Aquiles Rique Reis
Músico, integrante do grupo MPB4, dublador e crítico de música.
[email protected]

Jongo, o pai do samba carioca, por Aquiles Rique Reis

O disco é uma realização de Marcos André, cantor e dançarino que ingressou no Jongo da Serrinha em 1995 a convite do mestre Darcy do Jongo

Jongo, o pai do samba carioca, por Aquiles Rique Reis

Hoje vamos de um álbum histórico, Jongo do Vale do Café (independente), um verdadeiro documento de referência. Originário de Angola, o jongo veio para o Rio com os escravos, trazidos para o trabalho forçado nas senzalas do Vale do Café, às margens do rio Paraíba do Sul.

            Penso: o ponto do jongo é o reflexo do sentimento libertário de um contingente de inconformados com a condição de escravos a que foram submetidos por senhores feudais, que os condenaram ao desterro e à humilhação.

            O disco, uma realização de Marcos André, cantor e dançarino que ingressou no Jongo da Serrinha em 1995 a convite do mestre Darcy do Jongo, reúne mais de 40 cantantes e percussionistas.

            Para a gravação, ajuntaram-se dois quilombos centenários, o Jongo do Quilombo São José e o Jongo de Pinheiral, comunidades que se uniram aos novos jongueiros do Morro da Serrinha, em Madureira. Nasceu um CD totalmente dedicado ao gênero musical que está no cerne da música brasileira.

            Registrado em apenas uma semana, num estúdio montado ao ar livre no meio de uma floresta localizada numa comunidade quilombola, o disco é uma obra precisa e definitiva sobre o jongo. Com 32 pontos seculares, toda a ancestralidade jongueira foi, então, registrada ali pela primeira vez.

            As mulheres entoam a maioria dos pontos. Suas cantorias vêm envoltas pelo toque do caxambu e do candongueiro, tambores centenários escavados num tronco, como os talhados em Angola. Somente em um dos pontos ouve-se um cavaquinho, de resto é o som mântrico das vozes e da pele dos tambores que soam como um gozo silente, delicado e encandecido pelo ardor – belo, mas sofrido como uma dor de dente.

            Bem, eis aqui um disco que merece ser ouvido por quem precisa saber de si e de sua história. Aula civilizatória ao alcance de quem quiser se banhar em Brasil.

            Acessem uma das inúmeras plataformas musicais e, por favor, ouçam as 27 faixas de Jongo do Vale do Café. Ao ver que estão impregnados de uma ancestralidade poderosa que lhes tirará do prumo e os enlevará, deixem-se arrepiar. Permitam-se emocionar com o que ouvirem. Sim! Nós somos parte da história dessa cultura milenar. 

Aquiles Rique Reis

Nossos protetores nunca desistem de nós

Ficha Técnica:

Realização, pesquisa e direção artística: Marcos André; produção: Rede de Jongo do Vale do Café; direção musical: Marcos André e Thiago da Serrinha; engenheiro de som e gravação: Philippe Ingrand (Doudou do Som); mixagem: Doudou do Som e Marcos André; masterização: em maio de 2023 na Califórnia por Ken Lee Mastering.  

Vozes: 

Jongo de Pinheiral: mestras Fatinha, Meméia e Gracinha, Cintian e Dede; Jongo do Quilombo São José: Mãe Tete, Seu Jorge, Pádua, Gilmara, Luzia, Luciene, Carmen, Jorgina, Santinha e Lucia Helena; Jongo da Serrinha: Rodrigo Nunes, Marcos André, Babalorixá Dário de Ossain, Thiago da Serrinha, Nina Rosa, Hamilton Fofão e Joyce Ellen.

Tambores: Pádua, Jorjão, Anderson Vilmar, Thiago da Serrinha, Geovane, Valdeci, Vitor e João. Cavaquinho: Hamilton Fofão.

0 Comentário

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

Você pode fazer o Jornal GGN ser cada vez melhor.

Apoie e faça parte desta caminhada para que ele se torne um veículo cada vez mais respeitado e forte.

Seja um apoiador