A aprovação do pacote “anticrime” foi um tiro na cabecinha dos direitos humanos, por Roberto De Martin

Matéria recém-aprovada na Câmara já está pronta para ser votada no plenário do Senado

A aprovação do pacote “anticrime” foi um tiro na cabecinha dos direitos humanos

por Roberto De Martin

Em tempos de fake news sistematizada, é preciso mobilizar nos políticos a necessidade do diálogo sincero com o povo, mesmo que isso signifique derrota nas batalhas da guerra de narrativas que apresenta-se como verdade do mundo nos meios virtuais.

Afinal, no meio de um país sul-americano que, sob a lógica perversa do regime vigente, adequa-se ao resto do mundo na busca pela perda de direitos dos cidadãos, o mínimo que se espera dos partidos pautados pela defesa dos direitos humanos é a defesa dos direitos humanos, e não o jogo cínico da lacração internética, que, focada nos likes, mascara a barbárie.

Foi o que aconteceu, lamentavelmente, na última semana, quando, primeiro, parlamentares de esquerda votaram a favor do pacote de leis, denominado falsamente, “anticrime”, e, depois, quando os mesmos foram às redes sociais comemorar a aprovação da matéria, enviada ao Congresso Nacional pelo ministro da Justiça Sergio Moro.

Lembrando o filósofo Theodor W. Adorno, que viu Auschwitz, mas não chegou a ver os dados de jovens negros assassinados pelo “Estado” no Brasil, “a barbárie continuará existindo enquanto persistirem no que têm de fundamental as condições que geram esta regressão”. Ora, a aprovação do pacote, longe de desarmar qualquer “bomba penal”, mantém as condições que geram o genocídio da juventude negra brasileira.

Não é possível, portanto, falar, sequer, em derrota “menos pior”, quando o aprofundamento do estado de barbárie está em jogo, tampouco, é possível falar em “vitória”, como escreveu o deputado federal psolista Marcelo Freixo, que, tentando ir além, postou no twitter: “vitória contra Moro”, referindo-se à retirada da excludente de ilicitude do texto aprovado.

Não, deputado. A vitória foi da falta de debate, da falta de pensamento crítico, e, portanto, da barbárie sobre os processos emancipatórios. Era hora (ainda é) de juntar os cacos dos esforços colocados no grupo de trabalho que debateu o pacote na Câmara, do qual Freixo participou, e explicar à população os motivos que levaram à vitória de Moro. Por menos conteúdo atraente que, num primeiro momento, tal explicação possa gerar ao público da internet, é mais producente contar a verdade de uma derrota do que inventar a mentira de uma vitória.

Portanto, como alertou um promotor do Ministério público, que prefere não se identificar, a justificativa de Freixo de que uma bomba penal foi desarmada, com a retirada de alguns itens e a inclusão de outros, não é viável, uma vez que, na dança da barganha política, saiu a licença para policiais matarem sem ilicitude, mas permaneceram o aumento de penas e os requisitos mais enérgicos para progressão de regime, que levam a mais encarceramento. Mais uma vez a esquerda morde a isca do punitivismo penal e do populismo midiático, perdendo a oportunidade de confirmar, na prática, o que tanto defende no discurso: os direitos humanos.

Discordando de Freixo, o secretário de Segurança Pública de Mato Grosso do Sul, Antonio Carlos Videira, que no último dia 6 de dezembro havia celebrado operação que deixou cinco mortos em confronto com a polícia, demonstrou preocupação com a aprovação do projeto, alertando que ele deve deixar os presídios do estado ainda mais lotados. Nas palavras do representante do governo sul-mato-grossense, comandado pelo PSDB, “abre a porta de entrada e diminui o tempo de saída”.

Fica explícito, dessa forma, que falta de ajuda não foi.

Entidades como a Associação Brasileira de Juristas pela Democracia (ABJD) e o Coletivo por um Ministério Público Transformador (Transforma MP) produziram vasto material, por meio da campanha “Pacote Anticrime: uma solução fake”, que apontava o caráter punitivista e as gravidades contidas no pacote, assim como representantes do movimento negro afirmaram, por diversas vezes, que a aprovação dos projetos irá institucionalizar a licença para matar os mais vulnerabilizados num sistema racista.

Não é o caso de culpar os políticos de esquerda pelas porcarias punitivistas que são aprovadas a rodo na Câmara e Senado. Não se trata disso. Mas não dá, também, para enganar a população, desperdiçar a oportunidade de debate, suavizando a porrada do cassetete e a bala “na cabecinha” com posts que celebram falsas vitórias. Resta aguardar uma improvável reação no Senado, onde o pacote já foi aprovado pela Comissão de Constituição e Justiça e segue, sem mais debates, para o plenário.

Roberto De Martin é defensor dos direitos humanos, jornalista e ator.

Redação

2 Comentários

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  1. O Brasil não precisa de decisões jurídicas apressadas ou extrema mas sim, de juízes e procuradores fiéis a CF, imparciais e justos e de uma justiça ágil, cidadã, justa e imparcial.
    A cidadania e sua prática, começa pela vontade do povo em se instruir e conhecer o que diz, o §Único do Art.1° da CF e afins, da Constituição do Estado de São Paulo e da Lei Orgânica da Capital. Depois, que esse povo tenha interesse em lê e conhecer, pelo menos, o que dizem e significam, os 07 primeiros Artigos da Constituição Federal, associados aos Artigos 44, 45, 46, 49, 70, 71, 84, 101 e 102 da CF, para que tenham instrução para compararem situações reais de seus interesses, como essa pergunta que você nos submete e, assim, tirem suas conclusões, a partir de sua própria consciência e observação dos fatos, à luz da CF.
    Com base em tudo isso, È BOM QUE TODO CIDADÃO SAIBA QUE, dos resultados e obras de quaisquer governos, numa democracia que respeite o estado de direito, os Poderes Legislativos especialmente, que recebem as demandas dos Poderes Executivos para apreciação, análise, discussão, adequação aos interesses e aspirações do povo que representam, à luz da CF e que, as APROVAM no Final essas demandas, esses parlamentares a partir daí, são tão responsáveis pelos resultados positivos ou negativos para o povo, dessas demandas, quanto seus executores dos poderes executivos.
    Com mais um agravante para os Poderes Legislativos, nos casos de sua omissão fiscal na fiscalização responsável dessas demandas, já que eles, auxiliados pelos TC’s (Art. 70 e outros da CF), são os entes competentes de Fiscalização e Controle Interno e Externo constitucionais, para assegurarem a conformidade legal da sua boa e correta execução com qualidade, segurança e excelente funcionalidade, para benefício do povo, dos Estados, dos Municípios e do país.
    Essa ação fiscalizatória, se agindo proativa e ostensivamente, em tempo real, na monitoria da boa e correta execução da demandas aprovadas ou das Políticas Públicas, Planos, Programas, Projetos, etc; na inspeção de casos específicos que gerem dúvidas; na fiscalização educativa e orientativa trimestrais, das ações fiscalizatórias de Controle Interno das Controladorias dos Poderes Executivos, para identificar-se gargalos ou entraves nos Cronogramas, pode viabilizar a tempo, sem prejuízos da execução e dos interesses públicos, a correção de erros ou desconformidades, evitando-se assim, corrupção, desperdícios de recursos públicos, obras e serviços públicos sem qualidade e prejuízos aos cidadãos.
    Esse exemplo acima, é mais ou menos como todas as instituições constitucionais, em suas áreas de responsabilidades, deveriam agir, independentes em suas searas mas, harmônicas entre si, no interesse do POVO, o patrão de todos.
    São essas, as nossas observações como cidadão leigo no assunto, com a finalidade de contribuirmos ao debate e discussão, civilizada e racional, amparada em nossa CF, combatida por muitos que, infelizmente, não estão preparados para conviverem com uma Constituição Federal Cidadã, como a do Brasil.
    Muitos criticam nossa saúde, educação, etc, que não é de primeiro mundo, como dos países que visitam, é uma verdade, pois essas mesmas pessoas quando regressam ao seu país, o Brasil, em sua grande maioria, não permitem aqui e, nem lutam para que aqui, tenhamos, a saúde, a educação, a desigualdade, a justiça, a civilidade, a qualidade de vida, o respeito à pessoa humana, etc, de primeiro mundo, que conhecem e admiram lá fora.
    Pensem nisto.
    Sebastião Farias
    Um brasileiro nordestinamazônida

  2. Meu Deus! Estou tão sem tempo e sem paciência para lidar com os inocentes úteis, mas tenho de arrumar um tempinho para contestar esse texto desse inocente. Todo mundo sabe que os Dráculas (A CIA e suas filiais, o império Anglo-Sionista, como diz aquele blogueiro The Saker, os bilionários, os Institutos Liberais) estão dispostos a dizimar a Esquerda do mundo –por Esquerda leia-se preocupação com o social, com os pobres-. Como eles têm muito dinheiro, inteligência artificial, domínio das redes de Internet, domínio das comunicações (Eles têm a rede Globo, a Record, o SBT, as rádios todas, a CNN, CBN, etc.), penetração nos judiciários, eles têm um poder fantástico. Após pesquisas à la Cambridge Analítica, pagas a peso de ouro, eles definiram:
    A – Nos países pobres e sem cultura (como o nosso) eles vão atacar a Esquerda em três pontos principais: 1-Violência 2-Corrupção 3-Degeneração dos costumes. Vamos nos ater aqui só à violência. Acusam a esquerda como protetora de bandidos, perseguidora de policiais, etc. Espalham nas redes chavões tipo: Os esquerdopatas querem direitos humanos para os bandidos e quem vai defender os direitos humanos das vítimas e dos “cidadãos de bem”? Na veia. Quem tem contato com o povão do Brasil nas periferias sabe que isto está na cabeça deles. Recentemente o Governador da Bahia deu sinais de que a Esquerda começou a entender isso e declarou: “A mãe que tem um filho assassinado e vê o assassino impune, vota em Bolsonaro”. Na mosca. A Direita vibra com a violência urbana e no campo. Quanto mais violência, mais assassinos matando na periferia, mais o povo fica desconsolado e revoltado e mais procura um salvador: Ela, a Direita, que promete acabar com os bandidos, matando-os. Lembrem do Sr. Witzel, fazendo dancinha junto dos policiais após a morte de um sequestrador de ônibus.
    Como sair dessa armadilha em que caiu a Esquerda? Por que tem de ser Moro que vai prá televisão defender penas maiores para assassinos? Por que a Direita tem de ser dona desse discurso e, portanto, dona do palanque e do poder? Por que a Esquerda deveria ter vergonha de fazer isso? Será se a Esquerda defende que assassinos fiquem impunes e tenham vida fácil? E se já é reincidente em matar vidas, devemos pedir que as vítimas deem a outra face? O senso comum, o povão, não pensa assim, e como a Esquerda necessita do voto do povo para ter forças para fazer alguma coisa que nos tire desse inferno, não pode simplesmente peitar o senso comum.
    Quem quiser ler mais sobre o assunto, veja esse texto: https://jornalggn.com.br/noticia/por-que-haddad-se-recusou-e-a-esquerda-se-recusa-a-falar-sobre-seguranca-publica/
    Ah, mais quem pensa em punição, em punitivismo, é a Direita. Pois bem, o povo que é vítima não pensa assim. Pena que a Esquerda foi apenas coadjuvante e não a protagonista nessa questão do aumento de penas para assassinos. Quem ganhou os louros foi Moro e a Direita. Outra idéia (de jumento, pelo menos no momento atual), que surgiu Deus sabe de onde, mas eu desconfio que tenha sido do ninho de tramas da Extrema Direita mundial é o desarmamento da Polícia Militar. Defendam isso, povo da Esquerda, e verão o minguado apoio que já temos acabar de vez. Imaginem o senso comum, atiçado pelas postagem fakes ou não dos Bolsonaristas, passando a mensagem: “Os esquerdopatas agora querem colocar a polícia sem armas para enfrentar os bandidos”. Coitados dos “esquerdopatas”, vão ser caçados nas ruas. Juízo, gente, pelo amor de Deus. É preciso entender o Zeitgeist.

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