Corregedoria do CNMP propõe remoção do promotor de São João da Boa Vista

Ali será a prova de fogo para comprovar se o CNMP terá condições ou não de criar freios à atuação de muitos MPs estaduais

Corregedor Geral Motauri Ciocchetti, promotor O`Really, PGJ

O Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP) está prestes a iniciar um processo imprescindível de regularização da atuação dos ministérios públicos estaduais. A correição aberta em São João da Boa Vista, para analisar a atuação do promotor Nelson O’Really, resultou em um relatório definitivo, no qual o corregedor-nacional Oswaldo D`Albuquerque recomenda a suspensão por 90 dias e a remoção da comarca de São João da Boa Vista.

Agora, o relatório irá para o pleno do CNMP que deliberará sobre as medidas a serem tomadas. Ali será a prova de fogo para comprovar se o CNMP terá condições ou não de criar freios à atuação de muitos MPs estaduais, e atuar como um poder regulador – impedindo futuras ações legislativas contra os abusos de muitos promotores, sob complacência dos órgãos reguladores.

O relatório não engloba todas as denúncias contra O’Really, pois muitas já prescreveram, mas é um relato dramático do nível de crueldade a que chega uma pessoa quando dotada de poder absoluto. E o poder de O’Really lhe foi conferido pela completa  inação da corregedoria do MPE-SP.  

Com tal liberdade de ação, perseguiu pessoas, levando algumas a mudar de cidade. Não parou aí. Em pelo menos dois casos foi até a nova cidade das vítimas, tentando atrapalhar seus empregos ou comprometendo-os perante a vizinhança.

O inquérito não chega a esses detalhes. Não aborda, por exemplo, a falta de atuação do promotor em contratos de lixo, sem licitação, feitos pela Prefeitura, em negócios em que havia interesse direto de sua esposa, como fornecedora de insumos.

Mas é definitivo em relação às denúncias apresentadas:

Denúncia 1 – militância nas redes sociais.

O`Really mantinha um perfil no Facebook, no qual se identificava como Membro do Ministério Público de São Paulo e divulgava publicações favoráveis a novo golpe militar, ataques às uirnas eletrônicas, defesa de remédios ineficazes contra o Covid-19 e ataques contra Ministros do Supremo Tribunal Federal.

Fazia parte de um grupo de Facebook denominado de Tenente Torres. Nele, OReally publicou mensagens atacando os Ministros do Supremo Tribunal Federal e estimulando o golpe militar.

Diz o parágrafo 65 do relatório:

“A referida declaração do Promotor de Justiça Nelson de Barros O’Reilly Filho, feita em grupo da rede social Facebook, foi replicada em grupo da rede social Whatsapp, o que denota uma suposta postura ativa do Membro, com viés de defesa do seu posicionamento político-ideológico”.

Em outra mensagem, coloca um vídeo do Ministro Gilmar Mendes com a legenda “Estado governado por ladrões”).

O relatório levanta um número infindável de mensagens de O´Really, com militância explícita, ataques difamatórios contra adversários.

“Destarte, tendo rompido as raias do direito de livre expressão e de crítica, depreciando a imagem do Tribunal Superior Eleitoral e de seu Presidente, bem como do Supremo Tribunal Federal e de seus Ministros, o Promotor de Justiça adentrou na seara disciplinar, não lhe socorrendo, também, a alegação de que agiu conforme sua liberdade de expressão”.

A conclusão do relatório sobre a priomeira denúncia é clara:

“De tudo quanto asseverado, conclui-se haver indícios suficientes de materialidade e autoria de faltas disciplinares, imputáveis ao Promotor de Justiça Nelson de Barros O’Reily Filho, nos termos previstos no artigo 173, incisos Ie VI, da Lei Complementar Estadual n° 734/93, consistentes, respectivamente, em violação dos deveres funcionais previstos no artigo 169, incisos Ie,Il eartigo 170, inciso V, da referida Lei Complementar; no artigo 43, inciso Ie,I eartigo 44, inciso V, da Lei .n8.625/93”.

Denúncia 2 – vereadora que incitava bloqueios de estrada

No parágrafo 108, diz o relatório:

“Segundo consta da Reclamação Disciplinar .n 1.01316/2022-03, no dia 31 de outubro de 2022, circulou em grupos de whatsapp e em redes sociais um áudio com a voz da Vereadora do Município de Águas da Prata/SP, Maria Cristina dos Santos Lerosa, tida como apoiadora do candidato à reeleição, Jair Messias Bolsonaro, no qual está demonstra participação e gerência direta na organização de paralisação de estradas naquele município e região por parte de caminheiros, orientando sobre logística e suporte para o movimento antidemocrático de paralisação de estradas motivado pela não aceitação dos resultados das eleições presidenciais do ano de 2022”.

No áudio anexado ao inquérito, a vereadora”solicita que o referido áudio com suas orientações seja espalhado da melhor forma possível, para conhecimento de todos os que vierem a ouvi-lo, ficassem cientes de suas recomendações”.

Em um dos trechos, a vereador Cristina Lerosa diz:

“Everton, eles resolveram fazer ál na Soufer porque fecha aVargem também, então eál tem um, é, tem uma forma melhor de…a logística prá banho prá banheiro, pros caminhoneiros e servir a alimentação é melhor então, passa prá todo mundo isso aí, tá, prá todo mundo que você conhece, os grupos que vai fechar direto na estrada lá na frente da Soufer”.

Foram anexados, arquivos de áudio e de fotografia de estradas com pneus queimando como forma de bloqueio das vias de trânsito, na estyrada de São João a Aguai no Distrito Industrial de São João da Boa Vista.

A reação de O`Really foi de uma prevaricação exemplar:

“Exarou Despacho na Notícia de Fato n° 38.0430.0001224/2022-2, oportunidade na qual declarou que, no âmbito de suas atribuições, não vislumbrava que a Vereadora Marai Cristina dos Santos Lerosa, teria tido qualquer interferência na organização das manifestações e, ainda, consignou que o áudio estaria fora de contexto enão levava aqualquer conclusão incriminadora, determinando, na sequência, o encaminhamento da referida Notícia de Fato aos demais Promotores de Justiça me atuação na comarca ainda que despidos de atribuições para a apreciação dos fatos”.

Durante curto espaço der tempo O` Really assumiu funções de promotor eleitoral junto à 122a Zona, apenas o suficiente para arquivar o inquérito contra a vereadora.

As ligações entre O `Really e a vereadora estão documentadas em várias fotos e no fato de ambos compartilharem a mesma advogada, Jéssica Palhares Aversa, advogada pessoal e pessoa íntima do promotor.

Conclui o corregedor do CNMPOO:

“Além disso, tendo em vista o enorme número de manifestações em rede social que podem refletir em comportamento com viés político-ideológico do Promotor de Justiça Nelson de Barros O’Reily Filho, aliado ao arquivamento prematura e sem a mínima diligência instrutória da Notícia de Fato n. 38.0430.0001224/2022-2, conclui-se que pode ser havido a violação ao dever legal do Membro se declarar impedido ou suspeito, nos termos previstos no artigo 173, incisos I e VI, por violação ao dever previsto no artigo 169, inciso VI, e artigo 170, inciso V, todos da Lei Complementar Estadual .n 734/93”.

Denúncia 3 – a perseguição movida contra o advogado Maurício Betito Neto

O MPE entrou com uma ação contra o advogado Maurício Betito, tendo OReally como vítima de calúnia, injúria e difamação. A partir daí, OReally teria que se declarar impedido em qualquer processo envolvendo Betito. Mesmo assim, atuou em vários deles, sempre com decisões contrárias ao adversário.

Conclui o inquérito:

“Asim, uma vez presentes indícios suficientes de materialidade e autoria de infração disciplinar praticadas pelo Promotor de Justiça Nelson de Baros OR’ eily Filho, resta necessária a instauração ed Proceso Administrativo Disciplinar (artigo 7, inciso VI, e§2°23, od Regimento Interno do CNMP), para a apuração mais aprofundada das supostas faltas funcionais previstas on artigo 173, incisos /eV,I eartigo 169, incisos lI eV,I da Lei Complementar Estadual .n 734/93, asim como artigo 43, incisos lI eVI, ad Lei 8.625/93 (Lei Orgânica Nacional do Ministério Público)”.

Denúncia 4 – perseguição ao ex-vereador Fernando Bonaretti Betti

Por ocasião da votação de uma Lei dos Bares, O`Really atuou pressionando vereadores municipais para aprovar a lei.  Para tanto, valeu-se do Conselho Municipal de Segurança (CONSEG), do qual participava como representante do MPE.

O`Really invadia reuniões administrativas, privativas dos vereadores. alegando que não poderia ser impedido, por ser membro do MPE, “chegando-se ao extremo de ameaçar determinados Edis que, caso votassem contrariamente à referida minuta do Projeto de Lei de Bares, como estava, poderiam investigação ou processo por ato de improbidade administrativa”.

Nesse trabalho, telefonou para o vereador Fernando Betti ameaçando-o. Betti gravou a conversa e registrou a Ocorrência Policial. Tempos depois, apareceu um suposto Termo de Retratação da Representação, apócrifo, mas que continha o nome do vereador Betti.

Betti sustentou que jamais havia assinado tal Termo e representou o Promotor junto à Procuradoria-Geral da Justiça e a Corregedoria-Geral do MPE paulista. Conseguiu apenas um processo por calúnia e difamação, tendo como provas  as representações que ele apresentou à PGJ e à corregedoria-geral do MPSP.

Em sua defesa, O`Really admitiu a ligação. Apenas negou que houvesse feito ameaças.

Depois disso, Betti foi alvo de uma enxurrada de investigações extrajudiciais. O`Really abriu inquérito acusando-o de ter recebido bolsa de estudo da Faculdade municipal; de ter viajado com recursos da Câmara; de ter conseguido tratamento de saúde para um munícipe.

Conclui o relatório:

“Destarte, uma vez presentes indícios suficientes de materialidade e autoria de infração disciplinar por parte do Promotor de Justiça Nelson de Barros O’Reilly Filho, resta imprescindivel a instauração de Processo Administrativo Disciplinar (artigo 77, inciso IV, e § 2°27, do Regimento Interno do CNMP,) para apuração mais aprofundada das supostas faltas funcionais previstas on artigo 173, incisos leV,I artigo 169, incisos,II eV,I da Lei Complementar Estadual .n 734/93, assim como artigo 43, incisos lIeVI, da Lei 8.625/93 (Lei Orgânica Nacional do Ministério Público28).”

Denúncia 5 – interferência na votação da nova Lei do Zoneamento

Todos os vereadores foram pressionados pelos promotores O`Really e Ernani de Menezes Vilhena Junior para que votassem pela redução do perímetro urbano da cidade.  Houve uma Portaria instaurativa do Procedimento Administrativo, ameaçando vereadores que votassem contrariamente do projeto.

Segundo depoimento do presidente da Câmara, todo o movimento do promotor foi para deixar de fora do perímetro urbano terras que pertenciam a um adversário político. 

Diz o relatório:

“Seu interesse, claramente observado nas postagens de Facebook, era a redução do perímetro urbano de São João da Boa Vista, o que inviabilizaria ou dificultaria a aprovação de novos loteamentos, sobretudo aqueles para acesso e aquisição de pessoas com baixa renda”.

Conclui o relatório:

“Em conclusão: observa-se aatuação do Promotor de Justiça Nelson de Barros O’Reily Filho na defesa pública, por meio de rede social (Facebook), de tema que seria deliberado e votado pela Câmara Municipal de São João da Boa Vista/SP, paralela à atuação oficial e formal do Promotor de Justiça Ernani de Menezes Vilhena Júnior, detentor da atribuição de defesa do Patrimônio Público e Social na comarca, mediante a instauração e instrução do já mencionado Procedimento Administrativo n° 62.0430.0000492/2019-9, na 4a Promotoria de Justiça”.

As conclusões do inquérito

A partir desses levantamentos, o corregedor do CNMP instaurou procedimento regimental para remoção por interesse público.

“Nos termos do artigo 138 da Lei Complementar Estadual .n 734/93, a” remoção compulsória somente poderá ser efetuada com fundamento no interesse público e será iniciada por representação do Procurador-Geral de Justiça ou do Corregedor-Geral do Ministério Público, cabendo a sua instrução a Comisão Processante Permanente, observados os princípios do contraditório e da ampla defesa, que encaminhará relatório conclusivo para deliberação do Conselho Superior do Ministério Público, na forma do seu Regimento Interno”.

“Ante o exposto, diante da presença e indícios suficientes de materialidade eautoria das infrações disciplinares previstas on artigo 170, inciso V, artigo 173, incisos | e V,I e artigo 169, incisos ,1lI e VI, da Lei Complementar Estadual .n 734/9332 (Lei Orgânica do Ministério Público de São Paulo), assim como artigo 43, incisos ,I lI e VI, e artigo 44, inciso V, da Lei n. 8.625/93 (Lei Orgânica Nacional do Ministério Público 33), determino a INSTAURAÇÃO ED PROCESSO ADMINISTRATIVO DISCIPLINAR (artigo 7, inciso IV, e § 2°34, do Regimento Interno do CNMP) em face do Promotor de Justiça NELSON DE BARROS O’REILLY FILHO, a fim de que, ao final, lhe seja aplicada a pena de suspensão, por 90 (noventa) dias, prevista do artigo 237, inciso I, e artigo 242, inciso I(segunda parte), do diploma normativo estadual.

219. Outrossim, a fim de restabelecer a normalidade institucional na Comarca de São João da Boa Vista/SP, proponho ao Plenário, sem prejuízo da deflagração do Processo Administrativo Disciplinar, a instauração de Procedimento de Remoção por Interesse Público do Promotor de Justiça Nelson de Barros O’Reilly Filho, nos termos do artigo 138 da Lei Complementar Estadual n. 734/93 e artigo 142 do Regimento Interno do CNMP.

Agora, o caso será apreciado pelo pleno do CNMP em fevereiro.

Dado o histórico de violência e crueldade do promotor, a remoção apenas mudará o ambiente em que ele atua. Sâo João da Boa Vista amanhecerá aliviada, mas a cidade que o receber viverá um ambiente de opressão permanente.

DECISAO-CNMP

Luis Nassif

2 Comentários

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  1. Transferência é prêmio. Esse nóia tem que ser condenado a reparar pessoal e monetariamente todos os danos morais que causou. Caso contrário ele continuará cometendo abusos.

  2. Importante que o CNMP possa corrigir a falta de atuação da corregedoria do MP Paulista. Quem trabalha no sistema de justiça não se surpreende com a atuação do promotor ou da corregedoria paulista.

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