As críticas à burocracia da Ancine

De O Globo

Ancine

Cineastas pedem à ministra da Cultura redução da burocracia

Plantão | Publicada em 04/04/2011 às 08h37m

Mauro Ventura

Tizuka Yamazaki diz que demora  na autorização faz com que não consiga terminar 'Amazônia Caruana'

Na quinta-feira passada, a ministra da Cultura, Ana de Hollanda, recebeu durante reunião do Conselho Superior de Cinema um documento subscrito por mais de cem cineastas, com uma série de reivindicações e críticas à “gestão ineficiente e à burocracia” da Agência Nacional de Cinema (Ancine). No encontro, foi entregue outro documento à ministra, em nome de oito conselheiros – distribuidores, exibidores e produtores. Manoel Rangel, presidente da Ancine, também estava presente.

– Está todo mundo furioso – diz Tizuka Yamazaki (“Gaijin”, “Aparecida – O milagre” e “Xuxa popstar”).

– A produção está engessada – reforça Tetê Moraes (“Terra para Rose”), que é conselheira e entregou o documento dos cineastas.

Ele resultou do I Encontro Nacional de Realizadores, que aconteceu nos dia 19 e 20 de março no Tempo Glauber. Promovido pela Associação Brasileira de Cineastas (Abraci – RJ), com a participação de representantes da Associação Paulista de Cineastas (Apaci), da Associação de Produtores e Cineastas do Norte-Nordeste (APCNN) e da Associação de Produtores e Realizadores de Longa-Metragem de Brasília (Aprocine), reuniu 25 diretores, como José Joffily, Ana Maria Magalhães, Alain Fresnot e Vladimir Carvalho. Na abertura, Cacá Diegues se solidarizou com o encontro e disse que ele era “oportuno e indispensável para a formulação de uma política cinematográfica, de unidade estratégica dentro da necessária diversidade”.

O outro documento, “Sugestão para diretrizes e ações políticas do Conselho Superior do Cinema”, foi encaminhado por Mariza Leão e Roberto Moreira e trazia propostas para o conselho, como a articulação de alguns ministérios com o MinC.

– Mas recomendamos vivamente a revisão dos procedimentos de análise e acompanhamento de projetos, porque estão impactando de maneira brutal na produção. Existe um consenso entre exibidores, produtores, distribuidores e diretores. Ninguém aguenta mais tanta burocracia. A cadeia cinematográfica toda sofre com os excessos de exigências. Está todo mundo estrangulado – diz Mariza Leão, produtora de filmes como “Meu nome não é Johnny”, “De pernas pro ar” e “Lamarca”.

O texto dos cineastas propõe várias medidas, em especial relativas a filmes de autor, “segmento empreendedor e criativo”, que oxigena a atividade, renova as técnicas e as linguagens, diversifica as temáticas e inova os olhares, “cuja importância não vem sendo satisfatoriamente reconhecida”. Subscrevem o documento nomes como Nelson Pereira dos Santos, Ruy Guerra, Walter Carvalho, Rosane Svartman, Beto Brant, Heitor Dhalia, Laís Bodanzky, Eliane Caffé, Roberto Gervitz, Cao Hamburger, Alberto Salvá, Zelito Viana, Orlando Senna, Murilo Salles e Ugo Giorgetti.

Tizuka ilustra como a burocracia afeta um cineasta.

– Meu filme “Amazônia Caruana” está nos finalmentes. Mas estou parada, não consigo terminá-lo. Preciso captar para a finalização. Fiquei 2010 sem captar, porque a autorização só saiu em setembro. E este ano pedi a autorização no começo de janeiro e até agora não saiu.

Uma produtora dá outro exemplo.

– Imagine que durante três anos eu vou ao mercado captar patrocínio. Finalmente estou perto e penso: “Consegui, agora vou poder tocar meu filme.” Aciono elenco e equipe, mas aí dependo de que a Ancine aprove a movimentação de meus recursos. O prazo vai se alargando e isso impacta na possibilidade de iniciar meu filme.

Outra queixa é quanto à prestação de contas dos projetos incentivados.

– Você tem a prestação normal e a especial, que é quando se tem suspeita de irregularidade. A Ancine faz sempre o procedimento especial. Não se pode partir do pressuposto de que os produtores e diretores já são mal intencionados – diz Tetê. – É um inferno, estão matando especialmente os pequenos produtores, que não têm infraestrutura para responder às exigências.

Segundo a diretora Lucia Murat, o que se combate são “os processos kafkianos, o estabelecimento de concursos que nada avaliam sobre cinema, trazendo funcionários completamente desligados do mundo cinematográfico e com uma visão rancorosa e acusadora dos cineastas”. O produtor e diretor Marcio Curi critica o “excesso de controles, frequentemente desnecessários, redundantes, sobrepostos ou inoportunos” que “estão onerando excessivamente os custos das produções e levando a própria Ancine a não conseguir” atendê-los.

Entre outras propostas para “aperfeiçoar” a gestão da Ancine, estão a renovação automática de captação de recursos e o prazo de até seis meses para a solução das pendências relativas a projetos incentivados acumulados na Ancine. No caso das estatais, sugere-se o estímulo à transparência no processo de seleção de projetos, proporcionando o acesso ao produtor dos pareceres técnicos. Quanto ao Fundo Setorial do Audiovisual, pede-se que se considere o público não pagante (festivais, mostras, espaços públicos e associações comunitárias) como fator de avaliação do desempenho dos filmes e das empresas. Uma decisão que saiu do encontro foi a criação de uma associação de realizadores de longas-metragens, em junho.

– Com isso, haverá maior articulação entre as várias associações e se criará uma representação nacional – diz Tetê.

Procurada, a Ancine, através de sua assessoria de imprensa, disse, em nota, que os documentos “oferecem aos órgãos governamentais contribuições importantes” para o desenvolvimento da política pública do audiovisual. A nota diz, ainda: “Os pontos abordados, no que dizem respeito às atividades da Ancine, serão devidamente analisados.”

http://oglobo.globo.com/cultura/mat/2011/04/03/cineastas-pedem-ministra-…

Luis Nassif

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