O desperdício de Gabriel Galípolo, por Luís Nassif

Abrir mão de uma figura como Galípolo não parece ter sido uma decisão sensata do Ministro Fernando Haddad, da Fazenda.

Desde a fase de transição para a posse de Lula, o economista Gabriel Galípolo despontava como um quadro relevante. Em parte, pelo conhecimento de mercado, de teoria monetária. Em parte, pela capacidade de diálogo, que o transformou em um dos principais interlocutores no Congresso.

Dono de uma atividade intensa, mas discreta, tornou-se também um bom referencial para jornalistas econômicos, especialmente como contraponto aos bordões mercadistas, além de ter começado a se tornar um interlocutor de Lula.

De repente, é alocado no Banco Central, para participar da guerra pela redução da Selic – mesmo sabendo-se que Roberto Campos Neto move-se por ideologia, não por argumentos.

No BC, regras rígidas proibem Galípolo de dar declarações, há restrições legais a qualquer atuação do BC no mercado de taxas. Ou seja, tornou-se um quadro quase inútil, em um governo cuja área econômica, mais do que nunca, exige criatividade, capacidade de negociação e de argumentação.

Como espécie de consolo, atribui-se ao seu trabalho o fato de Campos Neto ter aceitado em aumentar em 0,25 para 0,50 a queda da Selic. Convenhamos, é muito pouco para se anular um quadro com a capacidade técnica de Galípolo, ainda mais agora que o presidente da Câmara, Arthur Lira, deverá engrossar o caldo, nas discussões do aumento da tributação dos mais ricos.

Nas discussões do próximo orçamento, ficarão claras as restrições orçamentárias, e haverá enorme dificuldade para administrar a visão tecnocrática de quadros da Fazenda, como a Secretaria do Tesouro. especialmente quando entram em jogo recursos da Saúde e do Fundeb (Fundo de Desenvolvimento da Educação). Será uma transição difícil, especialmente porque caminha-se em uma linha tênue. De um lado, há a necessidade de controlar o mercado, à custa de um sacrifício dos investimentos públicos e dos gastos essenciais. Do outro, não há a menor segurança de que, com o torniquete das taxas de juros, possa haver uma recuperação da economia, a ponto de garantir um aumento da receita fiscal.

Vive-se uma situação curiosa. O estrangulamento da economia derruba a arrecadação fiscal. Inflação baixa, igualmente, tem efeito restritivo sobre a arrecadação fiscal. A melhoria na atividade econômica depende de fatores de baixo impacto na cadeia produtiva, como o agronegócio. E, em um governo com mandato de quatro anos, cada dia de vida nunca é mais, é sempre menos.

Ou seja, se não houver uma estratégia mais audacioda para romper esse duplo torniquete – dos juros e do orçamento -, não haverá tempo de vida útil para garantir a eleição do próprio Lula ou de alguém do seu campo.

São esses desafios que exigem capacidade criativa, conhecimento de mercado, capacidade de argumentação. Nesse quadro, abrir mão de uma figura como Galípolo não parece ter sido uma decisão sensata do Ministro Fernando Haddad, da Fazenda.

Luis Nassif

0 Comentário

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

Você pode fazer o Jornal GGN ser cada vez melhor.

Apoie e faça parte desta caminhada para que ele se torne um veículo cada vez mais respeitado e forte.

Seja um apoiador