Governo Temer desiste de nomear general para Funai após pressão de indígenas

Jornal GGN – O governo interino do presidente Michel Temer voltou atrás e descartou a nomeação do general da reserva do Exército Sebastião Roberto Peternelli Júnior para a presidência da Funai (Fundação Nacional do Índio) após mobilização de entidades, indígenas e organizações da sociedade civil. 

O general era uma indicação do Partido Social Cristão (PSC), que tem uma das bancadas mais conservadoras no Congresso. Ontem (6), de acordo com a Folha, Peternelli é defensor do golpe de 1964 e  não quis comentar o que pretendia fazer na Funai e qual sua experiência na área. Também nesta quarta-feira, lideranças dos povos indígenas realizaram uma caminhada até o Palácio do Planalto para se manifestar contra a possível nomeação do general. 

Os indígenas também pediram a demarcação de seus territórios tradicionais e o fortalecimento da Funai. Após horas de manifestação, ministros da Justiça, da Casa Civil e o Secretário do governo interino comprometeram-se a não nomear o general e também a cancelar o corte de cargos da Funai, que estava previsto pela Medida Provisória 8785/16.

Do Cimi

Após pressão dos indígenas, governo interino descarta nomeação de general para presidência da Funai

Após a forte mobilização de indígenas, indigenistas e diversas entidades e organizações, o governo interino de Michel Temer recuou da nomeação do general Sebastião Roberto Peternelli Júnior, da reserva do Exército, para a presidência da Fundação Nacional do Índio (Funai). Peternelli havia sido indicado ao cargo pelo Partido Social Cristão (PSC), o que gerou grande reação contrária por parte dos indígenas.

Na manhã desta quarta-feira (6), cerca de 90 lideranças dos povos Pataxó, Tupinambá de Olivença, Tupinambá de Belmonte e Tumbalalá fizeram uma caminhada até a frente do Palácio do Planalto, em Brasília, onde manifestaram-se contra a possível nomeação de um general defensor do golpe militar de 1964 para a presidência da Funai.

“Nós já passamos por um período no Brasil que foi a Ditadura Militar, onde vários povos indígenas foram exterminados e massacrados. A nomeação de um general para a Funai é um retrocesso para aquilo que a gente já passou”, afirmou o cacique Aruã Pataxó, presidente da Federação Indígena das Nações Pataxó e Tupinambá do Extremo Sul da Bahia (Finpat), sobre a possível nomeação da Peternelli.

Os indígenas também se manifestaram pela demarcação de seus territórios tradicionais e pelo fortalecimento da Funai, enfraquecida pelo corte de recursos determinados por Temer e pelo Ministério da Justiça.

Pela tarde, após horas de manifestação em frente ao Palácio do Planalto, os ministros da Justiça, da Casa Civil e o Secretário do governo interino comprometeram-se com lideranças dos povos Pataxó, Tupinambá e Tumbalalá a não nomear o general para a Funai.

Corte de cargos

Os ministros também comprometeram-se a cancelar o corte de cargos da Funai, que ocorreria em função da Medida Provisória (MP) nº 8.785/16.

A MP 8.785 determina que os ministérios cortem cargos chamados de “Direção e Assessoramento Superiores (DAS)”. O Ministério da Justiça, ao qual a Funai é vinculada, é o ministério em que mais cortes são exigidos – seriam, no total, 214 cargos cortados. Destes, cerca de um terço seriam retirados apenas da Funai, praticamente inviabilizando sua já prejudicada atuação em diversas regiões.

Esta MP foi publicada no dia 10 de junho de 2016, mesmo dia em que o ministro da Justiça do governo interino, Alexandre de Moraes, publicou uma portaria na qual determina o contingenciamento de recursos do MJ por 90 dias. Durante este período, todo gasto da Funai precisa passar pelo crivo direto do ministro, o que impede o funcionamento regular do órgão.

Integracionismo e defesa do golpe de 1964

Desde que a informação da indicação do general Peternelli para o cargo tornou-se pública, circularam postagens do general em redes sociais, nas quais ele homenageia o golpe militar de 1964. Questionado pelo jornal Folha de São Paulo, ele afirmou que só falaria publicamente sobre sua posição em relação ao golpe de 64 após sua eventual nomeação para o cargo.

A Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib), em nota divulgada na última quinta (30/06), repudiou a indicação e afirmou que sua nomeação fortaleceria a “perspectiva do Estado policial que está sendo instalado no país, com a criminalização dos movimentos sociais”.

Diversas entidades e organizações indígenas e indigenistas também manifestaram-se contra a nomeação do general Peternelli para a Funai. Na tarde de terça (5), servidores e servidoras da Funai, indígenas e pesquisadores também manifestaram-se em frente ao Palácio do Planalto contra a nomeação de Peternelli.

Em nota divulgada nesta segunda (4), o Conselho Indigenista Missionário (Cimi) considerou que a nomeação do general representaria “o retorno do alinhamento do Estado brasileiro ao militarismo integracionista na relação com os povos originários, a exemplo do que ocorreu durante a ditadura militar, quando mais de oito mil índios foram mortos, conforme demonstrado pela Comissão Nacional da Verdade”.

Inicialmente, o ministro da Justiça Alexandre de Moraes negou que Peternelli houvesse sido convidado para o cargo de presidente da Funai. Após a confirmação do convite e a forte pressão dos povos indígenas e apoiadores, o governo interino desistiu da nomeação. “Não há nenhum veto pessoal do nome indicado ao PSC, mas estamos em busca de um outro perfil”, afirmou Moraes à imprensa na tarde desta quarta (6).

Articulação ruralista

A indicação de Peternelli para a presidência da Funai pelo PSC – ocupada interinamente desde maio pelo vice-presidente Artur Nobre Mendes, após a exoneração de João Pedro Gonçalves – faz parte da articulação feita por parlamentares da bancada ruralista durante a negociação para a admissão do processo de impeachment de Dilma Rousseff.

Antes do afastamento de Dilma Rousseff, ruralistas entregaram ao vice-presidente Michel Temer uma pauta contendo suas reivindicações políticas, como contrapartida ao apoio no processo de impeachment. Esta pauta inclui, entre outras coisas, o pedido de revisão das escassas demarcações de terras indígenas feitas pelo governo de Dilma Rousseff e a aprovação da PEC 215.

Para denunciar estas ações que buscam retirar direitos dos povos originários, cerca de 150 lideranças indígenas entregaram, ontem, documentos a diversas embaixadas, pedindo que os países estrangeiros condicionem a importação de commodities do agronegócio brasileiro à mudança de postura dos ruralistas e de suas entidades representativas em relação à questão indígena (saiba mais).

 

Redação

1 Comentário

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  1. Esse general seria um desastre

    À frente da Funai esse general seria um desastre. E só mesmo um governo de alienados pra ao menos pensar em nomear um cara com esse perfil para um órgão como a Funai. Só mostra o total despreparo e o desconhecimento amplo das particularidades de cada órgão da Administração, além de provar a fome desse partido ultraconservador, o PSC, em ir pro embate com os movimentos sociais e tratar questão social na marra, como fizeram ao indicar o Feliciano pra Comissão de Direitos Humanos da Câmara.

    A Funai tem em seus quadros servidores sensíveis à questão indígena, que há muitos anos, senão décadas, atuam dentro de uma visão de poupar ao máximo a cultura indígena de descaraterizações. O aculturamento, que até hoje norteia a visão dos militares em geral (ainda como herança do “integrar para não entregar” dos anos pós-Golpe de 1964), não é mais aceito e nem praticado há muito, muito tempo.

    A visão geral dos servidores da Funai é progressista, não numa visão partidária, mas sim numa visão social e cultural, dado o público-alvo da Autarquia. E esse general iria se chocar brutalmente com isso, em menos de uma semana iria tachar todos de “comunistas”, de estar “entregando a soberania do país”, iria bater de frente com as inúmeras ONG’s que atuam na área (e que ao contrário do senso comum não são formadas por ongueiros ricos…), em suma: ia fazer um estrago geral!

    Vou dar um exemplo: pra cá pro DF acorrem muitos indígenas, principalmente do Mato Grosso e Goiás, em busca de tratamento médico e assistência social, além de lideranças indígenas de todo o país, pra tratar de seus assuntos junto à Funai. Muitos desses indígenas e seus acompanhantes aproveitam um espaço em frente ao prédio da Funai para expor e vender artesanato, é uma forma de defender um troco. Esse general iria acabar com isso em dois tempos, alegando que seria “baderna”. Como não entende nada fora do rígido pensamento ordernatório e legalista ao extremo, iria proibir essa informalidade correndo.

    Na 1ª vez que o prédio fosse tomado por lideranças indígenas em algum protesto – algo relativamente comum e com o que os servidores da Funai lidam tranquilamente – ele sairia distribuindo botinadas, chamaria a polícia e mandaria baixar o cassetete. Seria um desastre, senão uma tragédia.

    Ainda bem que dessa vez a pressão funcionou!

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