Contribuição dos militares à CNV casa com discurso de Dilma sobre Anistia

Cintia Alves
Cintia Alves é graduada em jornalismo (2012) e pós-graduada em Gestão de Mídias Digitais (2018). Certificada em treinamento executivo para jornalistas (2023) pela Craig Newmark Graduate School of Journalism, da CUNY (The City University of New York). É editora e atua no Jornal GGN desde 2014.
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Jornal GGN – No último 31 de março, data em que o País lembrou dos 50 anos do golpe que derrubou o governo Jango e abriu caminho para o regime militar, Celso Amorim, ministro da Defesa, assinou um documento autorizando às Forças Armadas a instauração de sindicâncias internas para apurar crimes de tortura e morte cometidos em aparelhos militares durante os anos de chumbo (1964-1985).

Sete unidades, sendo quatro no Rio de Janeiro e três fixadas em Recife, Belo Horizonte e São Paulo serão investigadas a partir de um pedido apresentado formalmente pela Comissão Nacional da Verdade em fevereiro. No requerimento entregue ao Ministério da Defesa, o grupo anexou um relatório preliminar de pesquisa apontando o uso de aparelhos do Exército, Marinha e Aeronáutica para práticas que ferem os Direitos Humanos. Há registro de nove casos de homicídio e 15 de tortura.

O requerimento é fruto de estudos que Floriano Azevedo Marques Neto e Marcos Augusto Perez desenvolveram na Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo, em parceria com alunas da pós-graduação, a pedido do advogado Pedro Dallari, coordenador da CNV.

“O objetivo era verificar se haveria base jurídica para obrigar as Forças Armadas a investigarem o uso indevido dos referidos aparelhos militares. A resposta do estudo foi afirmativa. Isto é, constatamos que as Forças Armadas têm o dever de investigar e identificar os responsáveis, buscando tanto aqueles que comandaram essas operações como aqueles que só cumpriram ordens”, explicou ao Jornal GGN o advogado Marcos Augusto Perez.

O estudo, segundo Perez, tratou da responsabilidade civil dos militares envolvidos nos crimes, o que poderia conduzir ao pagamento de indenizações e penalidades administrativas. Porém, o principal ganho com as sindicâncias seria a transparência e o resgate da história, uma vez que boa parte das famílias das pessoas vitimadas nesses equipamentos já foram indenizadas pelo Estado. 

“Dificilmente as Forças Armadas deixarão de identificar os responsáveis, com quase toda a certeza havia ordens documentadas dos superiores para que as instalações fossem usadas com desvio de sua finalidade legal. Muitos desses servidores já devem ter falecido, mas outros não e poderão responder na medida de sua participação. O mais importante será a transparência que essas informações nos trarão sobre esse período histórico”, frisa Perez.

A expectativa do Ministério da Defesa é que as sindicâncias sejam concluída até o final de abril.

Dilma não ameaça Lei da Anistia, mas pede que história seja contada

Desde que a Comissão Nacional da Verdade entrou em vigor, muitas críticas foram disparadas aos militares que têm colaborado com informações muito escassas às investigações. O Exército só decidiu abrir uma sindicância interna para apurar os aparelhos onde a CNV aponta delitos contra os Direitos Humanos em 25 de março deste ano. A Marinha e a Aeronáutica só confirmaram as sindicâncias no dia 31, após a determinação do Ministério da Defesa. 

No mesmo dia, coincidentemente, a presidente Dilma Rousseff se pronunciou a respeito do golpe de 1964. No momento em que diversas instituições cobram a revisão da Lei de Anistia e o consequente enquadramento de agentes que cometeram crimes durante o período ditatorial, a chefe do Executivo fez um discurso institucional que, em certo grau de análise, pode ter reduzido a resistência dos militares em colaborar com a CNV. 

Dilma frisou que reconhece e valoriza “os pactos políticos que nos levaram à redemocratização”, ou, em outras palavras, deixou claro que não cabe ao Palácio de Planalto a discussão em torno da aplicação de sanções aos torturadores e assassinos da ditadura militar.

Mas a presidente reafirma – até porque bancou a CNV – que a verdade sobre os anos de chumbo deve ser contada. “Devemos isso a todos os que morreram e desapareceram, aos torturados e aos perseguidos, às suas famílias, a todos os brasileiros. Faz parte do processo que nós iniciamos com as lutas do povo brasileiro pelas liberdades democráticas, pela Anistia, pela Constituinte, pelas eleições diretas”, pontuou a petista.

A iniciativa das Forças Armadas não resolve por completo a situação conflituosa que existe desde que a CNV iniciou apurações contra a vontade dos militares, mas já representa um avanço. “A maior colaboração será a conclusão das sindicâncias e a revelação dos responsáveis”, concluiu Perez.

Cintia Alves

Cintia Alves é graduada em jornalismo (2012) e pós-graduada em Gestão de Mídias Digitais (2018). Certificada em treinamento executivo para jornalistas (2023) pela Craig Newmark Graduate School of Journalism, da CUNY (The City University of New York). É editora e atua no Jornal GGN desde 2014.

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  1. Lição da História

    “Tudo é feito para corromper a infância, a adolescência e a juventude. Pagaremos caro, muito caro por isto” – François Mauriac

    Nassif: pisemos no chão. Nada tenho contra os militares, por que dedico profundo respeito, até porque meu compromisso é com a VERDADE, exclusivamente. Mas esta dos militares investigando seus pares de antanho é puro devaneio. O espírito dos quarteis não é imutável, mas é imexível (para relembrar o ex-ministro Magri), especialmente sobre fatos de 50 anos atrás, fresquinhos na memória da caserna. É da tradição e qualquer diferente recebe o pomposo título de insubordinação, coisa abominável na hierarquia militar. Aliás, foi a denominada “insubordinação dos praças-de-pré” o pretexto para os antecessores destes senhores revertessem a ordem democrática para lançarem o Brasil na “era medieval” da nossa história, por anos e anos, momentos de horror e de dor e de vergonha e de roubalheiras e de corrupção e de decadência moral e de censura cultural. Por vinte e um anos vimos nossa juventude pensante lançada num fosso de morte e exílio, sendo substituída por outra, alienada, sem compromisso com nada que não representasse o luxo e a riqueza, mesmo que às custas dos abandonados da sorte. Vimos execuções brutais, estupros, torturas da forma mais vil, indignas da espécie humana, isto tudo para satisfazerem seus egos ideológicos, seus sonhos frustrados, seus conchavos com nações alienígenas, sedentas de nossas riquezas e que pouco se davam se sofríamos ou não. Por isto, a continência, como na foto do texto, não me parece sincera, como não sincera esta de apuração da verdade de tortura nas dependências militares, quando em sua maioria ocorriam nas paramilitares. Sabem que o tempo se incumbiu de lavar o sangue do chão e das paredes, das varrer fezes e urinas nas cadeira e nos paus-de-arara, do vômito pelo chão. O tempo silenciou os gemidos. O tempo desligou o som altíssimo do rádio para abafar o grito de dor e desespero. E o que tempo não conseguiu afastar, as provas materiais, estas foram devidamente apagadas ou mutiladas de forma tal que lidar com elas será como tentar montar um quebra-cabeça onde as peças que representariam alguém apunhalando outro faltara os rostos do apunhalante e do apunhalado. Diferente do que dizia o vice-Presidente Pedro Aleixo, não mais tememos “o guarda da esquina”. Tememos agora estes que prestam continência à Presidente da República mas que, aparentemente, com o outro braço estão com os dedos cruzados às costas.

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