Senado libera contratação de professores universitários sem pós

Prezados,

esta discussão já foi feita e refeita diversas vezes. Mas reaparece agora no Senado. E está na bica de de se tornar Lei. Será um desserviço se a Presidenta Dilma não vetar esta tentativa de baratear custos e diminuir a qualidade no ensino superior. Alô, Ministro da Educação!! Taí uma oportunidade de mostrar que este governo não deixa (ou ajuda a …)  “os idiotas perderem a modéstia”.

Leiam no Estadão.

http://www.estadao.com.br/estadaodehoje/20110702/not_imp739743,0.php

e complementem a leitura com 

http://www.sinprosantos.org.br/site/index.php?canal=noticias&&ler=87

Pelo menos uma faculdade particular aqui de Vitória, já antecipando-se a esta lei, está dispensando os mestres e doutores, deixando um Doutor para “aparecer na foto”. 

Posso falar com conhecimento de causa de algumas áreas. Sou engenheiro e médico, professor em universidade pública, fui orientador de diversos professores que lecionaram ou lecionam em faculdades privadas.

Os argumentos de parte a parte: 

1 – “há poucos doutores e mestres”: isto é verdade, aqui, em algumas áreas (por exemplo, na saúde, faltam Doutores em Fisioterapia, na Engenharia, Doutores em Engenharia de Petróleo). Mas aqui  não faltam fisioterapeutas com Doutorado em Fisiologia, por exemplo. Nem engenheiros civis ou mecânicos que fizeram mestrado ou doutorado em problemas afins da cadeia de conhecimentos do petróleo (estudos em escoamento de fluidos viscosos em materiais porosos, por exemplo). Assim, não faltam doutores que seriam aceitos pelo MEC.

2 – “os doutores não aceitam os salários oferecidos”: também é uma verdade parcial. Pagando-se R$ 70 / hora.aula, conheço vários mestres e doutores que topam dar aula ao invés de atuarem como engenheiros no mercado. Na Medicina, é complicado. Mas na Engenharia, OK. O problema (para as particulares) é que eles (os doutores) querem dar aula e fazer pesquisa. E as horas de pesquisa não são consideradas pelas particulares. Assim, depois de 2-3 anos ganhando dinheiro, eles pedem para sair, para fazer o pos-doutorado ou para entrar em uma consultoria em que o seu cérebro seja mais exigido. 

Todavia, os valores de R$ 70/ hora que eram pagos há 4-5 anos atrás foram sendo reduzidos, paulatinamente. Hoje, o “mercado da educação superior” oferece – por aqui – R$ 30-50 por hora-aula. Aí, não dá para puxar os profissionais do mercado, nem por 2-3 anos. 

3 – “há profissionais qualificados que não têm mestrado”: sim! Verdade! E dá para se colocar um percentual de professores deste tipo. Mas, não é isso que as particulares têm feito aqui. O mais comum é convidar aqueles alunos recém-formados que apresentam “aptidão para o ensino” (leia-se: desinibidos e sem  propostas melhores no mercado) para substituir os professores com Mestrado a salários menores. Profissionais realmente experientes querem ganhar tanto ou mais que os Mestres e Doutores, ora.

4 –  E tem a parte que o Estadão não viu (ou não quis detalhar!!!): o que significam professores temporários?

Nas públicas, até o início do governo Dilma, um professor temporário (ou substituto) era contratado para substituir um professor efetivo que teve que se afastar por conta de problemas de saúde, ou para realizar cursos de (pos)doutorado, e coisas semelhantes. No governo Dilma, premido entre a  necessidade de contratar os professores prometidos pelo Projeto Reuni (por um lado) e  a necessidade de fazer saldo contábil para pagar juros e acalmar o mercado quanto aos gastos do governo (por outro lado) criou-se a figura do professor “substituto do professor efetivo que ainda não foi contratado”. Assim, economiza-se tempo e $$. Indefinidamente.

Ora, o Senador Álvaro Dias deve ter gostado da idéia. Ele propõe que “nas instituições públicas e privadas, admite-se acesso a contrato de trabalho docente temporário, mediante processo seletivo, a portadores de diplomas de graduação e de pós-graduação lato sensu, bem como a profissionais de notório saber na área de atuação;”

O que se depreende disso  ? Que a faculdade privada também poderá fazer o mesmo que a pública (por analogia)! Que irá poder contratar um professor como “temporário”, ficar com ele por 2-3 anos e demiti-lo, ao final, sem ter que pagar FGTS. É isto que corre-se o risco de se aprovar.  

A faculdade pública economizaria em dois pontos: não precisa pagar mais por um mestre, e ao dispensar o professor substituto, não precisaria pagar FGTS. Claro que esta parte do FGTS é discutível na justiça, e cabe ainda regulamentar tudo, mas o que se espera, dentro das faculdades privadas, é isso!

E ainda inventa uma novidade: o profissional de notório saber poderia ser reconhecido como tal nas instituições de nível superior. De fato, não sei se o senador estaria se referindo ao título de “Livre Docente”, o que seria interessante (mas por que não dize-lo, explicitamente?) Ou ainda ao título de “Doutor Honoris Causa”… mas aí, seria pegar pesado demais…. Doutor “Honoris Causa” não se dá a qualquer um. É coisa muito fina!!! 

Em sendo assim, minha visão é que somente aceitarão dar aula nas particulares aqueles profissionais sem mestrado, com ou sem experiência no mercado, já tendo outro emprego fixo (com seus direitos trabalhistas normais garantidos) e que estão precisando fazer um bico. Mais ou menos o que acontece com os policiais que precisam fazer bicos de segurança nas boates e nos bailes funk…. Por extrema necessidade!!! Podem contar: não serão os melhores profissionais, não!

Segue a 

 

Redação atual do artigo 66 da LDB

Art. 66. A preparação para o exercício do magistério superior far-se-á em nível de pós-graduação, prioritariamente em programas de mestrado e doutorado.

§ único. O notório saber, reconhecido por universidade com curso de doutorado em área afim, poderá suprir a exigência de título acadêmico .

 

Redação original do PL 220/2011:

Art. 66 – …………………………………………………………………………………….

§ 1º …………………………………………………………………………………………..

§ 2º   – Portadores de diploma de graduação poderão ser admitidos como docentes nas áreas tecnológicas e de infraestrutura, desde que comprovem relevante experiência profissional, na forma do regulamento.?

 

Redação aprovada na Comissão de Educação do Senado (07/06):

Art. 66 . A formação dos docentes dos cursos de graduação e de pós-graduação de nível superior será feita em programas de mestrado e doutorado, exigida, além do estudo e aprofundamento em área de conhecimento científico e tecnológico, capacitação e prática pedagógica, a critério do respectivo sistema de ensino.

§ único. O exercício da docência na educação superior obedece aos seguintes princípios:

 
I – nas instituições públicas, o acesso à carreira depende de aprovação em concurso de provas e títulos de doutorado ou mestrado, conforme a complexidade da função, a critério do respectivo sistema de ensino ou, em universidades, do colegiado superior;

II – nas instituições públicas e privadas, admite-se acesso a contrato de trabalho docente temporário, mediante processo seletivo, a portadores de diplomas de graduação e de pós-graduação lato sensu, bem como a profissionais de notório saber na área de atuação;

III – os profissionais de notório saber a que se refere o inciso II, quando reconhecidos e diplomados por universidades que tenham programas de mestrado ou doutorado em sua área de conhecimento e atuação, poderão se candidatar ao ingresso nas carreiras de docência em instituições públicas de educação superior (NR).

 

Luis Nassif

1 Comentário

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  1. De nada adianta o choro aqui

    Independentemente de tal projeto passar ou não, é quase um “tanto faz, tanto fez” para as faculdades particulares.

    Se tal projeto for aprovado, é bom porque dá pra se reduzir bem nos custos das cadeiras cativas, mas se o projeto não for aprovado, dá pra se aumentar no custo da mensalidade das cadeiras cativas dos cursos presenciais e semi-presenciais e se enfocar no ensino “a distância” como alternativa para aqueles que buscam a diplomação mas que porventura não tenham condições para arcar com o custo majorado.

    Já no que diz respeito as faculdades públicas, a não-contratação de substitutos como temporários é até mais vantajosa do ponto de vista de contingenciamento financeiro do que a contratação dos mesmos para cobrirem as janelas curriculares, ainda que a economia nisso se reverta em uma precarização ainda maior na formação dos alunos.

    E se por algum acaso tiver protesto em torno disso, jogam de novo esse abacaxi na ordem do dia, a pintando como uma “solução” para cobrir as deficiências da faculdade.

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