Erro foi deixar a pauta da corrupção se impor sobre o avanço social, diz Franklin Martins

Cintia Alves
Cintia Alves é graduada em jornalismo (2012) e pós-graduada em Gestão de Mídias Digitais (2018). Certificada em treinamento executivo para jornalistas (2023) pela Craig Newmark Graduate School of Journalism, da CUNY (The City University of New York). É editora e atua no Jornal GGN desde 2014.
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Jornal GGN – Ministro-chefe da Secretaria de Comunicação do governo Lula, Franklin Martins disse em entrevista exclusiva concedida a Marco Weissheimer, do Sul21 publicada nesta segunda (5), que as gestões petistas cometeram um erro grave que abriu uma janela de possibilidade para o impeachment muitos anos antes desse golpe ter sido anunciado: deixou a grande mídia, braço auxiliar de uma oposição sem projetos, adotar uma agenda pautada pelo tema corrupção, em vez de colocar o avanço social acima de tudo.

Na visão de Franklin, soma-se a isso a incapacidade dos governos Lula e Dilma emplacar uma regulação da mídia que pudesse abrir um canal de comunicação com a sociedade que pudesse fazer contrapeso ao que é produzido diariamente pelos grandes veículos de comunicação. O único hiato que ocorreu na comunicação entre as antigas administrações e a população foi a eleição de 2014, quando houve algum espaço para o PT colocar seus projetos em discussão e desviar da pauta do “mau feito”.

Ao Sul21, o ex-ministro disse que apesar de o País estar caminhando para uma “convulsão social”, ele acredita que há uma chance de reverter esse cenário em outras eleições. Isso porque a oposição ainda não tem um nome de peso para colocar no páreo em 2018.

Leia, abaixo, um trecho da entrevista de Franklin Martins:

O golpe, como eu disse anteriormente, foi um negócio de ocasião articulado por diferentes atores e setores que não têm uma unidade e carecem de qualquer legitimidade. O que temos visto nos últimos dias é o governo Temer virando um mingau. Esse governo não tem qualquer possibilidade de comandar o país . É uma aberração. Gilmar Mendes e Sérgio Moro estão juntos na Lava Jato, mas o Moro acha que é preciso acabar com o Estado de Direito. Já o Gilmar Mendes não quer que o Estado de Direito acabe para a turma dele. Enquanto for só para o PT, Gilmar Mendes topa, mas ele sabe que isso pode pegar o PMDB, o PSDB, o PP, o DEM e assim por diante. Isso mostra que eles não têm unidade para ir muito a frente. Acho que o plano A deles é manter o Temer, pois é sempre ruim fazer uma substituição destas, mas o Temer pode não se agüentar também. Mas quem vier depois dele também não vai agüentar, pois a política de regressão que eles estão impondo ao país é um desastre completo que está liquidando a economia brasileira.

Em primeiro lugar, creio que é preciso entender que a reação ao golpe não teve a energia suficiente para detê-lo por causa dos nossos erros. O primeiro erro, que já referi, foi o debate político absolutamente insuficiente. As forças políticas do nosso lado ficaram paradas vendo o outro falar e fazer o que bem quis. Em segundo lugar, ao não ter enfrentado a questão do oligopólio da mídia, deixou só o lado de lá com instrumentos para falar com o amplo conjunto da população, tirando algumas situações excepcionais como a campanha eleitoral de 2014. Quando houve uma janela de igualdade de espaço no período eleitoral, foi possível reverter, mas é evidente que isso é absolutamente insuficiente para dirigir o país.

Precisamos considerar ainda o nosso sistema político que foi se montando de modo que, quem ganha a eleição majoritária, não consegue ter maioria no parlamento, sendo obrigado a negociar no varejo. O presidencialismo de coalizão é, na verdade, um nome pomposo e acadêmico para negociação permanente de varejo. Isso já está acontecendo também no governo Temer. Mas cometemos alguns outros erros importantes. Penso que, ao ser reeleita, a presidenta Dilma não percebe a gravidade da situação que estava se configurando e adotou medidas que foram vistas pela população como a adoção de parte do programa que ela tinha criticado ou, pelo menos, como o reconhecimento que a crise tinha uma gravidade que ela não tinha admitido na campanha. Acho que ela não conseguiu dialogar de modo adequado sobre esse tema com a população. Isso gerou uma perplexidade justamente em quem tinha dado a vitória para ela. Houve um sentimento de estelionato eleitoral, que é fortíssimo e quando aparece é devastador. Acho que isso paralisou o lado de cá e fez com que o lado de lá olhasse e percebesse a abertura de uma oportunidade.

Por outro lado, penso que a experiência das pessoas já está reintroduzindo a questão de fundo que é deter o retrocesso. As pessoas começam a perceber o que está acontecendo: fim das políticas sociais, precarização das relações de trabalho, perspectiva de aumento do tempo para aposentadoria, entre outras coisas. Ao verem isso, percebem que o retrocesso não é algo que só aparece no discurso. As pessoas também estão percebendo que a crise econômica não é uma herança maldita do governo da Dilma, mas sim que está sendo produzida por essa política regressiva do governo Temer. A própria questão da corrupção, que foi levantado como algo que era praticado apenas por forças ligadas ao PT, começa a ser percebida como um problema generalizado de um sistema promíscuo.

Quanto à possibilidade de um Bolsonaro da vida ser visto como uma solução, eu não vejo muitas chances disso acontecer. Olho para a frente e pergunto: que nomes eles têm para 2018, se é que eles virão para a disputa? Aécio? Não vai a lugar nenhum. Serra? Também não vai a lugar nenhum. O próprio Alckmin, ao meu ver, não sai muito de São Paulo. O Moro não segura três meses de campanha. É de uma mediocridade total. Na verdade, eles não têm um nome e, isso se deve ao fato de que eles não têm um projeto para o país. Neste processo do golpe, eles destruíram a política e inclusive os nomes deles. Quem são as grandes referências que ainda estão aí? Há o Lula que, ao meu ver, crescerá cada vez mais. Além dele, há a Marina, em decadência, que pode crescer no discurso da não política. Tem o Ciro que pode crescer e o Bolsonaro, que pode crescer, mas não ao ponto de ganhar uma eleição. Mas eles irão para uma eleição sabendo que perderão? Acho que, de moto próprio, não irão. Nós teremos força para impor a realização de eleições?

Estamos vivendo uma situação muito complexa porque não há uma hegemonia clara na sociedade. A que existia, no projeto anterior, foi seriamente atingida. Eles construíram algo com valores que não são permanentes e são insuficientes para sustentar um projeto de longo prazo. O resultado é que eles não tem respostas para os problemas da sociedade. Creio que, no médio prazo, as pessoas vão querer defender aquilo que tiveram, se o nosso lado tiver liderança e projetos que sejam capazes de fazer esse debate na sociedade. Acho que o Lula vem desempenhando um papel muito positivo nos últimos meses, mas temos um longo e difícil caminho pela frente.

A entrevista completa está disponível aqui.

Cintia Alves

Cintia Alves é graduada em jornalismo (2012) e pós-graduada em Gestão de Mídias Digitais (2018). Certificada em treinamento executivo para jornalistas (2023) pela Craig Newmark Graduate School of Journalism, da CUNY (The City University of New York). É editora e atua no Jornal GGN desde 2014.

6 Comentários

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  1. Midia
    O PT não só deixou, como patrocinou, via publicidade a mídia golpista. O Lula fingiu que não era com ele, e Dilma preferiu a Democracia do controle remoto……E nós simples mortais avisando que o Golpe estava a caminho.
    Que decepção!!!

  2. Plebiscito, referendo, debate, ideias, conceitos trabalhados.

    O que pode vencer o oligopólio da comunicação da mídia? Ideias, conceitos, esclarecimentos, debates e maturidade política.

    Em 2013 após as grandes manifestações lembro da Dilma sugerir um plebiscito da reforma política. Não avançou, se tivesse avançado a pauta teria outros aspectos agora que não só a corrupção. Sim, saber comunicar-se, saber debater, acreditar no esclarecimento à luz das ideias, dos entendimentos e domínios de conceitos. Exatamente o que temem, por isso a destruição do EM.

    A mídia cria o imaginário que querem, só a campanha do PT rompeu isso, como disse FM, ou seja, se na campanha foi assim imagina em plebiscitos com assuntos importantes? Irá revelar não só a profundidade com devemos discutir certos assuntos, mas também a superficialidade com que a mídia faz. Faltou debate de qualidade, faltou pedagogia e didática.

    Não teve força o governo para aprovar os plebiscitos? Foi isso? Ou apenas declinaram por motivos outros?

    Por que abandonaram os plebiscitos, os referendos?

    Enfim, e agora? Será que não está na hora de uma união das esquerdas progressistas na pressão dos plebiscitos? Ir às ruas exigindo participação sobre esses temas tão importantes que aqueles que estão no poder perderam a noção do quanto a população está mais crítica. É o caminho, ir às ruas e receber a repressão deles deixando claro que são eles distantes da realidade e das reivindicações, estão desafinados com os anseios e a consciência democrática que não retrocederá, avançando ainda mais.

    Não fizeram isso os estudantes de São Paulo contra Alckmin? Sofreram todo tipo de abuso e violência na luta contra a reorganização. É um exemplo maravilhoso do alto grau de discernimento,  o documentário “Lute como uma menina” de Flávio Colombini e Beatriz Alonso mostra bem isso. Enfim, um exemplo da vontadre em opiniar e participar.

    Lula é o candidato, eles falharam na tentativa de prendê-lo, agora, com essa nova campanha protegendo Temer ao mesmo tempo exaltando Moro, bom, para mim essas manifestações do último domingo estava apenas tentando criar um clima a fim de legitimar abusos para prender ou condenar Lula. Essas manifestações de domingo passado já são as eleições de 2018, estão sendo pensadas nesse objetivo principal pelos grupos e seus financiadores. Parece óbvio, sim paraece e é, mas é a partir do óbvio que devemos mesmo olhar: se conseguem emplacar esse julgamento da mídia junto ao abuso do judiciário na prisão do maior líder político do país, ora, não é isso uma vitória política – de poder – absurda? Condenar sem provas, levar a crer pela presunção de crime que o maior presidente do país tem culpa, seja esta qual for? Destruindo toda a simbologia? Quantos já não disseram isso?

    É esse o poder que querem, e é por isso que o golpe ainda não está consolidado, digo, além da fragmentação do Executivo atual – resultado de um evidente impostor no poder – e as forças de ocasião que se juntaram pelo impeacment e tomada de poder, apesar da costura feitan essas amarras (interesses) se encontram em conflitos. Resta a nós buscar a organização antes que eles ajeitem essas amarras, Carmem Lúcia está empenhada nisso e já cobra Temer.

    O que vai acontecer? Quem sabe?

  3. LULA e o PT erraram feio, mas Dilma fez muito pior

    Dilma vestiu a fantasia de “heroína da luta contra o mal feito” e a partir daí as coisas ficaram “sombrias”, para dizer o mínimo. Por incompetência ou por um projeto político pessoal, Dilma acreditou, até passarem a corda em seu pescoço, que sairia ilesa de todo o caos instaurado pelos desmandos do judiciário. Se ela acreditou mesmo que seria a presidente que “salvaria” o Brasil da corrupção, se tinha um projeto sombrio de passar a limpo o PT e herdar o que sobrasse, ou se foi apenas uma tonta que entregou nossa democracia de mão beijada, só a história esclarecerá.

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