A expansão da autotutela deve ser combatida pelo Estado

Morreu o jornalista atingido por uma bomba. O responsável pelo crime ainda não foi localizado pela Polícia, mas isto terá que ser feito. Homicídio por motivo fútil com uso de explosivo é crime grave cujo processo é público e independe da vontade dos familiares da vítima.

 

Ao menos num aspecto esta tragédia é muito parecida com os crimes que praticados por cidadãos de bem que resolveram amarrar seus inimigos aos postes cariocas. Nos dois casos os autores das condutas delitivas agiram movidos por razões político/ideológicas como se pudessem substituir o Estado. A vingança privada dos cidadãos que amarram suspeitos aos postes é  semelhante à ação direta do militante contra a violência policial. Ambas são modalidades de autotutela proibida pela legislação em vigor.

 

Em 2007 publiquei o texto abaixo na internet. Os sintomas que identifiquei estão piorando, portanto, reproduzirei o texto aqui a fim de possibilitar uma amplificação do debate.

 

“Até o presente momento a questão da violência tem sido pensada sob a ótica da tipificação  criminal de determinadas condutas, da unificação das polícias e, principalmente, do aumento das penas. Parece que cegados pela mídia os legisladores brasileiros estão esquecendo o principal.

Quando procura o Judiciário, o cidadão é movido menos pelo ódio e desejo de vingança do que pelo medo de fazer justiça pelas próprias mãos. Cada processo é, na verdade, a expressão burocrática de uma ferida aberta na sociedade. Cabe ao Poder Judiciário remediar o mal estar provocado pelo conflito restabelecendo a harmonia ou a paz social.  Se o Estado é incapaz de rapidamente satisfazer uma pretensão justa ou afastar a injúria de uma injusta pretensão, a tendência natural do cidadão é perder o medo de seu igual e odiar o Governo.  E a História é pródiga em exemplos de governos que caíram porque foram mais odiados que temidos.

Nesse sentido, pode-se concluir que o Poder Judiciário é um dos sustentáculos do Estado. É por isto que o mesmo deve ser célere, eficiente e eficaz.

A rapidez na solução do conflito dá ao cidadão a certeza de que sua pretensão não será esquecida, de que ele deve ser justo e evitar deduzir em Juízo uma pretensão injusta porque será rapidamente punido. A eficiência confere ao Estado a respeitabilidade em razão das decisões serem de boa qualidade. A eficácia infunde em todos o temor da efetividade da repressão do Estado para punir o culpado, restabelecer as coisas ao estado anterior e obrigar aquele que demandou injustamente a arcar com as despesas judiciais.

No Brasil o Poder Judiciário é lento, ineficiente e ineficaz. O acumulo de trabalho é absurdo. Qualquer um que consulte as estatísticas judiciárias perceberá que, na melhor das hipóteses, estamos á beira de um colapso. No STF, STJ e TST milhares de processos aguardam julgamento. Nos TJs, TRTs, TRFs, centenas de milhares estão sendo julgados a cada ano. Nas Varas Cíveis, Varas Federais e Varas do Trabalho milhões de casos aguardam julgamento ou estão sendo executados.  

A excessiva carga de trabalho dos serventuários e dos magistrados acarreta a ineficiência do serviço e propicia a corrupção. A qualidade das decisões do Poder Judiciário é comprometida em razão da quantidade de trabalho. Por fim, o exercício da jurisdição é ineficaz porque milhares de sentenças (criminais, cíveis, trabalhistas…) não são cumpridas.  

Ao contrário do que pensam alguns políticos a população brasileira é inteligente. Ela percebeu a progressiva ineficácia do Poder Judiciário. Para qualquer lado que olhemos, se observarmos com atenção, veremos que os bons cidadãos sentem-se frustrados e os maus cidadãos sabem-se impunes. PORTANTO, AO CONTRÁRIO DO QUE TEM AFIRMADO A MÍDIA NÃO ESTAMOS DIANTE DE UM AUMENTO DA VIOLÊNCIA E SIM DA PROGRESSIVA SUBSTITUIÇÃO DA SUBMISSÃO AO PODER JUDICIÁRIO PELA AUTOTUTELA. É fundamental reformar, ampliar, tornar célere, eficiente e eficaz o Poder Judiciário. Contudo, isto de nada adiantará se a corrupção e o nepotismo continuar a abalar sua respeitabilidade. E esta é uma questão realmente delicada. Afinal, a CF/88 assegura a autonomia e a independência dos poderes. Será preciso, então, inventar uma forma de convencer o Poder Judiciário zelar pela autonomia e  independência lhe conferidas pela Constituição sob pena de perdê-las temporariamente.”  http://www.migalhas.com.br/mig_leitores.aspx?cod=4594&datap=19/08/2007

 

Somente o Estado pode distribuir Justiça. Não só isto, o Estado nunca deve renunciar ao seu poder/dever, nem permitir que o mesmo seja de fato exercitado por milícias cristãs ou militantes de esquerda. A autotutela é e deve continuar a ser vigorosamente coibida dentro dos limites da legalidade. Caso contrário a barbárie se tornará a regra, com todas as consequencias indesejadas para todos os cidadãos, que se verão em algum momento tragados pelo clima de guerra civil que está sendo metodicamente construído por aqueles que acreditam poder colher dividendos políticos em razão do caos social. 

Fábio de Oliveira Ribeiro

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