Juiz do caso Glauber é lavajatista e cabo-eleitoral do Partido Novo

Carla Castanho
Carla Castanho é repórter no Jornal GGN e produtora no canal TVGGN
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Sergio Louzada pediu votos e incentivou filiação ao Partido Novo; também citou o art. 142 em aparente alinhamento com Bolsonaro

Repercutiu nesta semana a multa exorbitante – quase 1 milhão de reais – que o deputado federal Glauber Braga (PSOL-RJ) recebeu após entrar em rota de colisão com o juiz Sergio Roberto Emilio Louzada, por causa de uma manifestação política em Lumiar, distrito de Nova Friburgo (RJ), onde o parlamentar esteve em apoio a uma deputada estadual. 

A liminar do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro (TJ-RJ) proibiu o ato político em local público, um protesto contra a agressão sofrida por Marina do MST, parlamentar do PT, hostilizada por bolsonaristas quando prestava contas de seu mandato.

Nas justificativas para impedir o evento, o juiz apontou que o local não teria “dimensões urbanas” para sediar a “proporção” da mobilização. Glauber esteve no ato e anunciou que questionaria na Justiça o teor da liminar. Além da conta bancária pessoal, o deputado sofreu bloqueio também na de uso parlamentar, dificultando o exercício do mandato.

Um juiz cabo-eleitoral?

O valor estratosférico da multa, dada sob a justificativa de que o deputado Glauber afrontou uma decisão do Poder Judiciário, levantou críticas até mesmo entre políticos do campo da direita, e lançou dúvidas sobre a isenção do magistrado.

Conforme apurado pelo GGN, a linha dura do juiz que multou Glauber combina com o perfil de um típico defensor incondicional da Lava Jato. Sua conta no Facebook não esconde sua preferência ideológica.

As postagens analisadas pela reportagem nesta sexta (1º) mostram que o juiz Sergio Louzada se conformou com a vitória de Jair Bolsonaro em 2018 após fazer uma campanha abundante em apoio ao então presidenciável João Amoêdo (Novo), derrotado naquela eleição.

Reprodução: Facebook Sérgio Louzada / Extraído em 01.09.23

Conduta indevida?

Embora não seja vedado aos juízes manifestarem opinião política, as publicações de Louzada pedem expressamente voto no candidato Amoêdo e estimulam a filiação ao Partido Novo.

Atividades de cunho político-partidário são proibidas aos juízes pelo Código de Ética da Magistratura em seu artigo sétimo, justamente porque colocam em xeque a independência do Poder Judiciário.

Somente na eleição de 2018, o juiz Sergio Louzada fez mais de 50 posts no Facebook em campanha aberta para Amoêdo e o candidato do Novo ao governo do Rio de Janeiro, Marcelo Trindade. Na maioria das vezes, tratou-se de panfletagem virtual: Louzada replicou os materiais oficiais da campanha do Novo a nível nacional e estadual. Em ao menos um dos posts, porém, ele pede voto a Amoêdo em texto escrito em primeira pessoa.

Reprodução: Facebook Sérgio Louzada. Extraído em 01/09/23

O perfil de Louzada no Facebook mostra um cidadão inclinado ao voto “nem-nem”: nem direita, nem esquerda. Por isso, o apelo por voto em Amoêdo, que tentava ser uma “terceira via” naquela eleição.

O GGN consultou um juiz de Direito para entender as consequências de uma manifestação de caráter político-partidário quando feita por um magistrado.

“A atividade política não é vedada” aos juízes, que também são “cidadãos” e têm direito de exercer a liberdade de expressão. “O proibido é o exercício de atividade político-partidária”. Pedir votos, em tese, pode configurar uma infração disciplinar. O caso precisaria ser analisado pelas autoridades competentes.

Por outro lado, a fonte consultada pelo GGN ressalvou que tem sido comum, nos últimos anos, juízes sofrerem processo administrativo quando expressam opiniões políticas inclinadas ao campo progressista.

Um lavajatista convicto

Dentro do espírito de negação da velha política, em uma das postagens, de março de 2019, Louzada elogiou a prisão dos últimos três últimos presidentes da República e se mostrou “esperançoso” pelos rumos que o país estava tomando no “combate à corrupção”.

Reprodução: Facebook Sérgio Louzada/Extraído em 01.09.23

Na internet, os valores lavajatistas do juiz Sergio Louzada estão estampados em publicações abertas ao público até o final da tarde desta sexta (1º). Em algumas delas, ele elogiou as decisões do TRF-4 no caso Lula e criticou indiretamente o Supremo Tribunal Federal por ter validado recursos da defesa do petista.

Em janeiro de 2019, Louzada, em apoio ao extinto time da Lava Jato, compartilhou publicação da ex-deputada e ex-bolsonarista Joice Hasselman. O vídeo era protagonizado pelo ex-procurador Deltan Dallagnol exigindo votação aberta para a presidência do Congresso.

Reprodução: Facebook Sérgio Louzada. Extraído em 01/09/23

A prioridade de Dallagnol, na verdade, era evitar que o ex-ministro da Justiça e ex-juiz Sérgio Moro fosse impedido de encaminhar ao Congresso, em 2019, “projetos contra corrupção, impunidade e crime organizado”.

Vale lembrar que o ativismo de Glauber Braga contra figuras da Lava Jato é notório. No mesmo ano, Glauber protagonizou uma das cenas mais compartilhadas nas redes sociais pelo campo progressista, ao chamar Sérgio Moro de “juiz ladrão” durante uma audiência na Câmara dos Deputados. [Veja o vídeo completo]

A partir de outro vídeo replicado da conta da ex-deputada Janaina Paschoal, Sérgio Louzada elogiou a atitude do ministro aposentado Marco Aurélio Mello, do Supremo Tribunal Federal, que criticou duramente o fato de que quatro ações penais da Lava Jato contra o presidente Lula voltariam “à estaca zero”, pois seriam redistribuídas a outras varas por incompetência de Sergio Moro para julgá-las.

Reprodução: Facebook Sérgio Louzada/Extraído em 01.09.23

As críticas a Lula e ao PT, no perfil social de Louzada, são várias. Uma de suas publicações insinua que os eleitores do PT e de Lula sofrem de “imunização cognitiva”, ou seja, são incapazes de admitir – ou se blindaram mentalmente para não admitir – que Lula seria um corrupto, segundo a narrativa da Lava Jato.

Reprodução: Facebook Sérgio Louzada/Extraído em 01.09.23

O apoio à Lava Jato extrapolou as redes sociais e chegou aos autos processuais. Em 2019, Louzada foi o juiz responsável por bloquear os bens do ex-governador Luiz Fernando Pezão (MDB), condenado a 99 anos de prisão pelo juiz Marcelo Bretas, da Lava Jato fluminense. A sentença condenatório de Pezão caiu na segunda instância em janeiro deste ano e, agora, conforme revelou ao GGN, o ex-governador vai acionar a Justiça em busca de reparação pelos danos sofridos na Lava Jato.

Negacionista mas não terraplanista

Embora tenha proibido o ato em agravo à deputada estadual petista no Rio, justificando a “falta de estrutura” do local, irônica e tragicamente, o juiz Sergio Louzada compartilhou postagens que defendiam carreatas e manifestações de bolsonaristas revoltados com as medidas de lockdown adotadas por prefeitos e governadores durante a pandemia de Covid-19.

Louzada também compartilhou de um dos discursos de Jair Bolsonaro, de que o Supremo Tribunal Federal (STF) esvaziou seus poderes e entregou a gestão da pandemia aos governadores e prefeitos. O descontentamento com o jornalismo profissional – mas não com expoentes do jornalismo opinativo da extrema-direita, como Augusto Nunes e Alexandre Garcia – também foi expressado por Louzada em seu Facebook.

Reprodução: Facebook Sérgio Louzada/Extraído em 01.09.23

Apesar de se alinhar ao bolsonarismo em algumas teses, o juiz Sérgio Louzada defendeu a lisura do sistema eleitoral e a segurança das urnas eletrônicas tanto nas eleições de 2018 quanto em 2022. Além disso, também vacinou as filhas, diferente do ex-presidente Jair Bolsonaro.

Em defesa da intervenção militar?

Outro ponto relevante que ajuda a constituir o perfil do juiz do caso Glauber é uma publicação sobre golpe militar que se alinha ao discurso de Jair Bolsonaro.

Em março de 2021, Louzada fez um post questionando, primeiro, se o golpe de 1964 foi mesmo “golpe ou revolução”. Depois, especulou “o que acontecerá” em 2021, citando o Art142 da Constituição. A postagem vinha acompanhada de uma foto com os dizeres: “O Brasil não será uma nova Cuba.”

O artigo 142, como se sabe, foi frequentemente utilizado por Jair Bolsonaro para ameaçar uma intervenção das Forças Armadas em outros Poderes da República – em clara afronta, inclusive, ao próprio Poder Judiciário que Louzada supostamente tentou defender ao multa Glauber.

Reprodução: Facebook Sérgio Louzada/Extraído em 01.09.23

Uma multa exorbitante

No caso Glauber, a multa e bloqueio de contas no valor de quase 1 milhão de reais chamou atenção da opinião pública.

Para fins de comparação, em março do ano passado, o ministro do Supremo Tribunal Federal, Alexandre de Moraes, multou o ex-deputado federal Daniel Silveira (PTB-RJ) em 135 mil reais pelo descumprimento de decisões judiciais. 

Um outro caso de sanção por desrespeito a ordem judicial envolve Jair Bolsonaro, multado em 55 mil reais por violar a ordem para apagar imagens do 7 de Setembro, entendidas como propaganda eleitoral antecipada. 

Em defesa do juiz

Em nota, a Associação dos Magistrados do Estado do Rio de Janeiro (AMAERJ) saiu em defesa do juiz. Segundo a instituição, “o magistrado decidiu de forma técnica e fundamentada” no caso Glauber, e as sentenças, confirmadas em instâncias superiores, “se baseiam em fatos e nas manifestações do Ministério Público pela preservação da ordem pública e pelo bem-estar da sociedade.”

Além disso, na visão da AMAERJ, “no Estado Democrático de Direito, discordâncias sobre decisões do Judiciário devem ser manifestadas por meio de recurso judicial.”

Ao Brasil de Fato, Glauber Braga disse que é “muito grave” a conduta de Louzada. “Além de recorrer com um agravo em relação ao desbloqueio das contas, evidentemente vamos representar contra ele no Conselho Nacional de Justiça (CNJ)”, afirmou o parlamentar.

A reportagem do GGN procurou a assessoria de imprensa do juiz para obter um posicionamento acerca de suas publicações de teor político nas redes sociais, mas não obteve retorno até o fechamento.

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Carla Castanho é estagiária em jornalismo sob supervisão de Cintia Alves

Carla Castanho

Carla Castanho é repórter no Jornal GGN e produtora no canal TVGGN

2 Comentários

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  1. Mais um juiz de merda que se jogou no esgoto para agradar o capitão ladrão genocida e terrorista. Depois que perder o cargo ele poderá ser “adevogado” na porta de um presídio em que os bolsonaristas estão sendo enjaulados.

  2. Momento vergonha alheia, de tão absurda e sem noção essa decisão contra o deputado, a virar estudo de caso em livros e nas faculdades de Direito em todo o país; a explícita atuação político-partidária do magistrado, que tem a burlesca pretensão de impedir o mesmo a um mandatário (!), é só a cereja do bolo.

    Deve cair num peteleco – fora, claro, do nojento corporativismo local, outro estudo de caso já conhecido dos sociólogos e antropólogos do Direito; creio inclusive que cabe Reclamação diretamente ao STF, pelo nítido atentado ao exercício do mandato de um parlamentar federal. Os demais parlamentares também deveriam colocar as barbas de molho e tomar logo alguma medida legislativa; não se pode tolerar tamanho acinte às prerrogativas do mandato.

    Não por acaso tantos encapados se insurgiram há alguns anos contra a lei de abuso de autoridade; há os que se comportam como monarcas absolutistas, que censuram e perseguem seus desafetos, avacalham o ordenamento e pervertem a hermenêutica jurídica, tripudiam da coerência – e, deixam claro, não cederão um milímetro de poder sem guerra. Logo, afora as medidas já possíveis dentro do sistema de freios e contrapesos, o povo brasileiro não deve se esquecer, numa próxima Constituição, como retribuição mediata, dos vampiros do antigo regime, e reservar-lhes o devido carinho, as devidas exceções.

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