Aquiles Rique Reis
Músico, integrante do grupo MPB4, dublador e crítico de música.
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Um CD de Lucina!, por Aquiles Rique Reis

Um CD de Lucina!

por Aquiles Rique Reis

Meu Deus, que tanta beleza é essa? Que voz? Que violão? E os agudos? E os graves? Meu Deus! Diante de tamanho encanto, o que resta? Ouvir? Calar?

Posto frente a frente com uma sabedoria que desconheço, meu Deus, o que me resta? Chorar? Sorrir? Sentir vontade de aplaudir, em meio ao silêncio da sala à meia luz? Ou sentir-me sem fôlego para seguir a vida – que, em momento como esse, tende a sentir-se sem valor. Desisto? Ou fecho os olhos e vou? Pro porão? Pro salão? Pra onde, então?

Respiro fundo e vou! Tenho em mãos o CD independente Canto de Árvore. Como uma boia de salvação, agarro-me a ele. Na maré eu vou, na maré eu volto. E esperneio, afundo e submerjo. Abro os olhos, vejo e deixo-me saber. Sinto-me impelido por uma grande formosura.

Confuso, ou seria hipnotizado?, deixo-me levar pela voz de Lucina… Sim, Lucina! Os sentidos se abrem, e a beleza desponta nua, crua, bela, sensorial. A cada uma das onze faixas do CD, vem a certeza de que os versos podem ser pegos com a mão, ou serem vistos como “preces” pagãs.

Cada música é como o capítulo de uma vida que coube a alguém merecer vivê-la – Lucina! No momento de gravar o seu amor, veio-lhe uma comovente carta a Lhuli, “O Que Ficou”: “(…) Vamos ganhar o mundo com o que ficou de ser louco (…) Tudo foi tanto/ Muito/ E ainda é pouco (…)”.

Nas outras canções, lá estão inteiras as merecidas loas à vida, tecidas por poetas parceiros: Zé Renato Fressato, ArrudA, Inês Blanchart, Joãozinho Gomes, Aloísio Brandão, AlziraE, Paulinho Mendonça, Iso Fischer, Paulo Bastos.

Músicas vestidas com pouca roupa, sem ostentações ou penduricalhos. Tudo inicia e acaba em torno do violão e da voz de Lucina (seus graves e agudos, assim como o seu violão, seguem afinados, enérgicos). Arranjos extremamente belos, mas simples. Meu Deus, as músicas parecem se desprender de si mesmas e buscar o mundo que as converterá em sinfonia de raras força e beleza.

Em “Canto de Árvore” (Lucina e Zé Renato Fressato), somados às delicadezas do violão e da voz de Lucina, destacam-se a beleza do som do cello (Peri Pane) e do acordeom (Otávio Ortega). Lindo!

“Aí no Coração” (Lucina e Aloísio Brandão). Entre viradas da percussão (Decio Giolelli), desde a introdução até o final, cello e cavaquinho (Marcelo Dworecki) tecem o clima de uma das “preces” pronunciadas por Lucina e seu violão.

“Guerra dos Egos” (Lucina e AlziraE) é outro belo momento do CD. Terçando voz com Peri Pane, que está novamente no cello, os versos se misturam em meio à inversão de palavras.

Em “O Espectador” (Lucina e Joãozinho Gomes), mais uma vez a voz e o violão de Lucina protagonizam.

“Do Contra” (Lucina e Iso Fischer) tem resfolego da sanfona, tem verve do poeta e suingue do bom.

Tudo muito simples… é como se fosse fácil. Até que os tambores tocam pra subir. E lá se vão as “preces” de Lucina. Vão ao ar, descem ao mar, deixando no ouvinte a impressão de que acabou de ouvir um disco popular de beleza incomum… Um CD de Lucina!

Aquiles Rique Reis, vocalista do MPB4

 
Aquiles Rique Reis

Músico, integrante do grupo MPB4, dublador e crítico de música.

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