O violonista centauro

Não é a primeira vez que escrevo isso, mas o violonista Fábio Zanon é, de longe, o melhor crítico musical brasileiro.

Não apenas pelo domínio do violão – já foi considerado um dos cinco melhores violonistas clássicos do mundo -, mas pelo conhecimento da psicologia do instrumentista, da história da música, do embricamento da cultura popular e erudita.

O especial que gravou sobre Yamandu Costa (clique aqui para baixar o podcast) é o que de mais completo apareceu até agora sobre o maior instrumentista brasileiro da atualidade, situando seus vícios, suas virtudes e a síntese: é um gênio.

O programa é recheado de casos testemunhados pelo próprio Zanon. Como na apresentação dele e do Yamandu em que, a cada ensaio, o gaúcho improvisava uma forma diferente de acompanhamento. Zanon conta que até o tom do telefone de Yamandu era tema para novos sons tirados por ele nos camarins.

No dia da apresentação, no entanto, Yamandu exorbitou. Zanon estava se perdendo com a sucessão de inversões e de harmonias novas testadas por Yamandu. Olhou para ele e percebeu que a corda do meio do violão tinha arrebentado. Yamandu continuou mandando bala. Quando terminou a apresentação, com Zanon suando frio, o gênio explicou: “Não dá para parar porque esfria”.

Luis Nassif

12 Comentários

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  1. Luis , já vi esse violonista
    Luis , já vi esse violonista tocando, muito bom,apesar de me parecer muito novo ainda e ter cara de bebê;uma duvida minha,lá em cima , no inicio do blog , na faixa amarela me parece vc segurando um “mouse” em cima da parte da frente de um cavaquinho,é isso mesmo ou foi só impressão minha,abraços

    Não, é um desses pratos para mouse.

  2. Nassif, você soube do
    Nassif, você soube do lançamento pela Biscoito Fino de uma série de livros bilíngues sobre choro? Livros de partituras para iniciados. Chama-se Choro 100 Play Along Choro. Acompanha disco gravado pelo grupo Nó em Pingo D´Água. Os dois primeiros livros (violão por Rogerio Souza e pandeiro por Celsinho Silva) já estão à venda. Em abril, sopro e baixo, e em julho, bandolim e cavaquinho.

    (…)
    ” a gravadora Biscoito Fino resolveu investir no segmento de partituras. O primeiro lançamento contempla os estudantes de música e admiradores de um dos gêneros mais ricos e populares do País, o choro. O projeto, que conta com métodos de ensino dos instrumentos, demorou quatro anos para ser finalizado, e chega às livrarias com o nome de Choro 100 – Play Along Choro. Isso mesmo, a coleção é bilíngue, em português e inglês, para apresentar aos estrangeiros de forma profunda a história do estilo brasileiro nascido no fim do século 19 com a flauta de Joaquim Callado. Ao todo, serão seis volumes, com prefácio de Hermínio Bello de Carvalho”

    cotinua aqui (http://docs.google.com/Doc?id=dg3nxkgv_2c66szxd9)

  3. Muita gente critica o
    Muita gente critica o Yamandu, dizendo que ele tira som sujo do violão. Vai tocar que nem ele, então!

    Agora, cá entre nós, considero, sim, Yamandu um craque, mas acho que o Brasil é tão rico de craques no violão que ele até perde posição. Aliás, até a posição de centro-avante da seleção brasileira é menos concorrida que a de craque nacional do violão…

  4. palomino,

    Vc conhece aquela
    palomino,

    Vc conhece aquela d “Qtos violonistas são necessários pra trocar uma Lâmpada? …No mínimo uns 10; 1 pra trocar e outros 9 pra ficar embaixo discutindo como farIAM melhor Ou pq a troca não está sendo executada do jeito ‘certo’ “

  5. Exatamente. Não há consensos
    Exatamente. Não há consensos em torno da superioridade técnica ou talento natural de violonistas. E nem deve haver, já que comparar estilos e singularidades destaca defeitos e relega a segundo plano as virtudes. Dentro do patamar óbvio, deve-se buscar a essência anímica do instrumentista, a leitura que ele busca das obras que executa. Não se pode, por exemplo, confundir virtuosismo ( no sentido de ” velocidade”, utilizado em relação ao violão) com excelência violonística, muito embora seja belo apreciar a superação técnica de um músico. A exploração do violão se dá de formas múltiplas, encontrando-se mestres em cada estilo. Como comparar a qualidade clássica com a popular, por exemplo? Cada escola deve ser analisada em si. Tenho como grande ídolo Baden, mas como deixar de reconhecer a genialidade inconteste de Raphael Rabello, Yamandu Costa, Paulo Bellinatti, Dino 7 cordas e diversos outros? Como comparar Yamandu com João Gilberto, quando cada um faz uma utilização totalmente diversa do instrumento e ninguém, em sã consciência dirá que João Gilberto não é um gênio do violão? O importante é a variedade, e saber que ( claro que é só minha opinião) temos a música mais rica do planeta, manancial a ser desfrutado por estudiosos e profissionais de todos os continentes.

  6. Adoro Yamandu Costa. Mas para
    Adoro Yamandu Costa. Mas para mim, o melhor instrumentista do Brasil chama-se Kiko Loureiro. Seus álbuns solos e suas contribuições na banda Angra são impecáveis.

    Cadê os links?

  7. Nassif,
    Estou ouvindo o
    Nassif,
    Estou ouvindo o podcast do Zanon. Concordo em parte com os comentários. Na verdade, em relação aos comentários críticos, só concordo com um. Com aqueles que ressaltam as virtudes, evidentemente que concordo com todos. Os outros, aceito que tenham fundamento, mas eu não os faria. Certamente, Zanon tem autoridade para fazê-los. É um grande violonista, sabe tudo e mais um pouco. Porém, em alguns aspectos, ele está engrossando o clube daqueles que admitem Yamandu como um dos maiores violonistas brasileiros, mas pensam que podem moldá-lo, influenciá-lo para que se torne maior ainda. Não conheço Yamandu pessoalmente, mas acho que mesmo que ele aceite a tonelada de “críticas construtivas”, elas são, ou em algum momento podem ter sido, um grande fardo. Será que o modelo dos críticos é o mesmo que ele almeja atingir? Ou, sendo o mesmo, o caminho que apontam é o que pretende trilhar?
    Violão, bem como qualquer instrumento, é uma daquelas coisas que, para se relacionar bem, é preciso sossego. Sou capaz de apostar que ele sentiu o talento quando estava sossegado, sem qualquer lembrança de vozes no ouvido. Brincando em paz, sem olhos ansiosos sobre ele e podendo estudar do jeito que quisesse. Depois de aparecer ao público, fato que ele pode ter penado para conseguir, pode ter vindo os “varas” e “batutas”: Melhora aqui, faz assim, assado, muda isso, aquilo, não tá bom desse feito, faça desse, tem muito que melhorar aqui, e ali, assim não vai longe, etc. Até no modo como ele abraça o violão, os cabras devem ter se metido. Vou para por aqui. Ainda teria muito a dizer, mas posso estar sendo injusto com Zanon. Ele menciona mais de uma vez as críticas que Yamandu recebe, porém não toma partido nelas. Mas, ressoa…E isso todos fazem.
    Pelo menos, Yamandu pode tocar na casa dele, sossegado. Sem ninguém para incomodar.
    Gosto muito de música, principalmente das grandes composições e dos músicos que tocam de modo a superar a técnica, cujo domínio têm em completude; os grandes violonistas clássicos, por exemplo. Ou dos improvisadores, que têm o mesmo domínio completo e que, no improviso, são capazes de descobrir um caminho inusitado, que mantenha a grandeza da composição de forma a reinventá-la naquilo que ela poderia propor ou, inclusive, sutilmente despertando a emoção oculta do compositor e dele, ou dele somente, no momento da execução. Ou daqueles que sabem brincar com os cérebros dos ouvintes, sobrepondo o inesperado diante do que seria o inusitado pautado. Ou seja, o que toca o inesperado pela tangente oculta do não aparente. A música popular brasileira me toca profundamente. E não porque sou brasileiro, pela qualidade mesmo. É um mundo grandioso e inexplorado. No que se refere à letra mas, sobretudo, à melodia, ou à melodia na letra. Às vezes, acho que poucos compreendem isso. E não estou deixando a modéstia de lado ao afirmar isso. É porque gosto muito mesmo e aprendi a confrontar. Os ritmos brasileiros, a maioria desconhecidos, são um capítulo especial. É a mais perfeita síntese do grande caleidoscópio dos ritmos mundiais. Não estou negando valor à música de outros países. A dos EUA, do Caribe, a de Cuba. Muito menos, aos estilos musicais. É que aqui, me parece, caíram partes importantes de todas e, unidas com outras desconhecidas, jungidas com a marcação da energia do clima, das terras, das florestas, dos ares, fez surgir um molho especial em que tudo é possível, nuances de sons, cores de sons e cheiros de sons – se é que me entendem. Aqui não há, pois são recriados, DNAs daquelas músicas. Acho que os músicos sabem o que estou querendo dizer. Por exemplo, uma vez ouvi Hermeto Paschoal dizendo que o sonho dele era colocar todos os animais do Brasil numa praça e tocar pra eles. Ele tem esse sonho porque conhece os sons dos animais, sempre prestou muita atenção neles. Ele deseja reviver o momento em que ouvia os sons desses animais. Hermeto gosta muito de sons de animais. Gosta de todos os sons, mas, quando revelou esse sonho, ele pensou especificamente nos animais. Pouco antes de dizer isso, ele falava da atração dos sons, coisa que sempre sentiu. Ele sabe a origem de todos os sons. Conhece todos os molhos, todas as misturas. Portanto, como ele também tinha falado sobre a infância, e os animais também povoaram a infância deles, e como o molho dele é completo, há, naquele sonho, tudo o que está oculto no molho. Todos os ingredientes trazidos pelos sons, que se ouvirão em suas imagens, suas cores e seus cheiros. Mas, agora a atenção deve ser redobrada: Tudo o que Hermeto pretende vem através do som, de cacos de sons, de poeira de sons, de luzes de sons, da temperatura dos sons, do ritmo dos sons, enquanto tempo dos quadros dos sons, da posição dos sons, do local dos sons, do passado dos sons. E são sons que povoaram a mente de Hermeto, sons que trazem tudo e todos que povoaram Hermeto, a história dele, o sentir dele diante dessa história, aqui, no Brasil, no passado do Brasil. A terra, a água, a floresta, o ar, o mar, os animais e os sons disso tudo. E Hermeto quer despertar os animais, despertando concomitantemente todas as raças de animais e de homens, para que componham uma só sinfonia. E Hermeto foi povoado por tudo isso e sabe disso tudo. Conhece o som dos passos de todos os animais e de todos os homens. Ele presta muita atenção nos sons. Sabe diferenciá-los, sabe de quem ou quê é esse barulho/som do som/barulho do som. Sabe o como ele chegou até ele, esse som. O ouvido de Hermeto é concha certa do ouvido de todos os sons. Não brinquem, ou brincando, e devem realmente brincar, saibam que a roda de sons de Hermeto gira na captação de todos os sons brasileiros, que são os sons compostos por todos os sons que aqui caíram. Porque, para quem não sabe, o som não vem, ele cai. Assim como a onda chega tapando a casinha dos caranguejos, caindo nela, o som vem tapando o ouvido dos que tem orelhas. Hermeto quer que a água do som lave os ouvidos dos ouvintes, faça com que eles ouçam o que não estão acostumados e jamais ouviram.

  8. Longe. Muito longe de ser um
    Longe. Muito longe de ser um gênio. Gênio eram Baden e Raphael. O problema do Yamandú não é a sujeira. Isso chatice de puristas. Baden e Raphael também eram muito sujos. O problema do Yamandú é que ele não sabe improvisar. Observem o improviso do Baden em “Deixa” ou “Apelo”. Observem o improviso do Raphael em “Garota de Ipanema”. Mas para não ficar falando apenas destes dois gênios mortos. Podemos citar simples mortais como Marco Pereira ou Romero Lubambo que improvisam muito melhor que o Yamandú. Então, vamos devagar em tentar transformar esse sujeito num gênio. Essa história de imitar som de telefone e tocar sem corda é para espetáculo de fogos de fim de ano em Copacabana. Violão é muito mais que isso.

  9. Caro Nassif

    Fuit
    Caro Nassif

    Fuit surpreendido hoje de manhã pela noticia de que a tradicional gravadora independente carioca Kuarup, especializada em música instrumental brasileira de qualidade, decidiu fechar as portas e retirar-se do negócio neste início de 2009, justificando sua decisão de jogar a toalha por causa das progressivas agruras que o mercado fonográfico vem enfrentando desde que o download ficou popular. Confesso que me deu um certo desespero ao saber da notícia e gostaria de perguntar-lhe: sobrou mais alguém da mesma estatura no ramo? Ficarei grato se puder responder e/ou comentar.

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