interesses econômicos do 1% mais rico); supostamente “acima da política”, que são os novos candidatos a incorporar o “poder moderador” da pseudo-democracia tutelada brasileira.Em outras palavras, setores da PF, do MPF e do Judiciário não promovem apenas desestabilização política, mas também – e principalmente -promovem ativamente o Golpe contra a Democracia. Ao divulgar, criminosamente, o grampo da conversa de Dilma com Lula, Moro escancarou para o mundo o envolvimento dele no Golpe midiático-judicial em curso no Brasil. O STF ainda tem tempo de sustar o Golpe e, assim, impedir que o Brasil entre em um conflito aberto de resultado imprevisível. Apenas uma alerta para os golpistas de hoje: 2016 não é 1964. Haverá resistência e ela não será pequena ou covarde!

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