Não há conciliação possível em um mundo movido à exploração, por Antonio Uchoa Neto

Vai cada dia mais longe o sonho de Darcy Ribeiro, e de mais um punhado de brasileiros brilhantes, de desbravar o próprio caminho

Comentário de Antonio Uchoa Neto ao post “Lula pacificador engoliu o Lula estadista, por Luis Nassif”

Para fazer a paz, é necessário ter feito antes a guerra, e para ser um estadista, é necessário ter um Estado forte atrás de si. Não é preciso entrar em detalhes, mas Lula não é nenhuma das duas coisas. Lula é um homem do povo, e sua força está em ser um representante legítimo das aspirações desse povo, e sua limitação é poder movimentar-se apenas na estreita faixa em que os bufões desse nosso Estado de opereta permitem-lhe o acesso.

Às vezes, os limites dessa faixa são bem diversos e distantes entre si: o Palácio do Planalto, de um lado, e uma masmorra em Curitiba, do outro. Também às vezes, é possível acenar para os espectadores mais ao longe, de ambos os lados, papas e presidentes, primeiros-ministros e sociedades afluentes, megacorporações e especuladores, e seduzir-lhes a alma (sic) com uma biografia pungente e uma vontade de ação corajosa e voltada inteiramente às aspirações populares.

Isso costuma fazer sucesso, lá fora, mas, desconfio eu, por motivos nem um pouco idealizados, e sim, puramente práticos. Má consciência, talvez, ou – o que é mais provável – lisonjear para explorar, sucedâneo capitalista do antigo ‘dividir para conquistar’ dos primórdios do Imperialismo.

E a linguagem encontrada por Lula para evitar essas armadilhas que o assediam de todos os lados, é a Conciliação. Algo inteiramente estranho e mesmo nocivo, à exploração capitalista que manda no mundo desde o século XVIII, Nassif.

Não há conciliação possível em um mundo movido à exploração, Nassif, porque em um mundo submetido a esse regime, as posições de negociação são sempre e necessariamente, assimétricas. Crises são janelas de oportunidade para os países ricos – os pobres mantém a posição de subalternidade, e nada fará com que aqueles mudem a visão que tem de nós, como fornecedores de alimentos e matéria prima barata e consumidores de produtos industrializados caros.

Os pratos dessa balança permanecerão inalterados, com crise ou sem crise. Desde que os europeus saíram pelo mundo, não para conquistar, mas para explorar, a assimetria instalou-se sobranceira nas relações internacionais, e dessa posição de superioridade eles só saíram para ceder o lugar aos americanos, contentando-se com as sobras.

E os americanos estão, por sua vez, prestes a serem substituídos pelos chineses, ao que tudo indica, na marra – não vão sair de cena à francesa, como os ingleses (com o perdão do trocadilho). Vão cair atirando, como bons cowboys. Se sobrar alguma coisa no planeta, e como qualquer sombra refresca, lá vai o Brasil se colocar sob as asas da galinha chinesa, ou seguir sendo humilhado (do que já tem considerável prática) pelo Grande Irmão do Norte.

Vai cada dia mais longe o sonho de Darcy Ribeiro, e de mais um punhado de brasileiros brilhantes, de desbravar o próprio caminho, de forjar a própria soberania, sem isolacionismo, mas sem subalternidade. Para tanto, não é necessário ser pacificador, ou estadista, nem mesmo conciliador: basta ser do Povo. Pois há de ser o Povo o grande sobrevivente dessa escalada mundial de estupidez e cobiça protagonizada pela classe dirigente, que há de terminar, com um suspiro ou uma explosão; tanto faz. Os dinossauros morrerão, e as formiguinhas tomarão conta da Terra, com sua sociedade perfeita. Amém.

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