Sete anos após o desastre de Mariana, ninguém foi punido e crimes podem prescrever

Ainda respondem pelos crimes a Samarco, Vale, BHP Billiton Brasil, a VogBR Recursos Hídricos e os empresários e administradores destas empresas.

do Observatório da Mineração

EXCLUSIVO: Sete anos após o desastre de Mariana, ninguém foi punido e crimes podem prescrever

Por Pablo Pires Fernandes*especial para o Observatório da Mineração

  • Sete anos após o rompimento da barragem do Fundão, em 05 de novembro de 2015, considerado o pior desastre ambiental da história do Brasil e responsabilidade das mineradoras Samarco, Vale e BHP, o processo ainda está no início e nenhum dos réus foi punido criminalmente.
  • Dezenove pessoas morreram e cerca de 40 milhões de metros cúbicos de rejeitos tóxicos poluíram mais de 600 km de rios e atingiram o Oceano Atlântico, de Minas Gerais até a costa do Espírito Santo e Bahia
  • A ação penal praticamente não andou, com pouquíssimas testemunhas ouvidas e 15 réus já foram considerados inocentes
  • Os crimes ambientais devem prescrever totalmente em 2024
  • Especialistas e o Ministério Público, ouvidos pela reportagem, afirmam que a chance de impunidade geral é alta. Para um especialista em Direito Ambiental, o caso é “uma vergonha”.
  • A defesa dos acusados afirma que o MPF “exagerou” nos pedidos e reitera a inocência dos clientes. Vale, BHP e Samarco afirmam que respeitam o processo e se comprometem com a reparação.

Sete anos após o pior desastre ambiental da história do Brasil, o rompimento da barragem da Vale, BHP e Samarco em Mariana (MG), nenhum dos 26 acusados foi punido. Atualmente, 15 réus já foram considerados inocentes e restam apenas 11.

Ainda respondem pelos crimes a Samarco, Vale, BHP Billiton Brasil, a VogBR Recursos Hídricos e os empresários e administradores destas empresas.

No entanto, especialistas apontam que, diante da morosidade do processo, todos os acusados provavelmente ficarão livres de qualquer condenação no âmbito penal, restando às milhares de vítimas apenas a reparação na instância cível.

Os crimes ambientais, porém, devem prescrever no máximo até 2024 e muitos já prescreveram.

Entre os fatores que ajudaram a atrasar o andamento do processo, segundo as fontes ouvidas pela reportagem, estão a complexidade do caso, o número de acusados e testemunhas arroladas, a interrupção das audiências durante a pandemia e os vários escritórios de advocacia que representam os réus, alguns entre os mais poderosos do país. Se sobressai, porém, a falta de estrutura do Judiciário e a inadequação da legislação brasileira para lidar com um crime de tal magnitude.

Com isso, no âmbito criminal, o caso tem grandes chances de ter como desfecho a impunidade por prescrição. Carlos Ferreira da Silva, procurador do Ministério Público Federal (MPF) e atual coordenador da força-tarefa sobre o caso, considera a situação “preocupante”.

“Apenas 14 testemunhas da ação penal foram ouvidas até o momento. A defesa pediu cerca de 90 testemunhas. Ainda temos dezenas de pessoas a serem ouvidas e estamos há tempos sem audiências mensais sobre essa ação penal. Estamos muito atrasados”, afirma.

A estimativa é que, ao serem retomadas as audiências, seriam necessários pelo menos mais 18 meses para que todas as testemunhas sejam ouvidas. Só assim a parte de instrução será finalizada.

Para um especialista em Direito Ambiental e ex-procurador, que não quis se identificar, o caso “é uma vergonha”. “O que está sendo feito é uma chicana”, diz, referindo-se ao termo que indica ações que têm como objetivo abusar de recursos para adiar o andamento do processo. “Nesse caso específico de Mariana, a documentação toda mostra que eles (os acusados) sabiam da situação. Então eles vão ficar empurrando o processo.”

Para o criminalista Hassan Souki, professor da Dom Helder Escola de Direito, de Belo Horizonte, chama a atenção “o período de tempo no processo em que absolutamente nada foi feito”. “A gente compreende que existe um excesso de processos sob responsabilidade do julgador, mas ficar tanto tempo sem movimentação nenhuma não é o ideal, não é algo aceitável.”

“Alguns crimes previstos na lei ambiental já prescreveram e corre o risco de haver a prescrição e não haver responsabilidade penal por nenhum fato, isso é um risco real”, afirma Souki.

O procurador do MPF, Carlos Ferreira da Silva, explica que preocupa o fato de que boa parte dos crimes ambientais tem prescrição máxima de oito anos e prescrição mínima em quatro anos.

“Muitos dos crimes ambientais já prescreveram ou, na melhor das hipóteses, prescreverão em novembro de 2024. Então, como ainda temos seis vezes mais testemunhas que não ouvimos até hoje, causa um perigo muito grande de que enquanto não terminamos a instrução criminal, todos os crimes ambientais já estejam prescritos.”

O texto não representa necessariamente a opinião do Jornal GGN. Concorda ou tem ponto de vista diferente? Mande seu artigo para [email protected].

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Redação

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