Fernando Horta
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A História como arma, por Fernando Horta

A História como arma

por Fernando Horta

No início desta semana, o chefe da CIA no governo Trump, Mike Pompeo, sugeriu que a agência estaria trabalhando com o México e a Colômbia para depor o governo de Nicolás Maduro. A CIA tem inúmeras “covert actions” na sua história, e o que impressiona é que seu chefe tenha falado de uma delas. De fato, a ação na Venezuela não é mais “covert” há muito tempo. Tanto Capriles quanto Leopoldo López receberam auxílio logístico e até financeiro da CIA, faltava a confissão que Pompeo deu.

Muitos dirão que esta confissão demonstra, “mais uma vez”, que o Brasil também é alvo da CIA e que 2013-2016 seria, então, uma consequência da voracidade yankee. Eu creio que neste tipo de afirmação joga um papel forte o nosso complexo de vira-latas. Entendemos que sequer um golpe nós não temos capacidade de dar sozinhos. É muita falta de fé na nossa direita e nas nossas elites.

Não nego que estas ações possam realmente ocorrer, mas os maiores atores do golpe brasileiro são a elite capitalista (daqui e de qualquer lugar do mundo) e nossa elite política. Ainda vamos levar um tempo refletindo e pesquisando sobre os eventos no Brasil, mas, se vamos usar a Venezuela para pensar o Brasil, convém tomarmos um cuidado de ver tudo. Antes da CIA e, talvez, do próprio exército norte-americano agirem por lá, os conservadores norte-americanos já colocavam suas garras naquele país. Sempre primeiro os interesses privados se fazem estabelecer e só após, um tanto quanto relutante, o Estado norte-americano se movimenta.

Em 1999, assumia a presidência da Venezuela o coronel do Exército Hugo Chávez. Ele governaria durante 14 anos (até sua morte em 2013). Eleito com 56% dos votos em 1998, já em abril de 1999 houve a chamada de uma assembleia constituinte, que foi ratificada por voto popular em dezembro do mesmo ano, por 72% dos votantes. Em 2000, Chávez teve 60% dos votos (contra pouco mais de 37% do seu opositor), em 2004 a oposição chamou um “referendo revocatório” para tentar afastar Chávez do poder, e este teve mais de 5,9 milhões de votos de apoio, num total de 10 milhões.

Se é verdade que a abstenção seguiu crescendo nas eleições venezuelanas (em 2005, nas legislativas, chegou a 75%), também é verdade que Chávez seguia fazendo eleições e vencendo. Em 2006, foi eleito com 62% dos votos, em 2008 seu partido conquistou a maioria das eleições regionais e em 2009 Chávez emendou a constituição através de referendo para retirar o limite de reeleições, tendo obtido 55% dos votos. A oposição, já há muito articulada barrou a reforma constitucional de 2007 e comemorou em 2010 que Chávez não tinha conseguido 2/3 do parlamento. Em 2012, Chávez foi reeleito com 55% dos votos (na vitória sobre Capriles) e nas eleições regionais (ocorridas em dezembro) o partido de Chávez ganhava 20 dos 23 cargos para governadores de regiões.

Nos 14 anos de governo de Chávez, ele propôs 13 sufrágios (entre eleições e referendos), a maioria acompanhado por observadores internacionais, como o próprio presidente norte-americano Jimmy Carter. Este foi o fenômeno que impressionou às elites norte-americanas. Especialmente entre 1999 e 2001, Chávez era o principal inimigo dos EUA, muito por ter implementado sua constituição bolivariana e lutado por aumentar os preços do petróleo venezuelano que se destinava aos EUA. Em setembro de 2000, Chávez dizia, com razão, que o barril de Coca-Cola era mais caro que o barril de petróleo. O barril de Coca Cola (se ela fosse vendida em barril) custava quase US$ 79, enquanto o de gasolina custava US$ 59 dólares.

Estes dois primeiros anos foram cruciais para os ataques a Chávez. A intelligentsia americana ficou sem entender como aquele coronel conseguia tanto apoio popular, parecendo desconhecer que em 1999 mais de 4,8 milhões de venezuelanos viviam em situação de extrema pobreza e sem acesso a saúde. Isto significava um quinto da população. Se contadas apenas sobre a parcela indígena, o grau de pobreza extrema atingia mais de 50% em 1999.

Não havia a necessidade de qualquer maior evidência do que os indicadores brutos econômicos, para se ver o fracasso do Estado venezuelano até 1998. Mas os think tanks dos EUA não podiam aceitar a realidade. Postaram-se a arrumar uma outra explicação para o “fenômeno” Chávez e vieram com um absurdo: a reutilização do termo “populismo”. A primeira arma contra a revitalização da América Latina no século XXI, se ancorava no colonialismo intelectual que nossas elites sempre compram.

Décadas foram necessárias para que os pesquisadores de América Latina conseguissem a construção de um arcabouço de teorias e conceitos que fossem genuinamente produzidos na região, com significação e correção empírica. O termo “populismo”, por exemplo, passou desde a conceituações dos italianos Gino Germani e Torcuato di Tella, ainda na década de 40, até chegar a Ernesto Laclau, no século XXI, por inúmeras correções, pesquisas e discussões. Terminou, totalmente enviesado, em textos de jornalistas que mal sabiam do que falavam. Dali eram consumidos por uma classe média desprovida de ferramental intelectual e capacidade crítica, para ser apresentado com um viés negativo. Uma mácula na América.

Não, a América Latina não se transformava em “populista” a partir de Chávez. O conceito partia de uma visão errada de traição. Era usado para designar uma política de perfídia em que um governante carismático enganava a população, obtendo seus votos. Foi esta a primeira arma da luta norte-americana contra as mudanças políticas e econômicas na América Latina. É significativo que hoje Trump seja conceituado como “populista”. Mostra o quanto o conceito serve apenas politicamente aos grupos que o usam. Na esteira do “enganar o povo”, a narrativa sobre a Venezuela nunca mudou, e, para piorar, toda a América Latina foi engolfada. Do “populismo” para o “período de maior corrupção da história” foi um passo. Mesmo jornalistas malformados e mal-informados, ainda hoje, repetem este discurso.

O Populismo foi um fenômeno latino-americano que teve seu auge entre as décadas de 30 e 50, na América Latina. Os nomes mais conhecidos são Getúlio Vargas no Brasil, Juan Domingos Perón na Argentina e Lázaro Cárdenas no México. Mas, o número de líderes populistas é muito maior, entrando no grupo o peruano Victor Raul Haya de la Torre, o equatoriano José Maria Velasco Ibarra ou o colombiano Jorge Gaitán, por exemplo. O conceito é baseado em cinco características: (1) ocorre em países em meio aos processos de industrialização e urbanização, (2) com o controle dos meios de comunicação na mão do Estado ou sujeitos a este (naquele momento o rádio), (3) aproveitando-se da formação dos primeiros núcleos de proletários para monopolizar as organizações sindicais através (4) da figura carismática de um governante conciliador por meio de (5) um discurso nacionalista de defesa tanto do trabalho quanto do capital. É preciso que se tenha TODOS estes pontos para se caracterizar o líder como “populista”.

A corruptela do termo, utilizado para deslegitimar as mudanças latino-americanas, falava apenas do líder carismático que enganava os trabalhadores. A assim foi feito. É fácil ver as diferenças para o fenômeno do final do século XX, e todas elas foram ignoradas numa campanha de difamação que atingiu diretamente Chávez, Rafael Correa, Evo Morales, os Kirchner e, depois, chegando a Lula. Não foi a CIA, ou o Departamento de Estado que lançaram os primeiros ataques às revoluções sociais na América Latina pós-neoliberalismo. Também as armas não eram agentes secretos ou pressões econômicas. As primeiras e mais profundas agressões vieram a partir de um colonialismo intelectual, usando erradamente o conceito de “populismo”. A primeira arma foi, portanto, a narrativa histórica.

Fernando Horta

Somos pela educação. Somos pela democracia e mais importante Somos e sempre seremos Lula.

11 Comentários

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  1. Soberania x Síndrome de Vira-lata

    Repito aqui um comentário que deixei no blogue do Romulus:

    A nossa “elite” é muito, muito, muito, muito burra. O Brasil é um dos poucos países do mundo que dispõe de condições materiais e humanas para ser uma grande potência (em todos os sentidos). É um dos poucos países que poderia ser realmente soberano (jamais vou me esquecer do que disse o Putin nas famosas entrevistas: “São poucos os países do mundo que são soberanos. Os outros são clientes. E são clientes *porque escolheram ser clientes*.”). Tirando as  limitações conjunturais e estruturais, tínhamos um projeto de país e de inserção no mundo que almejava esse propósito. Cacete! Às vezes, não sei o que é pior, se a situação do México (“tan lejos de dios y tan cerca de los Estados Unidos”) ou a do Brasil (“deus é brasileiro, mas a Câncer também”). O nosso projeto de soberania é constantemente sabotado justamente por aqueles que MAIS SE BENEFICIARIAM DISSO. Simplesmente, não dá para entender. A gente acaba chegando à conclusão de que a síndrome de vira-lata do brasileiro é atávica. Não tem outra explicação.

    Recomendo, como sempre, a leitura do blogue do Romulus: http://www.romulusbr.com/2017/07/bomba-os-marinho-colocaram-globo-na.html#more

  2. O invasor consentido.

    A ação da influência externa atua de forma parecida com a entidade obsessora definida no universo espiritual. A entidade não baixa se não tiver um corpo que a receba. Mas a entidade alienígena invasora encarnada, o Agente, tem alguns truques que a sua semelhante espiritual não tem. São as ONGs, as Fundações e tantas outras organizações, como a GLOBO, financiadas pelo poder controlador do Agente, que atuam fortemente na criação da predisposíção, seleção e preparação de candidatos a serem incorporados pelos representantes do Agente. Gloria Alvarez deve ser o melhor exempl de sucesso desse trabalho de prospecção e cooptação de quadros realizado nos mais variados ambientes sociais, inclusive (e principalmente) em corredores de escolas e universidades. Tem alguns casos de insucesso vexatório, como o Kim Kataguiri, por exemplo, mas nenhum sistema de inteligência é perfeito, afinal. O fato é que,com o MPL (não confundir com MBL) e meia dúzia de grupos amadores trabalhando na internet voluntariamente nunca haveria a menor possibilidade de fazer uma mobilização daquele tamanha, em todo o território nacional, com milhões de pessoas na rua que não sabiam muito bem ao que vieram e por que lá estavam.

    https://www.youtube.com/watch?v=qdMaU-npoaw

    No creo en las brujas, pero que las hay, las hay!!

    Evidentemente que qualquer serviço de inteligência, que se preze, deve atuar e atua com total discrição justamente para não ser flagrado nas trapaças de que participa. A não ser quando se envolvem com o governo golpista e são apresentados e desmascarados pelo Etchegoyen. 

    https://www.brasil247.com/pt/247/midiatech/302209/Deu-no-%E2%80%9CNY-Times%E2%80%9D-Etchegoyen-%E2%80%9Centregou%E2%80%9D-chefe-da-CIA-PF-tamb%C3%A9m.htm

     

  3. A propósito, em inglês…

    O termo POPULISTA (POPULIST) nunca teve conotação negativa – algo relativamente recente e fruto do uso e abuso por parte de *jornalistas*. Ao contrário, significava alguém que apoiava as pessoas comuns.

    pop·u·list [póppyəlist]
    noun (plural pop·u·lists)

    supporter of ordinary people: an advocate of the rights and interests of ordinary people, for example, in politics or the arts

    adjective
    of ordinary people: emphasizing or promoting ordinary people, their lives, or their interests

    [Late 19th century. Formed from Latin populus “people” (see popular).]
    Microsoft® Encarta® Reference Library 2005. © 1993-2004 Microsoft Corporation. All rights reserved.

    populista
    substantivo

    apoiador das pessoas comuns: um defensor dos direitos e dos interesses das pessoas comuns, por exemplo, na política ou nas artes

    adjetivo
    de pessoas comuns: enfatizar ou promover pessoas comuns, suas vidas ou seus interesses

    1. Sim
      Inclusive, no início do século XX havia um Partido Populista americano, que perdeu as eleições mas de que algumas de suas propostas foram adotadas posteriormente.

  4. Todos os intelectuais e

    Todos os intelectuais e jornalistas sabem a história da Venezuela, todos sabem nossa própria história,

     

    se repetem velhos chavões para desancar adversários ou ancorar suas teses bizarras o fazem de má-fé simplesmente. E em que periodo da História a midia foi honesta? Os estudinidenses tiveram participação direta no golpe, não esperem ataques de sincericídio, mas e a reativação da quarta frota? E as promessas de politicos a empresas estrangeiras? Tudo isso tem o dedinho podre deles……….

  5. Fernando – coordenação c/ “Matriz” é voluntária.

    Não precisa de “ordem de fora”… às vezes opera-se até mesmo inconscientemente (como no caso dos Procuradores da Lava a Jato, devidamente “catequizados”).

    Tome a Globo como exemplo:

    Bomba: os Marinho colocaram a Globo na roleta do Cassino!

    Por “Dom Cesar” & Romulus

    No popular:

    – Os Marinho estão saindo fora!

    E, por isso, querem a grana toda…

    – … in cash!

    Com a moeda nacional desvalorizada, o país fica “barato” e o poder da “alavanca” de quem tem dólares torna-se muito maior.

    Some a isso, ainda:

    (i) a depressão econômica, barateando os ativos brasileiros no geral;

    e, no particular…

    (ii) a implosão de setores inteiros da economia nacional, via Lava a Jato.

    Resultado: xepa!

    E aí…

    Quem tem dinheiro na mão – a tal da “liquidez”… – é rei!

    *

    “Aposta na aposta, na aposta, na aposta, na…”

    – Os Marinho apostam no seu poder de viciar a “roleta do Cassino”, via Rede Globo…

    Para…

    Ao final…

    – Ganharem, também, na sua aposta principal: a especulação financeira.

    Haja alavancagem: um verdadeiro castelo de cartas!

    *

    “Castelo de cartas”…

    A espera de um…

    – … sopro??

     

    LEIA MAIS »

  6. No Brasil o maior entrava ao seu desenvolvimento é o

    No Brasil o maior entrava ao seu desenvolvimento é o cartel de mídia. O controle dos meios de comunicações garantem a hegemonia das oligarquias sobre o povo brasileiro. Sem enfrentar o PIG não há saída para o nosso atraso.

  7. populismo e fascismo

    Dado os nomes aos bois, concluimos que os líderes mencionados como “populistas” seguiam tendências fascistas. Leiam esta frase que pontuarei, mas pensem que ela é o fim do meu comentário: “por isto penso que fascista é um elogio à nossa direita, pois nem isto conseguem ser.”

    A conclusão que faço deriva dos cinco requisitos para ser um populista , enumerado pelo Fernando. Todos eles realmente são presentes nos caudilhos famosos que foram citados.

    O populismo, de um modo geral, analisado sob a ótica da razão, não é mal. Ao menos tem uma autoridade central, que afasta tentações corruptas do toma lá da cá, tem algum comprometimento com a classe trabalhadora, ainda que afague o capital ( é aquela história de ser pai dos pobres e mãe dos ricos que denotava Getúlio Vargas) e por fim, tem um nacionalismo que , por sim ou por não , proteje a nossa indústria.

    Recentemente pode-se falar em populismo de esquerda, já que embutiu nos governos uma preocupação com projetos sociais, incluindo-se Lula , Chavez , Correa , etc. que, não são comunistas, pois mantém a propriedade privada, mas que intervém nesta propriedade a guisa de práticas sociais.

    O que ocorre no Brasil, com sua elite de direita é o mais sujo e indecente modo de governar contra o povo. Não há comprometimento algum com qualquer coisa ,a não ser o bolso deles.

    Populistas não são, pois não lideram nada, não protejem ninguém e não preservam ninguém. neste momento, insiram a frase em negrito.

  8. Foi um termo que mudou muito a conotação

    O termo “populista” mudou muito a conotação desde que foi cunhado no século 19. Originalmente lançado na Rússia czarista, passou pelos EUA dos primeiros líderes trabalhistas, mas desde a metade do século 20 tem sido monopolizado pela América Latina, que fixou a acepção atual do termo: um líder carismático que se dirige diretamente às massas prometendo um grande salto que as livrará de sua condição desfavorecida, desde que confiem nele e o mantenham no poder. Acusado por uns de subversivo e por outros de conciliador de classes, a impressão que fica é a de um enganador, um bom ator ou animador de programas de auditório, daí a conotação pejorativa.

    Hugo Chávez não foi capaz de relançar o socialismo no século 21, a não ser como farsa, mas efetivamente lançou o populismo do século 21, onde não apenas pareceu, mas efetivamente se conduziu como um animador de programa de auditório, até com programa de TV próprio. De resto, a Venezuela vive mais um episódio do mesmo enredo lançado desde a descoberta do petróleo 100 anos atrás: surtos de prosperidade quando o preço do barril sobe, seguidos por recessão, desordem e queda do governo quando o preço do barril cai. E por aqui os cometaristas repetem a litania do golpe patrocinado pela CIA. A História se repete, sim, mas não com o mesmo significado. Primeiro tragédia, depois farsa. Após o fim da Guerra Fria, os EUA não tem mais qualquer necessidade de depor governos latino-americanos, ainda mais um governo que tem os EUA como principal parceiro econômico e comprador de seu petróleo.

    Outra repetição obsessiva dos cometaristas é culpar a mídia pelo fato da maioria da população não concordar com eles. Clamam pela tal “regulamentação da mídia”. Foi feita a Argentina e na própria Venezuela. Adiantou?

  9. Achei o texto brilhante e

    Achei o texto brilhante e esclarecedor. Tome pau – mais que merecido, dga-se – na classe intelectual: acadêmicos de todas as disciplinas, intelectuais, jornalistas, etc. Isto tem uma razão única: a promiscuidade entre a atividade intelectual e as estruturas de poder. Para além das insttuições politicas, a reprodução e retroalimentação de certos paradgmas sociais (elitismo, academicismo, corporativismo e até práticas de exclusão de agentes e produções “abaixo da torre de marfim”).

    O maior exemplo disto no Brasil é a USP. Só agora aprovou à meia-boca o regime de cotas, talvez apostando na eficácia de mecanismos de exclusão e patrimonialização institucional. Na Faculdade de História, no anos 90, por exemplo, era jargão acadêmico a afirmação de que ali “era fácil entrar, porém, difícil de sair”, devido a um suposto “altíssimo nível acadêmico” para o qual o aluno oriundo de escolas públicas não estaria devidamente preparado.  Isto justificava os 90% de evasão dos recém ingressados. Só desconsideravam, claro, as aulas faladas em francês por um certo Motinha – chefe do departamento à época – que comemorava abetamente a visão de ma sala vazia, depois de uma semana de aula: “Que beleza! Os trouxas cairam!” Só pra ficar em um dos inúmeros exemplos de atitudes justificadas por uma cada vez mais aceita “horizontalidade de conteúdo e dos processos de avaliação”, que nada mais é que o direito de fazer do conteúdo e das avaliações o que bem entender sem ter que dar satisfações ao Estado, ao Deparamento ou ao MEC. Tudo em nome da liberdade intelectual e, pasmem, da liberdde de pensamento e autonomia do educador. Quanta iberdade, não? Ou seria liberalismo, mesmo?

    Sintomático é que um departamento de Humanidades, dos mais influentes na construção e preservação da memória e da História do país, tenha servido de balão de ensaio para a inculcaçao de práticas tão coservadoras. Lá, se prodz e se pratica conservadorismo sem que ninguém, até o momento, consiga questionar tamanha credibilidade para tal. Daí a impotânca de textos como este do Fernando Horta. Para mim, esta “liberdade de pensamento” exigida pela academia, nada mais é que a precursora “light” de iniciativas “hard” tais como o “Escola sem Partido”.

    A esquerda tem de parar de ser boba e achar que todo intelectual se presta a mudar a sociedade pra melhor.

  10. Quem escolhe os termos?

    O termo “liberalismo” foi escolhido para designar uma corrente de pensamento político-econômico capitalista.  A ligação óbvia com a ideia de liberdade esconde mais do que revela sobre a realidade dessa ideologia no mundo de hoje.  Quando se percebe que a liberdade apenas para os poucos ricos está associada à espoliação de milhões de pessoas, a palavra não parece adequada, porque não descreve a realidade.  No entanto, esse termo continua consagrado em todas as academias do mundo.

    Creio que a ideologia hegemônica se impõe e coloniza a produção científica e esta é a razão de usarmos até hoje o termo populismo para alcunhar (pejorativamente, sim!) qualquer governo que tenha em sua agenda os interesses do povo.  Por outro lado, usa-se o vocábulo “liberalismo” para referir-se à plutocracia estadunidense, a maior democracia de fachada do mundo.

    Então, concordo plenamente com o autor, no entendimento de que o mau uso do conceito de populismo, para referir-se a qualquer governo popular, revela ignorância e viés ideológico escancarado.  Neste caso, não é apenas um termo científico infeliz e mal utilizado, é um pejorativo ideológico calcado no mais ordinário senso comum para alimentar a ignorância do público.

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