FHC e grande mídia: relações perigosas

Patricia Faermann
Jornalista, pós-graduada em Estudos Internacionais pela Universidade do Chile, repórter de Política, Justiça e América Latina do GGN há 10 anos.
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Jornal GGN – Registrados em um gravador relatos cotidianos das experiências que vivia entre 1995 e 2002, na cadeira do Palácio do Planalto, o então presidente Fernando Henrique Cardoso narrou bastidores da sua agenda. Em um dos episódios, publicados em “Diários da Presidência” (Companhia das Letras), FHC conta a sua estrita relação com as Organizações Globo, por meio de Ali Kamel e de Roberto Marinho, e também de Otávio Frias Filho, que controla o grupo Folha.
 
Em 1995, durante o processo de escolha de um alto funcionário que ocuparia o Ministério das Comunicações, o FHC presidente solicitou a opinião de Marinho para acertar o nome. O dono da rede de televisão foi chamado a indicar três pessoas para o cargo de secretário-executivo da pasta. Roberto Marinho encaminhou a FHC a lista de possibilidades, antes que o presidente deixasse a decisão final, dentre as opções do dirigente da Globo, a Sérgio Motta, um dos fundadores do PSDB e então ministro das Comunicações.
 
O trecho é uma das quase 4 mil páginas transcritas pela antropóloga Danielle Ardaillon, curadora do acervo do Instituto Fernando Henrique Cardoso, responsável por passar ao papel os áudios diários gravados por FHC. O livro “Diários da Presidência” é o resultado da primeira parte desse material, que compreende os anos de 1995 a 1996, lançado pela Companhia das Letras. Somente para esse primeiro livro, foram 44 fitas cassete decupadas, em um total de cerca de 90 horas. A editora pretende publicar outros três volumes até 2017, com os registros dos quatro anos.
 
A redação que trata especificamente desse envolvimento de FHC com Marinho foi assim publicada: “Eu próprio [FHC], depois de ter pedido uma informação ao Roberto Irineu Marinho a respeito de três pessoas competentes da área, pedi ao [ministro] Eduardo Jorge que as entrevistasse. Passei os nomes ao Sérgio Motta [1940-98]. O secretário-executivo escolhido pelo Sérgio [Renato Guerreiro] é um desses três”.
 
Conforme menciona o texto, o resultado foi a indicação de Sérgio Renato Guerreiro para o cargo de secretário-executivo, como um nome das Organizações Globo dentro do setor de Comunicações do governo federal. 
 
A citação foi publicada pela Folha de S. Paulo, que recebeu um dia depois uma nota de resposta de Roberto Marinho. O presidente do Grupo disse que “não é verdade” que “a Globo influenciou a escolha de nomes no Ministério das Comunicações”.
 
Na nota, o executivo justifica que a empresa disse, na época, à FHC que “o ministro é seu [do presidente]”, e completa com outros trechos do livro, nos quais evidencia que, apesar de uma tentativa de isentar a indicação do grupo Globo, Fernando Henrique menciona que Marinho tinha o “desejo” de “uma limpeza na área [da opinião pública]”.
 
“Nos registros feitos entre 30 de janeiro e 5 de fevereiro de 1995, disse Fernando Henrique em relação ao ministério: ‘É preciso mudar os métodos de administração, acabar com o nepotismo e, sobretudo, com a falta de critérios objetivos na distribuição dos canais. Eu já tinha conversado muito com o Sérgio sobre esse assunto e ele está levando isso adiante, com o apoio, hoje, de setores crescentes da opinião pública e – devo deixar aqui um depoimento – do Sistema Globo, que não tem reivindicação nenhuma na matéria. Pelo contrário, o seu desejo é que haja uma limpeza na área'”, afirmou Marinho à Folha.
 
No ano seguinte, em 1996, FHC fez críticas a quem estava comandando o grupo Globo e faz referências a Merval Pereira e Ali Kamel como “bastante amigos meus”. 
 
“O sistema Globo está muito difícil, porque tanto o Roberto Irineu quanto o João Roberto [filhos de Roberto Marinho] estão hoje mais voltados para o conjunto do grupo, estão fazendo os negócios necessários ao sistema, sem estarem à frente nem da televisão nem do jornal. E por mais que sejam nossos amigos os que estão lá hoje, e são até bastante amigos meus, Merval [Pereira, do Conselho Editorial do Grupo Globo], Ali Kamel, não há quem controle as coisas, porque estão naquela linha.”
 
A reportagem do jornal paulista informa que “a própria montagem do governo foi feita ouvindo as Organizações Globo”, apesar de as publicações do livro serem relatos “sucintos” sobre as “menções às conversas com Roberto Marinho e com Jorge Serpa, advogado ligado a Marinho”.
 
O próprio diretor de Redação da Folha, Otavio Frias Filho, também é indicado nas gravações de FHC por suas relações com o ex-presidente. Frias teria justificado um dia a Fernando Henrique Cardoso o motivo de os grandes veículos de comunicação estarem contra ele nas publicações. “O Otavinho definiu como papel da imprensa ‘ser contra’. Disse que agora, no meu governo, é mais difícil, ele nota a imprensa com muito entusiasmo pelo governo, tem que achar uma maneira de ser contra”, teria justificado o diretor da Folha.
 
Patricia Faermann

Jornalista, pós-graduada em Estudos Internacionais pela Universidade do Chile, repórter de Política, Justiça e América Latina do GGN há 10 anos.

13 Comentários

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  1. Nunca tive dúvidas

    Nunca tive dúvidas sobre um dos maiores motivos pelo ódio da mídia ao PT/Lula: eles não mandam no governo como mandavam. O governo era um extensão dos seus negócios, extensão que foi literalmente amputada em 2002.

    Não se conformam.

     

  2. Fingimento.

    Fingia ser contra; a folha fingia ser contra.

    E hoje é a que mais está demorando a engrossar com o Cunha pra ele “completar o serviço”.

    Tá havendo um desentendimento sério na casa grande…

    E o Dornelles, cadê ele?

     

  3. Sobre a parcialidade da globo
    Sobre a parcialidade da globo com relação ao FHC, acho que sempre vale a pena rever essa peça feita em 1995, uma retrospectiva do primeiro ano do governo FH na voz do Pedro Bial. Dá muita vergonha alheia, nem como propaganda partidária do PSDB colaria:

    https://youtu.be/-pCgO71lVnk

  4. Já não são mais relações

    Já não são mais relações perigosas.

    Estas são relações criminosas.

    E ficarão impunes, como quase todos os crimes cometidos pela elite senhorial brasileira. 

  5. Em nome do Brasil,da sua

    Em nome do Brasil,da sua democracia e de seu povo,acatem o que este senhor certa vez disse: “Esqueçam tudo que escrevi”.

    1. Mas há crimes insepultos no ar.
      Na verdade temos que lê-lo, infelizmente. Ali esta a explicação desta desastrsa e bandida atuação do pig. O naco que perderam, perdendo o psdb no governo. Ali esta escancarada a corrupção protegida e incentivada.
      O pig perdeu muito e não esquece o que tinha com eles no poder.
      Muito do pior do país se explica ali. O ódio do pig ao pt é enorme($$$$).
      E lembrar que tem ingênuos achando que pode e deve ter o pig ao seu lado na ” luta contra o crime”. Éra só ler o fhc, e tudo está ali.
      Que desgraça!

  6. Se fosse o Lula?

    O nebuloso episódio do suposto filho de FHC com repórter da Globo, devidamente escanteada para a Espanha, ainda necessita ser esclarecido.

    O quanto a Rede Globo e os Marinho tinham FHC em suas mãos?

    Por muito menos que isso, Renan Calheiros foi apedrejado. Merecidamente, diga-se.

    Imaginem, agora, algo parecido entre Lula e a Odebrecht?

     

  7. Nada perigosa
    O fhc e o psdb sentaram gostosamebte no colo do pig. Esta é a desgraça do pais. E da justiça.
    Agora mesmo que o fhc se denuncia qunto a corrupção contra a petrobras ele será vexatoriamente protegido pelo pig e demais mervais. E olhe que há razão para se deduzir que o paulo francis morreu por omissão do fhc que sabia ter ele razão na denuncia de corrupção e ficou criminosamente calado. O caso da amante onde ele se entregou a diretores da globo que o enganaram dizendo que o filho era dele e o tiveram sob dominio, é outro.
    Mas ele se entregou gostosamente ao criminoso pig. Ele até gostou.
    E o moro vai lá ter uma aula de como se deixa uma estaral ser corrompida? Se não o fizer se revela.

  8. Quem é FHC

     

    É impressionante a fixação que a esquerda tem com FHC, que alias é de esquerda também…

    O cara já deixou a presidencia a quase 15 anos. Ninguém deveria estar lembrando dele hoje em dia.

    Quanto mais se fala, mais se coloca o sujeito na mídia, mais sua voz tem peso e mais ele lucra.

    Vale a velha máxima: falem bem ou falem mal, más falem de mim.

     

    Gostaria de ler artigos sobre aquilo que esperamos para essas relações no futuro, pois não creio que Lula e Dilma tenham feito nada diferente de FHC. Estamos empacaddos.

    1. Se ele ficasse quieto, tudo bem…

      … mas ele se exibe que nem pavão!

      O cara trabalha dia e noite pelo impeachment da presidenta atual, pede pra ela renunciar e escreve um livro com esse tipo de coisa que nos afeta até hoje!

      Como é que vamos esquecê-lo se ele se joga na nossa cara o tempo todo?

  9. Relação perigosas e sem

    Relação perigosas e sem camisinha, e sem pílula anticoncepcional também. Por essas e outras razões são de uma unica e mesma família, a qual a maioria do povo brasileiro não pertence

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