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O Grupo de Pesquisa em Financeirização e Desenvolvimento (FINDE) congrega pesquisadores de universidades e de outras instituições de pesquisa e ensino. O Grupo de Estudos de Economia e Política (GEEP) do IESP/UERJ é formado por cientistas políticos e economistas.
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O Papel do Estado e do Sistema Financeiro na Transição para o Desenvolvimento Sustentável

Um sistema financeiro robusto, funcional e orientado para a sustentabilidade é uma pré-condição para a realização da transição verde.

Blog: Democracia e Economia  – Desenvolvimento, Finanças e Política

Convergência de Expectativas: O Papel do Estado e do Sistema Financeiro na Transição para o Desenvolvimento Sustentável

por Fernanda Feil e Carmem Feijó

O século XXI marca uma época de transformações ambientais, tecnológicas, econômicas e sociais sem precedentes. A emergência climática, em particular, tem se manifestado de formas cada vez mais tangível e preocupante, impondo desafios multidimensionais para sociedades em todo o mundo. Em meio a esses desafios, a transição para uma economia verde sustentável torna-se essencial para garantir a própria continuidade da vida na terra. Esse processo resultará em uma reestruturação massiva e estratégica de ativos e riqueza global, fruto das consequências da crise climática.

Neste contexto, o sistema financeiro desempenha um papel de destaque. Longe de ser um mero intermediário na gestão de riscos e retornos de recursos, o sistema financeiro pode, por sua natureza e escopo, catalisar ou obstruir a evolução em direção a uma economia mais verde. Para contribuir para a transição verde, deve estar estruturado para ofertar liquidez em volume e a um custo compatível para  impulsionar enormes volumes de capital necessários para a transformação de uma economia ecologicamente sustentável. O sucesso nessa direção determina sua funcionalidade para a  transição verde sustentável.

O Brasil, com sua rica história de bancos públicos atuantes, proporciona uma lente interessante por meio da qual a transição verde sustentável pode ser financiada. Os bancos públicos, tradicionalmente, têm desempenhado um papel significativo no financiamento ao investimento produtivo, atuando em áreas, setores e com prazos não cobertos pelo setor financeiro privado. Em um momento em que o desenvolvimento sustentável é uma prioridade global, a convergência da funcionalidade financeira e do desenvolvimento sustentável torna-se mais relevante do que nunca. Um sistema financeiro robusto, funcional e proativamente orientado para a sustentabilidade é uma pré-condição para a realização da transição verde.

A expansão dos investimentos produtivos em escala e velocidade necessários ao cumprimento das metas de mitigação do aquecimento global implicam que o setor financeiro se desenvolva comprometido com a transição climática. Isso implica na incorporação da sustentabilidade como pilar central  no fomento de tecnologias verdes inovadoras, que gradualmente substituirão as práticas obsoletas poluidoras e pouco eficiente no uso dos recursos naturais. O setor financeiro comprometido com a transição climática deve ser protagonista no processo de realocação estratégica de capital. Além disso, um desenvolvimento verdadeiramente sustentável é aquele que promove a equidade distributiva em todo território. O desafio que se apresenta é colossal e a urgência é palpável: esta década é decisiva para instaurar as mudanças necessárias.

O papel do sistema financeiro nas economias modernas é o de prover liquidez. No comprometimento da transição climática, o sistema financeiro deveria, idealmente, favorecer o investimento ecológico e socialmente responsável. Porém, investimentos ecologicamente sustentáveis são de retorno incerto, dado que envolvem a incorporação de inovações. Como competir com projetos de investimento em áreas, setores e empresas, com histórico de realizações mais conhecidos? Neste contexto é que se questiona a funcionalidade de um sistema financeiro privado em atuar com o protagonismo exigido no processo de transição climática. No caso do Brasil, em particular, a histórica presença de instituições financeiras públicas liderando grandes transformações produtivas, reforça a ideia de que a transição climática deve ser guiada por instituições financeiras públicas, atuando em parceria com instituições financeiras privadas. Assim, reconhece-se que o sistema financeiro tem a capacidade de direcionar investimentos, favorecendo projetos, setores e inovações tecnológicas que garantam a transição verde sustentável. Porém, dada as incertezas envolvidas no processo de transição climática, o financiamento público, operando como extensão das políticas públicas voltadas para a sustentabilidade, deverá guiar a alocação de recursos.

A concretização bem-sucedida da transição verde exige um aporte substancial de recursos que deve ser disponibilizado em prazo compatível com o amadurecimento dos projetos de investimento. Inicialmente, deve haver criação de liquidez que induza  empreendimentos sustentáveis. Em linha com autores como Schumpeter e Keynes, o  que o investidor precisa é de crédito, e cabe ao setor financeiro disponibilizá-lo abrindo mão de sua liquidez. Em economias modernas, com sistemas financeiros sofisticados, liquidez não se confunde com  poupança, que é um fluxo de renda criado após o investimento ser realizado.

A disposição em ofertar liquidez é intrinsecamente atrelada às expectativas e ao grau de confiança nas expectativas Neste contexto, o compartilhamento de uma convenção social em prol do desenvolvimento sustentável emerge como um elemento essencial para a concretização de projetos coordenados de transição climática. O comprometimento das instituições de Estado, ao assegurar que todas as suas políticas estejam alinhadas com este objetivo, reforça uma percepção coletiva e consolida a crença na sociedade de que a transição para um paradigma verde e sustentável é não apenas desejável, mas inevitável. Ou seja, cabe ao aparato estatal orientar e convergir as expectativas sociais em direção à efetiva promoção da transição sustentável. Nessa dinâmica, o sistema financeiro, percebido como parte de um ecossistema institucional mais amplo, desempenha um papel crucial, proporcionando a liquidez necessária e, simultaneamente, capitalizando-se nas expectativas vinculadas a essa transição.

Em conclusão, para uma transição verde sustentável bem-sucedida, é vital que o sistema financeiro esteja integrado e alinhado com objetivos de transformação produtiva na direção do crescimento ecologicamente sustentável e socialmente justo.  As instituições financeiras públicas, ao operarem como braços de política pública, têm o potencial de catalisar essa transição, garantindo a liquidez necessária e direcionando recursos de maneira estratégica para iniciativas verdes sustentáveis.

Fernanda Feil – Professora credenciada no Programa de Pós Graduação em economia da UFF, pesquisadora do Finde/UFF e do GEEP/Iesp

Carmem Feijó – professora da Universidade Federal Fluminense e coordenadora do Grupo de Pesquisa em Financeirização e Desenvolvimento (Finde)

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O Grupo de Pesquisa em Financeirização e Desenvolvimento (FINDE) congrega pesquisadores de universidades e de outras instituições de pesquisa e ensino, interessados em discutir questões acadêmicas relacionadas ao avanço do processo de financeirização e seus impactos sobre o desenvolvimento socioeconômico das economias modernas. Twitter: @Finde_UFF

Grupo de Estudos de Economia e Política (GEEP) do IESP/UERJ é formado por cientistas políticos e economistas. O grupo objetiva estimular o diálogo e interação entre Economia e Política, tanto na formulação teórica quanto na análise da realidade do Brasil e de outros países. Twitter: @Geep_iesp

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